A proposta deste livro é colocar o leitor em contato com uma visão de mundo e de homem assentada sobre fundamentos que a razão postula. Nele, o cosmos e o homem são pensados à luz do ser. |
Abaixo é apresentada uma síntese das principais teses do livro supracitado através dos seguintes itens:
1º) A questão do ser e do ente
Na obra, o ser é entendido como sendo o pensamento divino, infinito e infinitamente eficaz, objetivado. É o Absoluto fora de si mesmo. Por isso, um infinito. Não infinito actu, mas um infinito de possibilidades, que se irrompe e se manifesta de infinitos modos. Nessa visão, o ser é causa sui (causa do seu próprio agir). Um agir espontâneo e autocriativo. Ente é o ser revelado na face das coisas. O ser, tal qual é concebido nesta obra, fundamenta todos os problemas nela abordados. Num clima niilista que contamina todo o acontecer histórico da vida contemporânea, é preciso ousar uma ontologia forte, isto é, com fundamento no real. Esse fundamento é o ser. Não um ser abstrato, mas objetivo, que rege o mundo por dentro e que não é uma coisa: o PENSAMENTO DIVINO OBJETIVADO.
2º) Concepção de Deus
Deus é concebido como Princípio in-principiado, ser de natureza infinitamente pensante. No pensar, objetiva o próprio pensado. Na obra, faz-se distinção entre ser e Ser. Ser, maiúscula, refere-se a Deus. À luz da ciência contemporânea, sobretudo, da física quântica, passam-se em revista crítica as cinco vias da prova da existência de Deus de Tomás de Aquino, de Leibniz e a prova moral de Kant.
3º) Conceito de criação
Defende-se a tese de que o universo não pode ter tido um instante zero ou um começo físico e que a criação não pode ser ex nihilo (do nada). A tese desenvolvida a respeito da criação é coerente com a concepção de ser. Faz-se distinção entre começo físico e começo metafisico. Na obra, isso significa: O trânsito do pensamento criador divino para sua objetivação é imediato, simultâneo. Deus é o PRIUS. A objetivação do pensamento criador é o ANTES DE TUDO. Por ser imediato o trânsito do pensamento divino para a sua conseqüente objetivação, diz-se que o criado ou o universo teve um começo metafísico ou não físico.
4º) Superação das dicotomias: vida-matéria e corpo-espírito
O autor defende o ponto de vista de que a vida não pode advir da não-vida e de que o pensamento não pode advir do não-pensamento. Algo pensante – e que não é uma coisa – rege o mundo por dentro. Há, no cosmos, uma continuidade ôntica, sem saltos. Esse algo, que não é uma coisa, é o ser. O ser humano é entendido como um ser cósmico e uma uni-totalidade-corpo espírito. Por ser também espírito e, por isso, dotado de consciência, enquanto espírito está destinado a sempre existir, a saber: destinado a uma vida eviterna ou para sempre.
5º) Espaço e tempo
O autor não entende o espaço como sendo um ente. Quanto ao tempo, contrapõe a eternidade à temporaneidade. Distingue o tempo humano, resultante da visão que se tem do devir cósmico e o tempo objetivo, que é o devir criativo do ser, em que não há um antes, por ser fruto da espontaneidade criativa do ser. Nesse particular, seguem-se as pegadas de Schelling. O devir cósmico é a autorrevelação do ser. A ideia daquilo que é o tempo brota do interior da concepção do ser. Na visão do autor, tempo e espaço não são coisas, não são entes.
6°) Repensando as leis do ser
Coerentemente com a visão metafísica da obra, o autor passa em revista as leis do ser, dando-lhes formulação de acordo com a visão ontológica proposta. À luz do ser, tenta-se refundar a ontologia, restituindo-lhe o fundamento do ser, agora entendido como PENSAMENTO DIVINO OBJETIVADO.
7º) Conhecimento sensitivo e intelectivo
As reflexões em torno de tão complexo problema partem do conhecimento sensitivo. Apresenta-se este, não como simples espelhamento, mas como uma visão exclusivamente humana da realidade. Pergunta-se: em que consiste a verdade do conhecimento sensitivo?
A obra anda à procura do radical fundamento do conhecimento. Se o homem, enquanto inteligência não estivesse transcendentemente aberto para o ser, e o ser, enquanto cognoscível, não estivesse aberto para a inteligência, o conhecimento seria impossível. Indaga-se: qual o fundamento dessa recíproca abertura? Por que o ser é cognoscível? Nesta obra, à luz da filosofia do ser, propõe-se não um retorno ao nõus poietikós e ao nõus pathetikós de Aristóteles ou ao intelecto agente e paciente de Tomás de Aquino, nem tão pouco se adota cegamente a postura kantiana das formas a priori. Neste trabalho, apresenta-se a teoria do salto transcendental, isto é, procura-se responder à radical questão: por que, ao se ver esta árvore, de pronto se faz o salto para árvore? Trata-se de problema central da gnosiologia, que só pode encontrar solução a partir do interior da questão do ser.
8°) A questão da liberdade
No capítulo que aborda a questão da liberdade, o autor alarga o horizonte de suas reflexões, demonstrando que no universo tudo depende de tudo ao mesmo tempo em que cada categoria de entes é independente (ou livre) em relação àquelas que lhe são superiores. Ora, se as categorias de entes ao mesmo tempo em que dependem, também independem, significa que em todas elas, obviamente em graus diferentes, há um espaço de agir livre. O autor mergulha no problema, mostrando em que isso consiste. Em que sentido, no cosmos, uma categoria de entes é autárquica (independente) sem nunca ser autárcica (autossuficiente).
No plano humano, a liberdade é entendida como espontaneidade, no sentido de que o ato livre é causa de si mesmo. Assim como o conhecimento, a questão da liberdade está imbricado no problema do ser. O agir dessa espontaneidade resulta da relação dialética entre a superdeterminação da vontade humana para o BEM e sua relação de indeterminação perante os bens particulares, em sua vida concreta e histórica. A escolha entre isso ou aquilo resulta de um juízo de valor que o sujeito faz. Feita a escolha, ele se autodetermina. Liberdade é relação de indeterminação perante os bens particulares.
9°) Ética e metafísica
Por ser o homem consciente e livre, a ele pertence o ordenamento do próprio agir. É um ordenamento moral, porque livre. O ser humano é aquele que, onticamente, está vocacionado para a vida moral. Vocação moral significa: renúncia consciente a uma vida não ética. Vida não ética é a própria negação do ser, que é ordem que ordena. E não se trata de ordem abstrata, mas real e operante: ordo ordinans. No presente trabalho, a questão ética é abordada no horizonte da concepção do ser nele acolhida.
O agir humano, nas suas relações interpessoais, é a face visível da sua moralidade interior. A dimensão moral e ética de alguém vige no seu interior, mas se torna patente aos olhos de todos através da ação. A ação moral e ética é a exterioridade da moral de foro íntimo e do espírito ético do ser humano.“O homem é aquele que tem um éthos” (Heidegger). Éthos é o como do agir humano. O como do agir é o espaço de sua liberdade. Esse éthos pode ser ou conforme a ordem que ordena ou disforme com ela, instalando, nas relações interpessoais, a desordem que desordena.
10°) Dimensão escatológica do ser humano
No último capítulo desta obra, desenvolvem-se reflexões sobre a morte, agora entendida como o instante em que se dá o sobrenascimento do homem para outra dimensão fora do espaço e do tempo. O verbo sobrenascer é importado de Guimarães Rosa (1908-1967). “O senhor sobrenasceu lá?” Inspirando-se em Guimarães Rosa, a forma verbal — sobrenascer — é assumida para designar a passagem de um modo de ser para outro, sobre aquilo que se era e se quis ser. No final de sua vida terrena, o homem sobrenasce sobre aquilo que ele foi e quis ser para outro modo de existência. Sobrenascer, portanto, opõe-se à ideia de que o ser humano possa se anular, como pessoa, no instante do seu passamento. Propõe-se, aí, uma teoria da ressurreição à luz da razão.
II. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
5 comentários:
Prezad@,
Quis o Destino que eu topasse com o Prof. José Cimino em diferentes situações em minha vida: inicialmente, em tenra idade, no Oratório Festivo São Caetano; mais tarde, quando ele era professor da Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras de São João del-Rei e eu, discípulo, durante os anos 1968-71; de 2014 até hoje, no âmbito da ABL-Academia Barbacenense de Letras, da AMEF-Academia Mantiqueira de Estudos Filosóficos, como confrades, e, desde 01/10/2021, da ABROL-Academia Brasileira Rotária de Letras-MG Leste.
Sou um admirador de Prof. José Cimino pelas mesmas razões que o prefaciador de "NA LUZ DO SER", saudoso Prof. Tiago Adão Lara, falecido em 26/09/2019, fixou em página inesquecível:
"(...) Cimino não se volta, em seu pensar, para um 'eu' à moderna, centrado. Pelo contrário, o que o encanta e move é a riqueza do fora que o habita: as múltiplas experiências, com as quais foi ele tecendo sua história. História de criança, na pacata Desterro do Melo/MG. História de educador-professor de filosofia, na Faculdade Dom Bosco. Professor de filosofia que, nos fins de semana, cuidava da garotada do Oratório Festivo São Caetano e com ela jogava futebol, em campo empoeirado. História de incentivador da arte cênica, tendo criado, em São João del-Rei, o TÚNIS-Teatro Universitário Sanjoanense. O grupo projetou-se em âmbito estadual e nacional, tendo sido vencedor do Festival Nacional do Teatro Amador com a peça Morte e Vida Severina, no Rio de Janeiro, em 1968. No ano seguinte, venceu o Festival de São Carlos/SP. História de Diretor da Escola Agrotécnica de Rio Verde/GO, onde também lecionou filosofia na Fundação de Ensino Superior de Rio Verde-FESURV. História de Poeta. Em Barbacena, pela AMEF, Academia Mantiqueira de Estudos Filosóficos, por ele fundada, Cimino publicou livro de poesia intitulado INFINITO INSTANTE. Vale a pena ver a beleza do livro, cuja capa procura expressar o desabrochar de rosas, já que Barbacena é cidade das rosas. Vale, sobretudo, ler os versos de Cimino, leves, irrequietos e coloridos como as borboletas. (...)"
Link: https://saojoaodel-rei.blogspot.com/2021/11/na-luz-do-ser-investigacoes-de.html
Cordial abraço,
Francisco Braga
Gerente do Blog de São João del-Rei
Parabéns, confrade Francisco Braga, saúde e paz, tudo de bom.
Também conheci Prof.José Cimino,o Cimino, nas minhas antigas andanças pelo Colégio São João, Faculdade e Santuário. Debaixo de sua simplicidade, um tesouro! Maria Auxiliadora Muffato
Muito me alegro com esta publicação do Prof. Cimino, pois fomos colegas no Curso de Filosofia na UNIPAC, em Barbacena. Ele sempre se portou como um ser metafísico, um excelente pensador sobre Platão. Parabéns!
Vamos filosofar seu texto O ser meta-antropológico.
Caro professor Braga.
Resumo de reflexões pautadas nas questões fundamentais e clássicas do Ser. Interessante contribuição do professor Cimino.
Cumprimentos.
Cupertino
Postar um comentário