Por Prof. Antônio de Oliveira
Introdução
Envelhecer, verbo incoativo: começa, irrompendo de dentro da mocidade, sem a gente perceber. Fazendo uma incursão pela seara insondável
da poesia, numa homenagem com recorte junguiano à terceira idade, só me resta, por conta e inspiração próprias:
ENVELHECER COM POESIA
É próprio da roda rodar.
Impulsionada,
roda, roda, até... parar.
Assim esta vida:
seminal,
gira, gira... até parar.
Para uns,
em largos anos...
e, na velhice,
cabelos grisalhos
pele flácida,
rosto enrugado,
um sentimento,
um sonho,
um olhar distante,
uma recordação...
tenazmente guardada:
o sal da juventude.
É que,
sem piedade,
o tempo,
qual fogo avassalador,
engoliu outro fogo,
seu vassalo:
o viço da mocidade.
Antes também ardente,
“amor – chama, e, depois, fumaça”,
de um Manuel que foi Bandeira,
agora arriada, prostrada,
de chamas apagadas.
Obturando, finalmente,
com suas cinzas, em borralho,
ao som de estalos desoladores,
os poros já sem suor,
e apagando as paixões,
que não mais crepitam...
num campo,
que fora de batalha,
agora incendiado
e já em rescaldo de fúria impotente.
O veneno do tempo,
arma química denominada decrepitude,
irreversível,
em fase terminal,
deslizou em silêncio,
escorreu,
infiltrou-se sorrateiramente,
inoculou lentamente,
contaminou,
poluiu o regaço da vida.
Como antídoto,
contraveneno regressivo,
apenas a memória,
enquanto resta,
lúcida.
Invocando Olavo Bilac,
quando não se sabe se os homens,
mais que Os Rios,
desejam regressar...
Esclerosado, neurótico,
nem assim,
fugindo da vida,
esquecendo-se de viver,
ou se subtraindo à contingência do viver,
o decrépito escapa do envelhecer
e... do morrer.
Mas tudo tem sua hora.
No se antecipar a velhice,
à catástrofe se junta o sentimento de culpa,
cruel se torna a existência,
vazia,
sem conteúdo,
sem sentido:
tolhe-se e se recolhe a libido,
emperra-se a existência progressiva,
foge-se aos obstáculos e desafios, e,
por antecipação,
cava-se a ruína final
e se afunda na própria profundeza.
Enquanto isso,
alheios ao destino,
como crianças que dormem,
os deuses ressonam tranquilos.
É que – convenhamos,
dando razão ao poeta Hölderlin:
apanágio dos deuses, tal privilégio,
o de gozar eternamente sua infância,
ou juventude eterna,
o summum da felicidade,
felicidade suprema,
é inacessível aos humanos...
Não sendo deuses,
somos vulneráveis, e,
sem o elixir da eternidade aqui na terra,
fechadas lentamente as portas para a vida,
envelhecemos, e,
no leito,
já não dormimos:
morremos.
Portanto:
– Dá-me curtir o envelhecer, meu Deus!
Sem medo de curtir o entardecer...
7 comentários:
Na crônica "A Arte de Envelhecer", Dr. Dráuzio Varela confessa o que é mais ou menos pressentido por todos nós, mas não explicitado de forma científica: "(...) O envelhecimento é sombra que nos acompanha desde a concepção: o feto de seis meses é muito mais velho do que o embrião de cinco dias. Lidar com a inexorabilidade desse processo exige uma habilidade na qual nós somos inigualáveis: a adaptação. Não há animal capaz de criar soluções diante da adversidade como nós, de sobreviver em nichos ecológicos que vão do calor tropical às geleiras do Ártico. Da mesma forma que ensaiamos os primeiros passos por imitação, temos que aprender a ser adolescentes, adultos e a ficar cada vez mais velhos. (...)"
Essa é a visão do homem de ciência.
Convido-o agora a desfrutar a visão do cronista ANTÔNIO DE OLIVEIRA sobre como saber envelhecer, envelhecendo com poesia.
Sobre o poema "ENVELHECER COM POESIA"
http://saojoaodel-rei.blogspot.com/2018/08/saber-envelhecer.html
Sobre o autor ANTÔNIO DE OLIVEIRA
http://saojoaodel-rei.blogspot.com/2018/06/colaborador-antonio-de-oliveira.html
Cordial abraço,
Francisco Braga
Gerente do Blog de São João del-Rei
MUITO BOM!
APRECIO O TEMA, SOBRE O QUAL ESCREVI HÁ 3 ANOS.
V. ANEXO.
ABRAÇO AMIGO,
ROGÉRIO
Caro amigo Braga
Muito interessante. Agradecemos pelo envio.
Cordial abraço, de
Mario e Beth.
Caro Braga, bom dia. Realmente, o espelho nos assusta, porque nos mostra o hoje que não sonhamos. Mas, o envelhecer é o grande susto deste moleque do tempo. E, ao invés de sorrir para o espelho, o escondemos. Um grande abraço para você e Rute. Fernando Teixeira
Caro primo Francisco,
Agradeço-lhe a postagem de "Envelhecer com Poesia" no seu blog, de São João del-Rei. Como estamos na antevéspera do Dia dos Pais, estou que valeu, como presente, sua deferência, sua atenção, sua consideração. Grande abraço, para você e D. Rute.
Antônio
Muito bom. Abraço.
Caro professor Braga, saudações!
Grato pela oportunidade dessas leituras, não apenas oportunas pelo "dia dos pais", como também pelo fato de que vivemos numa civilização em que se procura impor a velhice como condição de decrepitude - dada a sobrevalorização da materialidade - inutilidade e mesmo oneração. Na qual, por outro lado, importa o que é novo, o necessariamente avançado. Essa ditadura, que não passa de uma ilusão da eterna adolescência, convence muita gente e deprime o velho na sua "autoimagem". Pobre e decadente civilização essa!
Cumprimentos,
Cupertino
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