Frei Chico, seu Dicionário da Religiosidade Popular e seu palhaço de pano que trazia amarrado à sua túnica franciscana |
“Finalmente, mesmo estando no começo do princípio do início de alguma coisa, nunca desanimei, pois aprendi com os pobres deste País que O POUCO COM DEUS É MUITO.” (Frei Chico)
Frei Francisco van der Poel, no dia 14 de janeiro de 2023, realizou a sua Páscoa! Com seu falecimento, aos 82 anos de idade, ocorrido na manhã do último sábado, no Hospital Madre Teresa, BH, este grande holandês coroou sua existência entregando sua alma aos cuidados da Virgem Santíssima e ao poder do Espírito Santo, que incessantemente buscou em vida neste mundo.
No dia 03 de agosto de 1940, na cidade de Zoeterwoude (Diocese de Rotterdam), Holanda, nascia o menino Franciscus Henricus van der Poel, o nosso conhecido: Frei Chico. Filho de Christina Hendrica Boks e Petrus Hubertus van der Poel. Entrou para a vida franciscana em 07 de setembro de 1960, quando ingressou no noviciado. Sua primeira profissão ocorreu no dia 08 de novembro de 1961 e, a Profissão Solene no dia 08 de setembro de 1964. Sua ordenação presbiteral se deu no dia 14 de julho de 1967, ano em que passou a residir no Brasil. Sua chegada ao Brasil foi em 17/11/1967. Era formado em Teologia, na Holanda, e licenciado em Filosofia (1973) na Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, em São João del-Rei (MG).
O "começo do princípio" se deu lá na cidade de Araçuaí, no Vale do Jequitinhonha (MG). Era o ano de 1968, onde exerceu os primeiros anos de padre e se deu início de uma paixão: a religiosidade popular. No início um pouco resistente, mas que com a força do Espírito foi se abrindo a um novo mundo, como ele mesmo já disse:
“a cultura popular não costuma separar vida e religião. Tudo é feito com a fé num Deus vivo e presente. O povo que recebe graça da revelação tem autonomia para responder e criar formas de culto. Em rituais e orações faladas ou cantadas, é essencial a ‘linguagem do encontrar’, expressão de uma grande fé nos mistérios da revelação, da aliança e da encarnação.”
“A partir de Araçuaí, em parceria com Maria Lira Marques, passei a registrar as rezas, benditos, batuques, técnicas de trabalho, remédios, sabenças e histórias do povo do Vale. O Jequitinhonha mudou o meu modo de pensar sobre a verdadeira religião: aprendi que quem pretende entender a religiosidade popular e ter o direito de explicar seus significados há de se tornar simples com os simples e pobre com os pobres. Confesso que a fé dessa gente me levou a uma espécie de conversão. Na arte de pensar como eles, estou apenas começando a aprender”, afirma Frei Chico.
“estudei e viajei, compartilhei festas e romarias, visitei terreiros, naveguei pelo rio São Francisco, caminhei pelo Nordeste.”
“Em busca de um padrão, desejava reunir informações que fossem representativas do universo religioso e cultural do povo brasileiro. Então passei a garimpar e peneirar na fé do povo tudo que estava ao meu alcance: descrições de festas, romarias, costumes; os rituais como rezas, gestos benditos e pontos; depoimentos populares; dados socioeconômicos, a história do Brasil e da igreja, o confronto popular-oficial, as contribuições da antropologia, da teologia, da sociologia e tantas outras informações.”
“A cultura popular não costuma separar vida e religião. Tudo é feito com a fé num Deus vivo e presente. O povo que recebe graça da revelação tem autonomia para responder e criar formas de culto. Em rituais e orações faladas ou cantadas, é essencial a ‘linguagem do encontrar’, expressão de uma grande fé nos mistérios da revelação, da aliança e da encarnação.”
Frei Chico doou os direitos autorais de seu dicionário para a Ordem Franciscana em Minas. O livro traz ainda o trabalho de Maria Lira Marques Borges, “mulher, mestiça, pintora, cantora, pesquisadora, sempre pronta para esclarecer o pensar e o sentir do povo sofrido do Vale, que desenhou com terras do Jequitinhonha as iluminuras que iniciam cada nova letra do dicionário”, no dizer de Frei Chico.
Durante sua passagem por Betim, também organizou e regeu o Coral Tangarás de Santa Isabel, que, além de cantar em celebrações litúrgicas, tinha um repertório variado, realizando diversas apresentações em programas de TV, como também gravou CD’s.
De 2001 a 2013, residiu na Fraternidade Rivotorto, em Ribeirão das Neves. Depois na Fraternidade Santa Maria dos Anjos, em Betim (MG); e, por fim, na Fraternidade São Francisco das Chagas, Carlos Prates, Belo Horizonte (MG).
A Província Santa Cruz e a Equipe do Hospital do Madre Teresa, durante doze dias, se dedicaram intensivamente no cuidado e na busca da recuperação da saúde de Frei Francisco van der Poel.
Meu saudoso e querido amigo publicou seis livros, cabendo destacar os seguintes: Deus vos salve, casa santa (Estudos da CNBB), “Abra a porta” (1979), obra de cuja elaboração fez parte; Dicionário da Religiosidade Popular - Cultura e Religião no Brasil (Nossa Cultura, 2013) e Com Deus me deito, com Deus me levanto (2018).
Frei Chico foi membro do corpo docente do Instituto Jung, em Belo Horizonte (MG); do Conselho do Centro da Memória da Medicina, na UFMG; do corpo docente do Instituto Santo Tomás de Aquino, de teologia; da Comissão Mineira do Folclore; do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais; da Ordem dos Músicos do Brasil; e, finalmente, Palhaço do Teatro Terceira Margem (Belo Horizonte, MG).
23 comentários:
Prezad@,
É com pesar que cumpro o dever de comunicar a partida definitiva de FREI CHICO, frade holandês que dedicou pelo menos 10 anos de sua vida aos habitantes do Vale do Jequitinhonha e outro tanto aos hansenianos na Colônia Santa Isabel, em Betim.
A par dessas obras de caridade, dedicou-se a uma pesquisa musical profunda, recuperando e deixando registrados muitas peças com a assessoria de Maria Lira Marques, durante sua estada no Vale do Jequitinhonha.
Durante sua estada em Betim, organizou e dirigiu o Coral Tangarás de Santa Isabel, com o qual gravou alguns CD's.
Seu opus magnum é considerado o seu Dicionário da Religiosidade Popular - Cultura e Religião no Brasil contendo 1.150 páginas, 8.570 verbetes e 6.433 notas de rodapé. Frei Chico era assim: aonde chegava, se fazia logo notar com seu violão, seu assovio imitando passarinhos, seu palhacinho dependurado na cintura, seus versos bem-humorados, seu nariz de palhaço e muita... muita prosa.
Haverá mais alegria no céu: chega Frei Chico cantando.
Em nossos corações fica uma linda e saudosa lembrança.
Link: https://saojoaodel-rei.blogspot.com/2023/01/frei-chico-se-foi.html
Cordial abraço,
Francisco Braga
Gerente do Blog de São João del-Rei
Vai fazer muita falta!
Meus sentimentos!
Beijos,
Petete
Eu conheci Frei Chico na década de 80 em BH e pude constatar seu magnetismo pessoal e sua voz inigualável. Sempre cercado por admiradores em busca de aprendizado. Foi- se o homem e ficou a lenda.
Paz à sua alma. Sentidos Pêsames à família e Amigos. Amém!
Que pena, Francisco!
Meu abraço solidário a todos que estiveram mais perto dele e de seu legado.
Antonieta
Obrigado!
Heitor
Caro professor Braga!
Uma genuína vocação cristã, um talento sincero e coerente. Assim foi a exemplar vida e a edificante obra de Frei Chico.
Excelente preito de sua parte ao dedicar-lhe a sua marcante publicação.
Saudações.
Cupertino
O Frei Chico é uma pessoa maravilhosa, pessoa popular e alegre. Participei de um Encontro sobre Religiosidade popular (catolicismo popular), ministrado por ele aos nossos padres da Diocese de São João del-Rei. Foi ótimo. Creio que o pensamento abaoxp expressa muito bem que é o Frei Chico
“A cultura popular não costuma separar vida e religião. Tudo é feito com a fé num Deus vivo e presente. O povo que recebe graça da revelação tem autonomia para responder e criar formas de culto. Em rituais e orações faladas ou cantadas, é essencial a ‘linguagem do encontrar’, expressão de uma grande fé nos mistérios da revelação, da aliança e da encarnação.”
Parabéns ao nosso confrade da Academia de Letras de São João del-Rei pela sua homenagem ao nosso querido e inesquecível Frei Chico.
Prezado amigo Braga,
recebo, com tristeza e saudade, a notícia da partida do Frei Chico - Francisco van der Poel.
Sobre ele e o seu valioso trabalho de pesquisa de campo, documentação e inteligência científica do Folclore Brasileiro, escrevi e publiquei, em 1974, na Revista Fluminense do Folclore, o artigo-reportagem "O Folclore do Vale do Jequitinhonha". Conheci-o, pessoalmente, no Rio, naquele ano, quando eu era Secretário da publicação, editada pelo ilustre pedagogo, folclorista e escritor Rubens Falcão. Eu e Rubens fomos assistir à palestra do Frei Chico no Palácio Gustavo Capanema, sede do MEC, sobre o Folclore daquela região mineira, onde ele fazia um pioneiro trabalho de estudo do Catolicismo Popular, acerca das manifestações religiosas que ocorriam fora das igrejas. Em consequência, publiquei um texto, creio que único, sobre o evento e o conteúdo da palestra, enriquecida com a exibição de slides, dirigida a pesquisadores e professores. Pergunto ao amigo se publicaria nesse prestigioso blog esse meu texto, em memória do Frei Chico e em homenagem ao seu precioso trabalho. Escanearia o texto, que não é longo, e lho enviaria anexado a um e-mail. Abraço do Marcelo Câmara.
Lamento muito. Sempre admirei seu trabalho social. Não conheci sua
produção musical. Fará certamente falta àquelas populações.
Pêsames para nós, seus amigos e discípulos.
Aylê-Salassié
Obrigado! Lamento.Que faça uma boa viagem para o Céu.
Que lástima, o conheci pessoalmente em 1987, quando fez palestra na Escola Municipal de Música, na época em que eu era o diretor.
Fica um agradecimento pelo tanto que ele fez por nós. Ao lado do Pai, estará conosco. Amém!
Caro Francisco Braga do Blog de São João d’El-Rei
Com os melhores cumprimentos
agradece a partilha de informação
Antonio Valdemar
Caro Confrade da Academia de Letras de São João del-Rei,
fiquei muito contente pela remessa do link com a notícia de morte de Frei Chico e homenagem a ele, muito bem merecida.
Abraço,
Pe. Sílvio
Frei Chico foi "aonde o povo está". Autêntico homem de Deus. Que os Céus o acolham com a mais alegre cantoria. Hosana!
Maria Auxiliadora Muffato
DEUS O RECEBA.
AMÉM!
Caro Francisco Braga,
Meus sentimentos pela partida do Frei Chico, com sua personalidade e trabalho tão marcantes.
Abraço fraterno,
Raquel Naveira
Que Deus o tenha na Sua santa glória!
Abraço.
Mestre Braga, um coral de alegres anjos do Senhor receba Frei Chico lá no céu !!! Um benemérito, um bem-aventurado, um santo de Deus! Abraço do Danilo.
Ler este documentário sobre vida e obra do Frei Chico foi emocionante. Há quem venha ao mundo para alegrá-lo, sob a presença constante do Espírito Santo. Há quem verdadeiramente enchrrgue beleza onde outros não são capazes de fazê-lo. Há quem enxergue Deus em tudo e em todos, com alegria e louvor. Há quem se alegre por conseguir tal façanha e se disponha a trabalhar literariamente em possíveis conversões, através de seu magnífico exemplo de vida. Eis o Frei Chico, que voltou pra casa, recentemente. Continuará feliz. Eternamente.
Olá, Francisco. Em nome de frei Chico, nosso "Muito Obrigado" pela sua boa e completa desçrição da pessoa única de frei Chico. Que ele seja feliz na casa do Pai de todos os seres humanos. fr. Joel
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