Por Oyama de Alencar Ramalho
Publicado originalmente no jornal Tribuna Sanjoanense, edição de 23.09.1997
Cine Glória de São João del-Rei (inaugurado em 21/08/1947) |
Li as notícias sobre a comemoração do cinquentenário do Cine Glória e um artigo do historiador Antônio Gaio Sobrinho, que, acredito, não tendo a pretensão de ser exaustivo, deixou de mencionar figuras humanas importantes, relacionadas aos cinemas do meu tempo de criança. Foi por isso que senti saudades do meu tio Joaquim, funcionário dos Correios, que, à noite, vendia ingressos no Cine Glória. Nessa função trabalhou 44 anos, vindo transferido do Capitólio junto com a temperamental Dona Madalena, enérgica e ordeira com o seu inseparável casaco de pelúcia azul. No Teatro Municipal a portaria estava sob a responsabilidade de Dona Santinha Pato, cujo semblante sempre me transmitiu a serenidade, e a bilheteria era do Seu Miúdo, funcionário da Rede Mineira. O Henrique era o Alfredo do Cinema Paradiso. Comandando os dois cinemas, divisava-se a figura de um homem corretíssimo e íntegro que por trás da sua aparência de durão era extremamente educado, sensível e amável — Seu João Lopes. Substituiu o Seu Benevides, gerenciando por muitos anos os cinemas da empresa Cupello, e a ele cabia as mais espinhosas missões como, por exemplo, dar a notícia de que não tinha vindo o seriado da semana. Aguentava a gritaria da meninada sem perder a dignidade e amargurava-se com o fato porque levava muito a sério o seu trabalho. Mais ou menos dez anos depois da inauguração do Cine Glória, passava um filme do Tarzã que veio faltando o último rolo. Naquele dia foi um desastre, quebraram as cadeiras do cinema que ficou fechado durante uma temporada. Reabriu após uma reforma geral com as poltronas que tem até hoje e que, na época, pareciam as melhores do mundo.
O Tripa é testemunha de tudo isso e estou certo de que quando cochila, aguardando o término da última sessão, está sonhando com o Seu João Lopes, com o Henrique, com o Seu Joaquim Dias, com a Dona Madalena, com a Dona Santinha, com o Seu Miúdo, com o Zé Gomide e com o Sabino (hábeis desenhistas de tabuletas). São figuras inesquecíveis do cinema são-joanense que, para mim, sempre estiveram ali, nos seus postos de trabalho, e continuam rondando os espaços da nossa lembrança, trazendo saudades muito gostosas de sentir.
* Oyama de Alencar Ramalho é brasileiro de São João del-Rei, Minas Gerais. Nasceu aos 28 de setembro de 1939, filho de Alencar José Ramalho e Coryna de Alencar Ramalho. É casado com Cely Marina Moebus de Alencar Ramalho. Tem 3 filhos (Isabela, Leonardo e Clarissa) e 2 netos (Luca e Hugo). Fez o curso de Náutica na Escola de Marinha Mercante do Rio de Janeiro (1960-1962), tendo trabalhado como 2º piloto na Frota Nacional de Petroleiros - PETROBRÁS, até 1967. Graduou-se em Pedagogia (1967-1970) e em Psicologia (1976) na Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, onde exerceu o magistério, chefiou departamento e coordenou curso. Lecionou também nos cursos de Administração, Economia e Engenharia Industrial da Fundação Municipal São João del-Rei. Participou ativamente da federalização do ensino superior de São João del-Rei, tendo sido o primeiro vice-diretor (pró-reitor) de planejamento da FUNREI, atual UFSJ. Mais...
19 comentários:
Numa bonita tarde de primavera de 2019, passeando pela Praça dos Expedicionários de minha cidade, tive a sorte de encontrar-me com um colaborador do Blog de São João del-Rei, o escritor e historiador Prof. Oyama de Alencar Ramalho, e perguntei-lhe se pensava comparecer também ao lançamento do livro "Francisco Cupello, a saga de um vencedor" (1911-1979), da autoria de Mário Pellegrini Cupello, sobrinho de seu biografado, fundador de uma série de Cínes Glória em várias cidades do País, sendo o Cine Glória de São João del-Rei uma de suas filiais mais duradouras. Combinamos de encontrarmo-nos na sala de espetáculos local, por ocasião do lançamento do livro.
Então, Prof. Oyama falou-me sobre uma crônica que ele tinha produzido quando do cinquentenário do Cine Glória de São João del-Rei em 1997 com o título "Da Arte de ser Saudosista - VII". Interessei-me imediatamente pela novidade e pedi-lhe que me enviasse a crônica para reprodução no blog, especialmente porque se distinguia de outros trabalhos memorialistas pelo protagonismo dos seres humanos que labutaram para o engrandecimento daquele salão de projeção de películas. Ouvindo-o, percebi que eu também tinha conhecido todas as pessoas que foram mencionadas de memória pelo meu interlocutor.
No dia 03/09/2019, foi-me enviada a referida crônica, mas fiquei em débito com o amigo Oyama até hoje. Por "culpa" da quarentena, recuperei essa crônica saudosa em meio a meus guardados e trago-a a lume nesta data para desfrute do leitor.
Link: https://saojoaodel-rei.blogspot.com/2020/04/vultos-inesqueciveis-do-cine-gloria.html
Cordial abraço,
Francisco Braga
Gerente do Blog de São João del-Rei
Excelente crônica, saudosos tempos, me veio a lembrança o Sr. Zé Gomide desenhando aquelas tabuletas alí ao lado, no beco do Cine, eu às vezes passava por alí e parava admirado pela habilidade dele, muito bom!
Muitas saudades!
Parabéns pela crônica!
Caro professor Braga
É muito difícil para um leitor aficionado pelo cinema e sobretudo para alguém de 60 aninhos para cima não se emocionar com as memórias de vocês, turminha brava de S.João del-Rei.
Muito grato.
Cupertino
QUE BELEZA !
Caríssimo Francisco,
Que belo!!!!!!
Lendo, o texto me fez viajar para um passado distante que estava gostosamente guardado oculto na memória de infância. Levou-me ao Cine Brasil, único da época, cujo prédio virou comércio.
J. Afrânio Vilela
Cine Brasil: Em Ibiá.... minha terra natal.
Bom dia, amigo Francisco Braga.
Muito obrigado.
Feliz Páscoa na medida do possível!
Cuide-se muito bem!
Abraço,
Diamantino
Olá, Rute e Francisco. São João del Rei, sem Semana Santa! Talvez a primeira vez na sua história!! Ainda bem que existe a Paixão de São Mateus de J.S. Bach Vale a pena ouvir esta obra prima, neste tempo de prisão domiciliar! Paz e Bem !! frei Joel.
Prezado confrade, Francisco Braga, boa Sexta-feira Santa. Muito interessante o texto do confrade sócio honorário do IHG e que se refere a uma situação tratada pelo bom texto do nosso confrade Mario Cupello sobre o fundador do Cine Glória. Parabéns pela recuperação e publicação do referido texto.
Abraços fraternos,
Paulo Sousa Lima
Muito bom!!!
Obrigado FJSB
Muito bom o texto, sou filha caçula do Sr João Lopes ♥️
Muito bom. Lembro-me de todas as pessoas citadas no texto. Todos de saudosa memória.
Como nos faz bem as histórias de nossa terra, principalmente narradas por pessoas capacitadas e conhecedoras. Obrigado Francisco Braga Oyama Ramalho por mais esta
Excelente crônica, saudosos tempos, me veio a lembrança o Sr. Zé Gomide desenhando aquelas tabuletas alí ao lado, no beco do Cine, eu às vezes passava por alí e parava admirado pela habilidade dele, muito bom!
Prof. Oyama, bela crônica. Fez-me lembrar do famoso "TRIPA", que no escurinho do cinema sempre aparecia, nas horas mais impróprias, com aquele facho luminoso da luz de sua lanterna.
Obrigado Oyama, quantas saudades do vovô Joaquim Dias, vai ficar nos nossos corações eternamente, família Dias. PAULO DIAS.
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