Crônica do Acadêmico Prof. Sebastião de Oliveira Cintra, publicada no Anuário 1982 da ABL-Academia Barbacenense de Letras, p. 78-80.
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(São João del-Rei - 1918-2003) |
Embora tema desagradável, a morte sempre esteve presente nas produções literárias de vários poetas. Não alimentamos pretensão de estudar o assunto com profundidade, tarefa impossível em crônica de reduzidas proporções. De António Joaquim de Castro Feijó, português que nasceu em 1862, o poema intitulado "Pálida e Loira":
Morreu. Deitada no caixão estreito,
Pálida e loira, muito loira e fria,
O seu lábio tristíssimo sorria
Como num sonho virginal desfeito.
Lírio que murcha ao despontar do dia
Foi descansar no derradeiro leito,
As mãos de neve erguidas sobre o peito,
Pálida e loira, muito loira e fria...
Tinha a cor da rainha das baladas
E das monjas antigas maceradas,
No pequenino esquife em que dormia...
Levou-a a Morte em sua garra adunca!
E eu nunca mais pude esquecê-la, nunca!
Pálida e loira, muito loira e fria...
Num livro antigo encontrei anotação manuscrita, que define sentimentos fúnebres: "A melancolia é como o pálido goivo despencado de uma grinalda mortuária". A expressão "Inês é morta", de uso freqüente, exprime fatos comuns de conhecimento geral. João Batista Gomes em "Nova Castro" estampou em verso: "Morreu Inês mais bela do que as flores..."
Jorge Rodrigues publicou no periódico sanjoanense "O Domingo", edição de fevereiro de 1886, o soneto "Virgem Mártir", dedicado a Raimundo Corrêa, autor do soneto antológico "As Pombas", que imortalizou o verso - "Raia sanguínea e fresca a madrugada". Escreveu Jorge, tão cedo arrebatado da vida:
Naquela enxerga fria e abandonada
O seu último sonho - ei-la dormindo;
Pálida virgem, órfã, desgraçada,
Que vivendo a sofrer - morreu sorrindo.
Bela! Inda vê-se no semblante lindo
Uns traços de beleza desbotada;
— E a luz da mocidade, s'extinguindo,
Beija-lhe ainda a fronte descorada...
Moça, formosa e pura, não tivera
Nem um raio de amor, loura quimera
Que nos conforta, quando a dor consome...
Tímida, sempre às tentações fugia.
Trabalhando — a cismar — cansou... e um dia
Embora honrada, sucumbiu... de fome!
O poeta sanjoanense Modesto Antônio de Paiva em seu livro "Noites de Insônia", publicado em 1892, escreveu o poema "A Morte de Jorge Rodrigues", cujos versos finais transcrevemos:
Ei-lo dormindo o sono derradeiro,
À sombra dos ciprestes funerais!
Findou-se para sempre o cancioneiro
Dos festivos e alegres madrigais.
Por isso a viração, que passa agora
Tão tristemente geme no arvoredo!...
E nunca mais o sabiá de outrora
Veio cantar no bosque e no vargedo!
Modesto também dedicou versos ao comendador Custódio de Almeida Magalhães que perdera uma filha.
Daremos um trecho de "A Morte da Eponina":
Deixem que durma tranqüila
Sobre seu leito de argila
O doce sono final!
Pois quando um anjo adormece
— Uma açucena floresce
No jardim celestial!
Machado de Assis escreveu soneto quando da morte da esposa Carolina, iniciado com o quarteto seguinte:
Querida, ao pé do leito derradeiro
Em que descansas dessa longa vida,
Aqui venho e virei, pobre querida,
Trazer-te o coração do companheiro.
Também Álvares de Azevedo escreveu os seguintes versos tristes:
Si eu morresse amanhã, viria ao menos
Fechar meus olhos minha triste irmã;
Minha mãe de saudades morreria,
Si eu morresse amanhã!
Completaremos nosso singelo trabalho com a transcrição do poema de Olavo Bilac
"In Extremis":
Nunca morrer assim! Nunca morrer num dia
Assim! de um sol assim! Tu, desgrenhada e fria,
Fria! postos nos meus os teus olhos molhados,
E apertando nos teus os meus dedos gelados...
E um dia assim! de um sol assim! E assim a esfera
Toda azul no esplendor do fim da primavera!
Asas, tontas de luz, cortando o firmamento.
Ninhos cantando. Em flor a terra toda. O vento
Despencando os rosais, sacudindo o arvoredo...
E, aqui dentro, o silêncio... E este espanto e este medo...
Nós dois... e, entre nós dois, implacável e forte,
A arredar-me de ti, cada vez mais, a morte...
Eu, com o frio a crescer no coração, — tão cheio
De ti, até no horror do derradeiro anseio!
Tu, vendo retorcer-se amarguradamente,
A boca que beijava a tua boca ardente,
A boca que foi tua! E eu morrendo! E eu morrendo
Vendo-te o sol, e vendo o céu, e vendo
Tão bela palpitar nos teus olhos, querida,
A delícia da vida, a delícia da vida!
II. AGRADECIMENTOS
À Acadêmica Profª Drª Ângela Maria Rodrigues Laguardia, membro efetivo da ABL-Academia Barbacenense de Letras, ocupante da Cadeira nº 1, patroneada pelo Padre-Mestre José Joaquim Correia de Almeida, o pronto envio do material constante do Anuário 1980 de nosso Sodalício, através de fotocópias, que me facilitaram enormemente o trabalho.
Agradeço carinhosamente à minha esposa Rute Pardini suas fotos bem como a sua edição e formatação para fins deste post.
III. BIBLIOGRAFIA
ACADEMIA BARBACENENSE DE LETRAS: Anuário 1982, 1982, 130 p.