Transcrevemos com a devida vênia da revista do EXPRESSO, na coluna APOSTAS ONLINE, artigo publicado na edição nº 2703, de 15/08/2024, p. 19.
Estudo revela que 40% dos jogadores usam sites ilegais. São atraídos por maiores ganhos.
São 17 as empresas de jogos e apostas online licenciadas em Portugal - Crédito: FOTO GETTY IMAGES |
A proposta que vários operadores de jogo online ilegal têm dirigido a youtubers e influencers é simples e aliciante: promover a empresa nas plataformas onde estes criadores de conteúdos são seguidos por milhões de pessoas em troca de dinheiro. Só este ano, a Associação Portuguesa de Apostas e Jogos Online (APAJO) avançou com cinco queixas-crime contra influenciadores que promovem operadores sem licença para operar em Portugal. As próprias empresas, normalmente localizadas fora do território nacional, foram também denunciadas junto do Ministério Público.
“Esta prática começou há alguns anos e é cíclica, com períodos de promoção mais ativa por parte de criadores de conteúdos. Quando surgem denúncias, o fenómeno perde força, mas, como as queixas não têm consequências significativas, acaba por ressurgir pouco tempo depois”, explica Ricardo Domingues, presidente da APAJO. “Choca-nos a impunidade destes influenciadores, que muitas vezes recorrem a práticas agressivas, com foco no ganho fácil e omissão das perdas de dinheiro, para publicitar operadores ilegais. Tem havido uma certa passividade da sociedade em erradicar este fenómeno.”
O fenómeno torna-se especialmente preocupante quando analisado à luz das conclusões do mais recente estudo da APAJO sobre os hábitos de jogo online dos portugueses referente a 2024, a que o Expresso teve acesso. Mais de 40% dos jogadores utilizam operadores ilegais, uma percentagem que, apesar dos esforços para atrair jogadores para o mercado regulado, permanece inalterada nos últimos anos. Cerca de 60% recorrem exclusivamente a sites legais e quase 3% jogam apenas em plataformas ilegais.
Os principais motivos para o fazerem são as “melhores odds” (probabilidades de ganhar), “maiores bónus” e “maior oferta de jogos”. “A oferta das casas de apostas é essencialmente a mesma desde que foi criada legislação em Portugal para este sector. A capacidade de absorção do mercado regulado atingiu o seu limite”, afirma Ricardo Domingues.
Para atrair mais jogadores defende alterações legislativas no sentido de “garantir uma maior diversidade de apostas desportivas” e a introdução de modalidades de jogo atrativas que existem apenas no ambiente ilegal. Também é fundamental, sublinha, reforçar o combate ao jogo ilegal, eliminando meios de pagamento nacionais, como o MB Way e Multibanco, em sites de apostas ilegais e melhorando a eficácia no bloqueio desses operadores em motores de pesquisa na internet. A associação estima que o fenómeno do jogo ilegal represente mil milhões de euros a circular no mercado financeiro português. “O mercado ilegal utiliza, em muitos casos, práticas predatórias. A nossa principal preocupação é garantir que os jogadores dispõem de proteção, algo que não acontece no ambiente ilegal.”
Maioria gasta até 50 euros por mês
O estudo foi realizado pela Aximage para a APAJO e participaram mil jogadores entre os 18 e os 65 anos, cerca de 80% dos quais homens. A maioria dos inquiridos aposta até 50 euros por mês (cerca de 70%) e as apostas mais elevadas são feitas sobretudo em operadores ilegais. A maior percentagem de jogadores aposta uma vez por semana (44%), aproximadamente 40% jogam uma vez por mês ou “de vez em quando” e quase um quinto (cerca de 18%) aposta diariamente. A frequência de jogo é maior entre os que apostam em plataformas ilegais. O conhecimento sobre as ferramentas de jogo responsável é hoje em dia maior, mas cerca de 20% dos jogadores ainda as desconhecem. “Temos realizado campanhas para aumentar o conhecimento sobre o jogo ilegal e as ferramentas de jogo responsável”, garante Ricardo Domingues, adiantando que este ano será lançada uma nova campanha, “mais ambiciosa e alargada”, envolvendo várias entidades. “Fazendo uma analogia com a condução de veículos, queremos que as pessoas coloquem um ‘cinto de segurança’ antes de começarem a jogar, para que fiquem protegidas caso o ‘carro’ se descontrole. Nesse sentido, até somos dos poucos sectores que oferecem ferramentas aos consumidores para se autocontrolarem. Fazemo-lo mais do que os sectores do álcool e do tabaco.”
Ainda segundo o estudo, quase metade dos jogadores já utilizou, ou utiliza atualmente, alguma das ferramentas de jogo responsável disponibilizadas pelos operadores. As mais usadas são os limites de aposta e de depósito. A autoexclusão, mecanismo que permite pedir para ser impedido de jogar para prevenir ou mitigar os efeitos do jogo excessivo ou patológico, foi utilizada por 10% dos jogadores que já recorreram a estas ferramentas.
* É jornalista do Expresso desde 2015, atualmente na secção de Sociedade, onde escreve regularmente sobre Saúde Mental desde 2018. É coautora do podcast semanal do EXPRESSO “Que Voz é Esta?”, sobre saúde mental, lançado em maio de 2023 e distinguido pela SPPSM nesse mesmo ano. Esse podcast pretende dar voz a quem vive com ansiedade, depressão, fobia ou outros problemas de saúde mental, e ouvir os mais reputados especialistas nesta área.
3 comentários:
Francisco José dos Santos Braga (compositor, pianista, escritor, tradutor, gerente do Blog do Braga e do Blog de São João del-Rei) disse...
Prezad@,
Tenho o prazer de transcrever no Blog de São João del-Rei o artigo da jornalista HELENA BENTO da revista do EXPRESSO com o título em epígrafe.
O mesmo blog já reproduziu artigos com a mesma temática do jogo online, tais como Vício do Jogo (PÚBLICO, edição de 30/03/2024), onde se mostrou que o jogo online é mais danoso para quem tem propensão nesta área, porque é mais acessível, implica maior anonimato e dá uma sensação de proteção, do que o jogo em espaços físicos como cassinos.
Da minha autoria, posso indicar o meu artigo intitulado DOSTOIÉVSKI: a história de vida de um jogador, publicado no Blog do Braga em 07/04/2024, onde mostro através de textos de O Jogador de Dostoiévski e de Meu Marido Dostoiévski de Anna G. Dostoiévskaia, como esta última precisou auto-superar-se durante os primeiros anos de casamento, quando viveu à mercê do vício do jogo do marido, oscilando na ruína financeira — tendo, a certa altura, que penhorar suas próprias roupas íntimas.
Link: https://saojoaodel-rei.blogspot.com/2024/08/influencers-e-youtubers-promovem-jogo.html 👈
Cordial abraço,
Francisco Braga
Gerente do Blog de São João del-Rei
Prof. Cupertino Santos (professor aposentado da rede paulistana de ensino fundamental) disse...
Caro professor Braga
E pensar que Dostoiévski viveu muito antes dos jogos "on line ". E, como se já não bastassem os legais, temos ainda os ilegais. Drogas jamais faltarão.
Saudações!
Cupertino
Geraldo Reis (poeta, membro da Academia Marianense de Letras e gerente do Blog O Ser Sensível) disse...
Muito obrigado, Braga.
Estamos atentos.
E, graças a Deus, estamos vivos.
Forte abraço poético.
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