Por Aleksandra Pluta
Pela
editora Espaço Acadêmico de Goiânia acaba de ser publicado (2016) um importante livro
sobre a história da emigração europeia para a América Latina, especificamente
sobre os imigrantes poloneses no Brasil e na Argentina. O tema de migrações no
mundo de hoje é um dos mais atuais seja do ponto de vista sociológico,
antropológico ou político. Seria muito difícil entender este fenômeno sem olhar
para trás, sem estudar bem as ondas migratórias que tiveram lugar no nosso
passado recente, no século XIX e no começo do século XX, para não mencionar
movimentos migratórios anteriores. A obra do destacado historiador polonês
Jerzy Mazurek, “A Polônia e seus emigrados na América Latina (até 1939)”,
originalmente lançada na Polônia em 2006, analisa os movimentos migratórios da
Europa para a América Latina, com um especial enfoque na colonização dos
camponeses poloneses que povoaram o sul do Brasil. O que torna o livro uma
referência importante nos estudos sobre migrações é o fato dele permitir ao
leitor ter uma visão muito mais ampla sobre a questão, que não se limita só ao
caso polonês. O autor preocupou-se em estender o horizonte, comentando a situação
política e socioeconômica da Europa e das Américas no século XIX e no começo do
século XX para explicar claramente o contexto global que justifica o desejo
(ou, na maioria dos casos, necessidade) de grandes levas de pessoas de
emigrarem em busca de um futuro melhor em outro hemisfério. O autor, cuja
pesquisa durou vários anos, fez um trabalho pioneiro: as referências
bibliográficas são numerosas e em grande parte não accessíveis ao leitor
brasileiro, sendo parte de acervos de arquivos nacionais poloneses ou
ucranianos. Isso permite uma visão bilateral ao mostrar seja a situação dos
emigrantes ainda na Polônia (fazendo um retrato detalhado do contexto
histórico, político, econômico e social), seja a situação deles no lugar de
chegada, retratando, de uma maneira igualmente detalhada, as condições de vida
no Novo Mundo. O olhar do autor está direcionado especificamente à situação dos
camponeses, o que não causa surpresa, pois a maioria dos imigrantes europeus
provêm desse grupo social e, depois de ter chegado ao Brasil ou à Argentina,
continuou trabalhando na terra. O número dos imigrantes poloneses no Brasil ao
longo do século XIX e até o fim da Segunda Guerra Mundial chegou a cerca de
cinco milhões de pessoas. E, vale a pena ressaltar, este número não é o mais
significativo se comparado com os números das imigrações italiana, portuguesa,
espanhola, japonesa ou alemã. Mas o que une todas essas levas são as causas: a
pobreza, o superpovoamento das aldeias, a crise agrária, o insuficiente
desenvolvimento industrial, as duas Guerras Mundiais. A emigração era com
frequência a única salvação diante da miséria e fome. Mas, “no caso da Polônia – escreve o autor – a emigração foi
ainda influenciada pela conturbada história desse país, com destaque para o
imperialismo da Prússia, da Rússia e da Áustria, que, em 1795, após três
consecutivas partilhas, apagaram a Polônia, durante 123 anos, do mapa político
da Europa. A reconquista da independência, em 1918, foi antecedida por uma
série de levantes malsucedidos, e seus combatentes, com receio das inevitáveis
represálias por parte dos invasores, optavam pela emigração”.
Além disso, a mobilidade dos habitantes do Velho
Continente era facilitada pelas políticas migratórias dos países como Estados
Unidos, Canadá, Brasil e Argentina. Por um tempo os governos desses países
financiavam as despesas do transporte dos emigrantes da Europa. Uma das causas
desse movimento migratório era a própria abertura desses países à emigração: o
Brasil, graças à boa conjuntura mundial para o café na segunda metade do século
XIX, era o país que oferecia as condições mais favoráveis para a aceitação dos
emigrantes em escala maciça. Um dos elementos da modernização e da tentativa de
branqueamento do Brasil devia ser a busca de mão de obra alternativa para a
força de trabalho escrava, em forma de trabalhadores assalariados ou colonos
trazidos da Europa. Jerzy Mazurek aprofundou os temas ligados a esta grande
leva de emigração como a economia do país de saída e do país de chegada,
história das organizações sociais e o papel da Igreja Católica na vida dos
núcleos polônicos, entre outros. O resultado da sua pesquisa é fundamental para
a melhor compreensão da formação do Brasil, na qual um dos papéis importantes,
sem dúvida, é desempenhado pelos descendentes dos imigrantes europeus.
3 comentários:
Tenho o prazer de apresentar ao leitor do Blog de São João del-Rei a escritora polonesa ALEKSANDRA PLUTA, que aqui, pela primeira vez, nos brinda com sua resenha encantadora do livro "A Polônia e seus emigrados na América Latina (até 1939)", por Jerzy Mazurek, o qual tive a honra de conhecer em 2004 no Museu de História do Movimento Popular Polonês em Varsóvia, como seu ilustre vice-diretor.
A autora da resenha é mestre em Jornalismo pela Università La Sapienza em Roma, com pós-graduação em Protocolo Diplomático pela Pontificia Universidad Católica de Chile. A sua presença no Blog de São João del-Rei enriquece e prestigia esse espaço de compartilhamento artístico, literomusical e histórico.
Ilustre Braga,
Mais uma pérola preciosa outorgada a nós. Como já lhe expressei, sinto-me sempre pequeno diante da majestade de sua cultura e experiência com grandes vultos ao redor do mundo.
Parabéns!
Obrigado!
Olá, professor Braga.
É curioso que o tema dessa jovem pesquisadora me trouxe uma lembrança curiosa. No bairro osasquense em que sempre residi, Km.18/Quitaúna, existia uma comunidade polonesa de tal forma numerosa que na paróquia católica local - Imaculada Conceição do km.18 - havia aos domingos pela manhã uma missa polonesa, com padre polonês, para um salão cheio, antes da missa comum. Em 1967-68 eu fazia a primeira comunhão, costumava chegar mais cedo e sempre acompanhava aquele culto, chegando a decorar a frase final de um cântico, sem saber o significado.
Hoje toda essa gente desapareceu, é claro, e me fica a tristeza de constatar que sua Memória também desapareceu... Devem ter vindo para cá após 1939.
Muito grato.
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