Por Antônio Gaio Sobrinho
Este texto foi publicado originalmente no livro ET CAETERA, São João del-Rei: UFSJ, 2016, pp. 145-147.
Numa antiga fotografia, de muitos conhecida, que me
foi repassada por Silvério Parada, com texto de José Antônio A. Sacramento ¹,
vê-se um balão do tipo Zepelim, sobrevoando uma paisagem são-joanense, onde se
destaca a Rua que, atualmente, chamam Doutor Cid Rangel, entre a Capela da
Santa Casa e o Colégio Nossa Senhora das Dores, ainda sem os seus anexos
laterais. Esses anexos, como a Capela de Nossa Senhora das Graças, começam a
aparecer somente a partir de 1931, como se pode constatar do periódico local O CORREIO de meados desse ano. Do que se
conclui que aquela misteriosa fotografia, caso seja autêntica, só pode se
encaixar no breve espaço de tempo de alguns meses anteriores, porque os voos do
Zepelim para o Brasil só se iniciaram em 1930.
Esses famosos balões dirigíveis, mais de uma centena,
foram projetados e construídos por Ferdinand Von Zeppelin, cujo nome acabou por
batizá-los, permanecendo utilizados até 1938, inclusive em voos
transatlânticos, que podiam transportar até cinquenta passageiros. Havia-os de
vários modelos e tamanhos, chegando o maior deles a medir 245 metros de
comprimento.
Para acrescentar conjecturas sobre a presença ou não
de um deles nos céus são-joanenses, vou transcrever, em seguida, uma matéria
publicada pelo jornalzinho de Daniel Albertino, em seu primeiro número, datado
de 7 de outubro de 1934, intitulada: Chegou
o Snr Arthur Lins. Antes, porém, julgo pertinente fazer duas observações: a
primeira é que esse jornal, denominado A
SENTINELLA, se dizia crítico,
humorista e noticioso; a segunda é que o primeiro campo de aviação desta
cidade, localizado na região, atualmente, ocupada pela Escola Bradesco e Bairro
da Cohab, foi inaugurado em 8 de abril de 1933. Informo, ainda, que A SENTINELLA publicou também uma foto,
pouco nítida, onde se vê apenas a parte baixa do Zepelim, a cabine de
passageiros semelhando um barco. Quanto ao curioso texto de 1934, ei-lo
transcrito literalmente e com todos
os seus erros, inclusive de pontuação:
"Foi recebido festivamente pela colonia negra, desta cidade, de volta de Araxá, s. exc. o Arthur Lins, chefe do marroquismo desta cidade.
Era grande a massa de povo, que se acotovelava no campo de aviação, aguardando a chegada do Zéppelin, quando um barulho peor do que o do grizú do Caxangá, cortou os ares e um bizorrão do tamanho do predio do Lombardi foi visto. O povo delirou de alegria. De dentro, numa janella, muito alta, avistou-se um vulto e entre o povo, alguem gritou:
“O Lins, chegou! Oia a cabeça delle, na janella!”
Desembarcando, o veranista foi conduzido pela colonia, até o “Rotary Mario Arruda Tolda Club”, onde foi recebido por d. Joaquim Vital e outras figuras distinctas.
No banquete, cuja mesa era forrada de luto, em homenagem a colonia negra, tomaram parte: d. Joaquim Vital; conde Panamá; mensieur Procopio, ministro africano no Brasil; grão-duque João Magalhães; jornalista João Matheus; marquez Luiz França, von Custodio Hotel Brasil; arche-duque Vital e diversas damas do outro planeta.
Durante o banquete, o Snr. Mojeira, mestre de danças, vestido de saiotes, apresentou diversos bailados.
Não houve discursos.
O opiparo banquete foi servido pelo Pãozinho-de-Cem-Reis.
O Sr. Arthur... Lins, depois do banquete, conferenciou demoradamente com o conde Panamá, delegado responsavel pelos pretos desta terra.
Ao Sr. Arthur Lins, apresentamos os votos de bom regresso."
O texto é, de fato, muito curioso e até estranho, que,
a mim, me parece de pouca confiabilidade. Entretanto, quem sabe, exista em São
João del-Rei, alguém que poderia deslindá-lo, comentá-lo e dizer qualquer coisa
a seu respeito. Por exemplo: quem foram Artur Lins e as demais pessoas nele
citadas? E esse tal Rotary Mário Arruda Clube? E quando ele diz Zepelim, estava
se referindo, exatamente, a quê? Se alguém se dispuser, me telefone pelo
3371-4739, que ficarei penhoradamente grato.
Observação: Atendendo ao pedido feito nas linhas
acima, José Antônio de Ávila, leitor do Jornal da ASAP, gentilmente, me
repassou as seguintes informações: a) – que o professor José Pedro Leite de
Carvalho lhe afirmara ter ouvido falar sobre a passagem do aeróstato sobre São
João del-Rei, embora ele mesmo não o tenha visto; b) – que em 18 de setembro de
2010, o professor Oyama de Alencar Ramalho perguntou ao major Cleto
Pellegrinelli, nascido em janeiro de 1921, se ele sabia algo sobre o referido
dirigível em São João tendo dele recebido a seguinte resposta: Eu vi ele passar!; c) – que o pai do Tutti
Fonseca, Waldyr Fonseca, nascido em setembro de 1911 disse ter presenciado a
passagem do Zepelim, em criança; d) – que Antônio Valle, nascido em 1932,
aposentado como ferrancuteiro da Petrobrás, morador na Rua de Santo Elias,
disse que quando criança e estudante do Curso Anexo, ouvira falar da passagem
por nossa cidade do referido Zepelim. Tantas testemunhas, e honestas, parecem
destruir os argumentos daqueles que dizem ser falsa aquela notícia, dizendo
tratar-se de apenas uma fotografia montada.
NOTA EXPLICATIVA
¹ Cf. SACRAMENTO, José Antônio de Ávila: "O Zeppelin em São João del-Rei" in http://patriamineira.com.br/ver_pdf.php?id_noticia=2914&id=3
13 comentários:
Como gerente do Blog de São João del-Rei, tenho o prazer de acolher um novo texto de ANTÔNIO GAIO SOBRINHO, tratando de uma ocorrência espetaculosa nos céus de São João del-Rei: a passagem do Zepelim em voo rasante pelo centro histórico da cidade. O autor, com base em texto do historiador José Antônio de Ávila Sacramento sobre o mesmo assunto, reproduz o testemunho de várias pessoas, moradoras na cidade, que afirmavam ter presenciado o fenômeno.
Além disso, traz ao conhecimento do leitor um artigo do jornal A SENTINELLA, nº 01, edição de 07/10/1934, intitulado "Chegou o Snr. Arthur Lins" a bordo do Zepelim, cuja narrativa lhe parece pouco confiável. Seja como for, solicita a colaboração do leitor, caso possa ajudá-lo a deslindar o texto.
É sempre louvável, amigo Braga, sua dedicação à pesquisa histórica. Seu blog torna-se fonte necessária para o estudo da história de São João del-Rei.
Sobre este assunto, confira mais em:
http://patriamineira.com.br/ver_pdf.php?id_noticia=2914&id=3
Caro amigo Braga
Agradeço por mais essa gentileza, ao enviar-me notícias sobre São João del-Rei. Infelizmente, nada tenho a acrescentar a respeito dessa foto, a não ser que, quando criança, minha mãe várias vezes me contou ter visto o “Dirigível Zepelim” em Copacabana, admirada que ficou pelo enorme tamanho daquele famoso aeróstato.
Mais uma vez quero felicitá-lo por trazer à baila notícias como essa que, junto a tantas outras informações sobre essa bela “Cidade onde os sinos falam”, vão construindo a história sãojoanense que não se encontra nos livros.
Seu trabalho literário já se constitui como uma excelente fonte de pesquisa.
Abraços.
Tinha eu poucos anos de idade (nasci em 1931) e ouvia muito a notícia de que o Zepelim passou sobre São João del-Rei. Notícia absolutamente verossímil pois é impossível que tanta gente séria mintíssim ao mesmo tempo e sobre o mesmo assunto. Quanto à aeronave ter parado em São Jo~´ao del-Rei para o desembarque de um passageiro isto é impossível. Para a descida do passageiro, viajante embarcado no Zepelim, havia necessidade de
torre de atracação com todos os instrumentos necessários tais como cabrestantes e outros aparatos. Ao que se sabe apenas em dois ou três pontos do território brasileiro haviam condições de atracagem do Zepelim. No resto do pais ele passaria ao largo, sem condições de "aterrissagem".
Braga: nasci em 1931 e nunca ouvi falar uma única palavra sobre o Zepelim em São João del-Rei...
Caro amigo Francisco Braga,
Bom dia!
Como sempre, leio, com prazer, seus textos.
Sobre a "passagem do Zepelim por São João del-Rei", acho um tanto inverossímil, por um ou dois detalhes: jornais da época certamente noticiariam, com alarde esta passagem, visto que noticiavam a passagem por nossa urbe de pessoas importantes ou não. A segunda e mais notória observação, sob o ponto de vista deste seu leitor: Como um objeto de tão grande tamanho, passando pela cidade, não traria, em grande número, as pessoas às ruas para vê-lo. Se vivêssemos na época, certamente, nós dois teríamos acorrido à rua para ver tão fabuloso objeto voador. Então, questiono: como não há um observador na rua?
Um outro ponto: O dirigível, pela foto, está em altura muito baixa e, em altura de pouso - por isso já deveria estar amarrado. Ao voar em tão baixa altura, pode ser que um acidente teria acontecido. Esta é uma suposição.
Donde concluo, caro amigo escritor, historiador, pianista e outros mais: a foto é uma montagem e o evento jamais aconteceu, como afirmou o senhor José Antônio. Aliás, quem são as pessoas que afirmam ter visto o dirigível?
Abraço saudoso em você e na adorável Rute.
Saudações!
Respeitosamente e com licença, registro neste comentário que meu saudoso avô materno, Aluísio dos Santos (1924-2004), relatou-me e posteriormente confirmou sem titubear, que na infância presenciou a passagem do dirigível sobre esta cidade, causando forte rebuliço no povo de seu tempo, assutado com o porte gigante do curioso aparelho de voo, cuja passagem por nosso espaço aéreo imprimiu lembrança perene a quantos o presenciaram.
Foi nascido e criado em São João del-Rei, na Rua Antônio Rocha e era uma fonte inesgotável e fidedigna de informação são-joanense, senhor de prodigiosa memória.
Com todo respeito aos que não acreditam, particularmente, ponho fé no meu avô, pois, de fato, muitos de seus outros informes e testemunhos, de outra oportunidade, os confirmei por informantes diversos e mesmo por fontes documentais.
Parabéns aos estudiosos do tema e ao prezado Braga por esta postagem.
Att. Ulisses Passarelli
Sou professor na Universidade de Brasília e provenho de Pernambuco. Os dois dirigíveis alemães Graf Zeppelin e Hindenburg desciam normalmente no Recife para reabastecerem-se e prosseguirem ao Rio de Janeiro.
Olá, professor. Saboroso de ler sobre esse mistério do Zepelim ter passado por São João. É realmente possível, dada as várias vezes em que viajou ao Brasil, sobrevoando diversas localidades. Entretanto, certamente não aterrizou em S. João. Consta realmente que apenas Recife e Rio de Janeiro tinham meios para recebê-lo.
Aliás, há uns anos atrás, um dirigível da "Goodyear", sobrevoou bastante a região metropolitana de São Paulo e, embora menor que o Hindenburg, sua silhueta enorme, fantasmagórica, lenta e silenciosa, era mesmo de espantar.
Abraços.
Muito bacana, meu amigo Francisco.
Forte abraço pra você e pra minha querida amiga Rute.
Muito mistério na fotografia e no texto do jornal "Sentinella" !
Caro Francisco, minha mãe Lilia, hoje com 90 anos, diz que sempre ouviu falar que o zepelim passou sim por nossa terra.
Nosso abraço,
Lilia e Carla
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