Por ELIZABETH DOS SANTOS BRAGA
Professores Oyama, Cely e a autora |
É da posição de ex-aluna da Faculdade Dom Bosco (atual UFSJ) que esboço este texto.
No primeiro e no segundo semestres do curso de Pedagogia, no já longínquo ano de 1985, minha turma teve aulas de Medidas Educacionais I e II com o temido Prof. Oyama.
Muito provavelmente, ao conhecermos a Cely, no segundo semestre, era assim que a ela nos referíamos: “a mulher do Oyama”. Mas, desde o primeiro dia de aula, ela me pareceu uma pessoa absolutamente singular. Todos o somos, mas aquela professora de Psicologia da Criança e do Adolescente e, depois, de Psicologia da Aprendizagem, era dotada de características que faziam dela, pelo menos para mim, uma pessoa extraordinária, por cujas aulas eu aguardava ansiosamente, anotando todas as observações nos cadernos que infelizmente foram perdidos num pequeno incêndio doméstico.
Tentando rememorar, sem o apoio de nenhum documento, os seus ensinamentos, me vêm os conceitos de inatismo, behaviorismo, cognitivismo e humanismo (sobre a psicanálise, as/os que seguiram a habilitação em Orientação Educacional, teríamos mais tarde aulas intrigantes com o saudoso Prof. João Gualberto Teixeira de Carvalho Filho). Vigotski, autor em cujas ideias me especializei posteriormente, havia acabado de ser traduzido para o português, em 1984, na publicação brasileira da coletânea A formação social da mente, e ainda não constava nos programas das disciplinas dos cursos de Pedagogia.
Hoje, quando leciono Psicologia da Educação ou Psicologia Histórico-Cultural e Educação, para alunas e alunos das licenciaturas, na Faculdade de Educação da USP, não deixo de me lembrar das aulas da Profª Cely, ao discutir o behaviorismo, principalmente os experimentos de Pavlov que muito me intrigaram na época e me fizeram buscar um manual de Psicologia na biblioteca para ler em detalhes. Também as diferenças entre as abordagens de Watson e Skinner e todas as distinções e nuances entre condicionamento clássico e operante, modelagem e extinção do comportamento, reforço (positivo e negativo), punição, etc., pontos em que precisei me aprofundar, mesmo sem concordar, mas consciente da importância, durante os anos em que lecionei Psicologia para o Serviço Social na Universidade Estadual de Ponta Grossa, no fim da década seguinte.
Um dos momentos especiais das aulas da Cely foi a leitura do livro Liberdade sem Medo, do professor escocês Alexander Sutherland Neill, contando sobre a criação (em 1921) e funcionamento da Escola Summerhill na cidade de Leiston, Condado de Suffolk, Inglaterra. Contrário às ideias cientificistas positivistas e ao método cartesiano de formação do indivíduo, fez severas críticas à Escola Tradicional e até à Escola Nova, por essa corrente propor apenas mudanças didáticas, mas não mudanças sociais, e por se preocupar com o desenvolvimento cognitivo, dando pouca importância à dimensão afetiva. Afora alguns detalhes buscados na Wikipedia, lembro-me (não sei se é memória ou imaginação) de ter formado a imagem de uma escola no alto de um monte, onde crianças e jovens felizes se engajavam em tarefas e atividades as mais diversas, no seu tempo e ritmo, interessando-se e se responsabilizando voluntariamente por elas.
Naquela época, nós já havíamos lido Paulo Freire nas aulas de Introdução à Filosofia com o Prof. João Bosco Batista, bem novinho na época e nos passando seu entusiasmo, e estávamos resolutas/os na busca de uma educação com liberdade e compromisso político. Eu acredito que a leitura, o trabalho escrito e a discussão do livro de Neill com a Cely só nos ajudaram a sonhar com uma escola mais democrática e a tentar realizar práticas diversas às que estávamos acostumadas/os.
Muitos anos depois, no Solar da Baronesa, em 2000, ela me deu muita alegria quando foi prestigiar o lançamento do meu livro A constituição social da memória: uma perspectiva histórico-cultural, fruto do trabalho de mestrado, junto com o Oyama e muitos outros ex-professores, colegas e amigos.
À Cely, pessoa que combinava muito bem seriedade, cuidado (na preparação das aulas) e delicadeza, minha gratidão e saudade.
13 comentários:
A colaboradora do Blog de São João del-Rei, ELIZABETH DOS SANTOS BRAGA, no presente texto, HOMENAGEM À PROFESSORA CELY, por ocasião do falecimento desta, manifesta sua profunda admiração e respeito pelos conceitos recebidos de sua mestra no curso de Pedagogia da Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras de São João del-Rei (atual UFSJ), durante o ano de 1985.Embora tenha trilhado muitos caminhos posteriormente, a autora reconhece o importante legado de Cely no campo pedagógico, destacado por todos os estudantes da época e por todos os colegas docentes, realçando também no texto o carinho que sua professora lhe dedicava.A professora Cely exerceu, dentre outras notáveis funções em São João del-Rei, o cargo de diretora da Escola Estadual Maria Thereza e integrou o Departamento de Psicologia da UFSJ.
À família enlutada, especialmente a seu colaborador Oyama de Alencar Ramalho, o Blog de São João del-Rei transmite seu profundo pesar pela partida de sua saudosa e querida esposa.
TEXTO
https://saojoaodel-rei.blogspot.com/2021/02/homenagem-professora-cely.html
BREVE BIOGRAFIA DA AUTORA
https://saojoaodel-rei.blogspot.com/2014/07/colaboradora-elizabeth-dos-santos-braga.html
Cordial abraço,
Francisco Braga
Gerente do Blog de São João del-Rei
Caro amigo Braga
Ao agradecermos pela gentileza do envio desta mensagem, queremos felicitar à autora Sra. Elizabeth dos Santos Braga, pela homenagem que presta à Prof. Cely, através do Blog de São João del-Rei.
Receba o abraço fraterno,
Dos amigos Mario e Beth
Obrigado, Francisco, trata-se de uma homenagem muito justa. Celi foi minha professora e, depois, colega na UFSJ. Ela e Oyama sempre bons amigos. Mauricio
Parabéns, prezado confrade Francisco Braga, por publicar um texto tão sensível ao expressar sua saudade que sente a escritora Elizabeth Braga, de bons textos e boas ideias (Museu de Imagem e do Som de SJDR).
Abraços fraternos.
Paulo Sousa Lima
Caro professor Braga;
É com muito entusiasmo e emoção que leio essa homenagem à professora Cely feita pela professora Elizabeth. É pelo fruto que se conhece a árvore ! Certamente a professora Cely deve, por sua vez, ter sido muito feliz ao ver projetada a sua mesma dedicação idealista na trajetória e na destacada carreira de sua ex-aluna.
Cumprimentos.
Cupertino
Somente agora através de sua publicação da homenagem da Betinha à professora Cely é que fiquei sabendo do falecimento da mesma.
Lamento...
VIVA!
OS MESTRES SE ETERNIZAM NA MEMÓRIA DOS ALUNOS.
De Cely, a filha de Dona Marina, fica a lembrança de uma pessoa entusiasmada, firme em seus objetivos. Feliz abordagem de Elizabeth Braga a respeito de Summerhills. O livro Liberdade Sem Medo,lido não sei em que ocasião, impressionou-me pelo que trouxe de novo e audacioso para questões de Educação e didática na escola. Maria Auxiliadora Muffato
Corrigindo: Summerhill Maria Auxiliadora
Muito obrigada, excelente texto!
Não me recordo da Cely.
Talvez porque na época em que lecionei na FDB, eu ficava mais no "Campus Colégio São João" e ela no das Irmãs de N. Auxiliadora.
Mas o adendo "Mulher do Oyama" a caracteriza, pois o Oyama foi meu colega de sala no curso de Pedagogia...
Heitor
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