quinta-feira, 9 de abril de 2020

VULTOS INESQUECÍVEIS DO CINE GLÓRIA


Por Oyama de Alencar Ramalho


Publicado originalmente no jornal Tribuna Sanjoanense, edição de 23.09.1997
Cine Glória de São João del-Rei (inaugurado em 21/08/1947)

Li as notícias sobre a comemoração do cinquentenário do Cine Glória e um artigo do historiador Antônio Gaio Sobrinho, que, acredito, não tendo a pretensão de ser exaustivo, deixou de mencionar figuras humanas importantes, relacionadas aos cinemas do meu tempo de criança. Foi por isso que senti saudades do meu tio Joaquim, funcionário dos Correios, que, à noite, vendia ingressos no Cine Glória. Nessa função trabalhou 44 anos, vindo transferido do Capitólio junto com a temperamental Dona Madalena, enérgica e ordeira com o seu inseparável casaco de pelúcia azul. No Teatro Municipal a portaria estava sob a responsabilidade de Dona Santinha Pato, cujo semblante sempre me transmitiu a serenidade, e a bilheteria era do Seu Miúdo, funcionário da Rede Mineira. O Henrique era o Alfredo do Cinema Paradiso. Comandando os dois cinemas, divisava-se a figura de um homem corretíssimo e íntegro que por trás da sua aparência de durão era extremamente educado, sensível e amável — Seu João Lopes. Substituiu o Seu Benevides, gerenciando por muitos anos os cinemas da empresa Cupello, e a ele cabia as mais espinhosas missões como, por exemplo, dar a notícia de que não tinha vindo o seriado da semana. Aguentava a gritaria da meninada sem perder a dignidade e amargurava-se com o fato porque levava muito a sério o seu trabalho. Mais ou menos dez anos depois da inauguração do Cine Glória, passava um filme do Tarzã que veio faltando o último rolo. Naquele dia foi um desastre, quebraram as cadeiras do cinema que ficou fechado durante uma temporada. Reabriu após uma reforma geral com as poltronas que tem até hoje e que, na época, pareciam as melhores do mundo. 

O Tripa é testemunha de tudo isso e estou certo de que quando cochila, aguardando o término da última sessão, está sonhando com o Seu João Lopes, com o Henrique, com o Seu Joaquim Dias, com a Dona Madalena, com a Dona Santinha, com o Seu Miúdo, com o Zé Gomide e com o Sabino (hábeis desenhistas de tabuletas). São figuras inesquecíveis do cinema são-joanense que, para mim, sempre estiveram ali, nos seus postos de trabalho, e continuam rondando os espaços da nossa lembrança, trazendo saudades muito gostosas de sentir.



* Oyama de Alencar Ramalho é brasileiro de São João del-Rei, Minas Gerais. Nasceu aos 28 de setembro de 1939, filho de Alencar José Ramalho e Coryna de Alencar Ramalho. É casado com Cely Marina Moebus de Alencar Ramalho. Tem 3 filhos (Isabela, Leonardo e Clarissa) e 2 netos (Luca e Hugo). Fez o curso de Náutica na Escola de Marinha Mercante do Rio de Janeiro (1960-1962), tendo trabalhado como 2º piloto na Frota Nacional de Petroleiros - PETROBRÁS, até 1967. Graduou-se em Pedagogia (1967-1970) e em Psicologia (1976) na Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, onde exerceu o magistério, chefiou departamento e coordenou curso. Lecionou também nos cursos de Administração, Economia e Engenharia Industrial da Fundação Municipal São João del-Rei. Participou ativamente da federalização do ensino superior de São João del-Rei, tendo sido o primeiro vice-diretor (pró-reitor) de planejamento da FUNREI, atual UFSJ. Mais...