domingo, 10 de julho de 2016

UM PRESENTE DE VALOR DE LINCOLN DE SOUZA


Um Presente de Valor de Lincoln de Souza


O escritor e jornalista Lincoln de Souza deu de presente a São João del-Rei um patrimônio de inestimável valor. Primeiro, a Biblioteca de Empréstimos a Domicílio Basílio de Magalhães ¹, pouco conhecida do nosso povo mas já à disposição da população sanjoanense.

Não se trata de um amontoado de livros velhos e sem sentido. Pelo contrário, estamos informados de que a Biblioteca oferece livros modernos e interessantes, para o enriquecimento da cultura dos nossos conterrâneos.

A idéia do nosso amigo, poeta Lincoln de Souza, é fazer com que os livros alcancem os leitores em suas casas, facilitando a leitura, sendo inteiramente gratis o empréstimo durante certo prazo. Se o leitor atrazar na entrega, então pagará uma taxa módica.

Os livros são variados, com romances, biografias, memórias, ensáios, história, viagens, poesia, tudo que há de melhor na literatura contemporânea e moderna.

A atividade dêsse conterrâneo, em benefício da cultura de São João del-Rei, se destaca também pelas doações que fez ao Conservatório Estadual de Música ² e que estão parcialmente na sala que tem o seu nome.

São telas valiosas que adquiriu durante muitos anos, telas de pintores de renome, como Agostinelli ³,  Raul Deveza ,  Manuel Santiago , Jordão de Oliveira , Fânzeres ,  Alcides Cruz ,  E. Walter ,  Oswaldo Teixeira ¹⁰,  H. Cavalleiro ¹¹,  Armando Vianna ¹² e muitos outros, além de um desenho original de Pedro Américo ¹³, uma preciosidade artística de grande valor.

Além dessas telas, Lincoln de Souza presenteou também o Conservatório com uma coleção de objetos típicos que adquiriu em suas viagens pelo Brasil e pelo estrangeiro, miniaturas que representam diversos países, cidades ou monumentos, além de tapetes, flechas, objetos de arte índia, sem falarmos nos albuns de visitas de viagem por diversos países e pelo Brasil.

Ao transferir para São João del-Rei o resultado de muitos anos de labor, de viagens e de estudos, Lincoln de Souza mostrou o seu apreço pela terra natal, pois o patrimônio cultural que aqui se encontra tem valor inestimável.

Contudo, essas coleções e a galeria de arte são praticamente desconhecidas, estando a merecer a atenção do público, como ponto obrigatório de visitas de moradores e turistas, pelo seu grande interêsse.

Seria de desejar que o Conservatório Estadual de Música e a Municipalidade abrissem ao grande público o contacto cultural com as doações de Lincoln de Souza, que merecem a atenção do povo.

Fonte: PONTE DA CADEIA, São João del-Rei, edição nº 56, datada de 30/06/1968.


II.  NOTAS EXPLICATIVAS, por Francisco José dos Santos Braga



¹  Acredito que a "Biblioteca de Empréstimos a Domicílio Basílio de Magalhães" só tenha funcionado no prédio da Prefeitura Municipal de São João del-Rei, enquanto Lincoln de Souza estava vivo, tendo sido desativada em algum momento após sua morte ocorrida em 11/08/1969.
O Blog do Braga reproduziu artigo de Lincoln de Souza intitulado "O que há do Aleijadinho em São João del-Rei", publicado no jornal são-joanense Ponte da Cadeia, na edição de 10/03/1968, onde ele fala claramente dessa sua biblioteca em pleno funcionamento. 
Cf. in http://bragamusician.blogspot.com.br/2016/07/o-que-ha-do-aleijadinho-em-sao-joao-del.html


²   Em 06/12/2011, produzi no Blog de São João del-Rei artigo denominado "Comentários à 1ª edição do jornal 'Tribuna Sanjoanense'" (edição de outubro de 1966). Meu artigo foi em seguida publicado na Revista da Academia de Letras de São João del-Rei, Ano V, nº 5, 2011, p. 43-76.
O referido artigo incluiu, entre outras, uma matéria intitulada "CONSERVATÓRIO ESTADUAL GANHA RICA COLEÇÃO", que estava estampada na p. 2 do mencionada edição de 1966, e que informava que a mencionada coleção estava avaliada em dez milhões de cruzeiros. 
Ainda, comentando a mesma matéria, transcrevi uma correspondência de Lincoln de Souza ao Diretor do Conservatório Estadual Pe. José Maria Xavier, Prof. Sílvio Padilha, em que o eminente jornalista comunicava a este sua intenção de doar ao educandário suas coleções de arte (consistindo de 110 itens, num primeiro momento), juntando à supracitada correspondência uma relação completa das 110 obras do acervo acompanhadas dos seus respectivos autores, onde, entre outros, constavam os onze pintores citados no presente artigo ("Um Presente de Valor de Lincoln de Souza"). Reproduzimos aqui o que se acha transcrito nos "Comentários...", de 2011:
M. Agostinelli: CAIS DO SENA
Raul Deveza: TEMPLO EM RUÍNAS, Cordeiro-RJ
Manuel Santiago: RAMO DE ÁRVORE
Jordão de Oliveira: TERRA SERGIPANA e RUA DO ALEIJADINHO, Ouro Preto
Fânzeres: CREPÚSCULO
Alcides Cruz: CASA DO ALEIJADINHO, Ouro Preto
E. Walter: TRECHO DE PAINEIRAS, Rio
Oswaldo Teixeira: MENINA-MOÇA
H. Cavalleiro: A FILHA DA MINHA EMPREGADA
Armando Vianna: CABEÇA DE MENDIGO
Pedro Américo: ILUSTRAÇÃO PARA O "COLOMBO" DE ARAÚJO P. ALEGRE
Por essa amostra, pode-se ver que há correspondência entre os 11 pintores citados no artigo acima com outra dos mesmos 11 nomes constantes da relação das 110 obras feita e entregue por Lincoln de Souza quando dessa doação, conforme se pode constatar no link abaixo.
Todas essas 11 telas faziam parte da primeira leva de doações, documentada por correspondência datada de 15/03/1965, da parte de Lincoln de Souza ao Conservatório Estadual de Música. 
Entretanto, quando da ulterior cessão da totalidade do acervo de Lincoln de Souza, em 09/07/1979, para a Prefeitura Municipal (Museu Casa de Bárbara Eliodora), foram arrolados 144 itens existentes na Sala Lincoln de Souza daquele educandário; então podemos concluir que houve outras doações de 34 itens além da primeira, embora não estejam tão bem documentadas quanto a primeira delas, certamente por extravio da correspondência comprobatória das outras doações.
Cf. in http://saojoaodel-rei.blogspot.com.br/2011/12/comentarios-1-edicao-do-jornal-tribuna.html

³  Mario Morel Agostinelli (Arequipa, Peru, 1915-Rio de Janeiro, 2000). Pintor e escultor. A convite da Prefeitura do Rio de Janeiro, em 1977 realiza uma escultura de 7 metros de altura, atualmente no Riocentro. Em 1987, o Arcebispado do Rio de Janeiro encomenda-lhe uma escultura de corpo inteiro do Papa João Paulo II, atualmente na frente da Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro.

Raul Deveza (Rio de Janeiro, 1891-Manaus, 1952) foi um pintor, cenógrafo, decorador. Estudou no Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro, tendo sido orientado por J. Santos e Isaltino Barbosa. Em 1914, ingressou na Escola Nacional de Belas Artes, onde recebeu aulas de Batista da Costa. Em 1920 foi para Paris, onde estudou na Academia Julian e na Académie de la Grande Chaumière. [RUBENS, 1941, 187] diz a seu respeito: "como Bordon não sentia a figura, ele não sente a paisagem. Prefere o retrato, que faz com absoluta compreensão do gênero, colocando-se ao lado dos que melhor o praticam."

  Manuel Santiago (Manaus, 1897-Rio de Janeiro, 1987) foi pintor, desenhista e professor.

  Jordão Eduardo de Oliveira Nunes (Aracaju, 1900-Rio de Janeiro, 1980) iniciou seus estudos na cadeira de desenho sob a orientação do mestre Quintino Marques, catedrático no colégio Atheneu Sergipense. Desde os quinze anos já produzia retratos por encomenda. Em 1921 mudou-se para o Rio de Janeiro, tendo como professores João Batista da Cunha, Lucílio de Albuquerque e Rodolfo Chambelland na Escola Nacional de Belas Artes. Em 20/01/1922, Jordão publica o artigo "Horácio Hora", no Diário da Manhã, de Aracaju, alcançando grande repercussão. Em 1933,  conquistou o Prêmio de Viagem à Europa na Escola Nacional de Belas Artes. Retornou ao Brasil em 1936. A partir de 1944, fez parte, por diversas vezes, do júri do Salão Nacional de Belas Artes. Além de ter tomado parte de mostras individuais, também participou de inúmeras exposições coletivas. Em 1949 ingressou como professor na Escola Nacional de Belas Artes. Grande parte de suas obras encontra-se na pinacoteca que leva o seu nome no Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe, em Aracaju; no Museu Imperial de Petrópolis, no Museu Nacional de Belas Artes, no Museu Antonio Parreiras, em Niterói, e na Pinacoteca do Estado, em São Paulo. Escreveu 3 livros: Caminhos Perdidos (memórias), A cor das coisas (poemas) e Delta (poemas), sendo póstumo este último. 

Parece tratar-se do pintor, gravador, desenhista, conferencista e professor, Levino de Araújo Vasconcelos Fânzeres (1884-1956). Em 1902, Levino Fânzeres frequentou o Liceu de Artes e Ofícios, sob orientação de Evêncio Nunes e depois na Escola Nacional de Belas Artes, seu professor foi Batista da Costa. Em 1912, obteve a láurea mais cobiçada do Salão promovido pela Escola Nacional de Belas Artes, o Prêmio de Viagem. Viajou para a França com a esposa Izolina Albernaz Machado, escultora e pintora, discípula de Eliseu Visconti e que obteve Menção Honrosa. Em Paris instalaram-se em atelier no Boulevard Raspail, tomando aulas com Ferdinand Carmon e André Lhote, na Academia Julian até 1916. Apesar do novo ambiente, permaneceu fiel ao tema predileto, pintando figuras e paisagens do campo, privilegiando representações da natureza agreste brasileira sob a dramaticidade de crepúsculos e buscando retratar a terra brasileira, representada em grandiosas paisagens ainda selvagens. Em 1917 retornou ao Brasil e em 1919 fundou a Colmeia dos Pintores, uma instituição para ensino livre de arte que alcançou a quantidade de 300 alunos em certa época.

   Alcides Cruz (1913-1986), pintor carioca. Ri aluno do Liceu de Artes e Ofícios e tomou parte no grupo "Colmeia dos Pintores". Estudou na Escola Nacional de Belas Artes, onde foi aluno de Henrique Cavaleiro. Dedicou-se à paisagem e à figura humana, demonstrando, em suas obras, a influência do impressionismo. Em 1970 conquistou o Prêmio de Viagem ao Estrangeiro do Salão Nacional de Belas Artes, quando teve a oportunidade de frequentar museus de Portugal, Espanha, Inglaterra, Holanda e Itália.

Edgar Walter (Nova Lima, MG, 1917-Teresópolis, RJ, 1994) talvez seja um dos mais importantes e influentes pintores de paisagistas brasileiros. Além disso, foi também pintor de retratos, naturezas-mortas e cenas urbanas. Aos 18 anos chegou a tentar carreira com balé clássico e até a fazer parte do corpo de baile do Teatro Municipal do Rio de Janeiro, desistindo da carreira pela pintura. Fez-se também mestre do sapateado. Com os primeiros ensinamentos de Oswaldo Teixeira, tornou-se em breve dono de uma técnica bem particular. Em 1953  recebeu merecidamente o Prêmio de Viagem ao Estrangeiro, tendo vivido na Inglaterra e na Itália por dois anos. Como professor no Instituto de Belas Artes do Rio de Janeiro, ajudou na formação de Alberto Braga, Wilson Vicente, Roberto Leal, Olavo Rezende, Luiz Pinto, Benedito Luizi, dentre outros.
Vídeo "Edgar Walter: O Pintor Brasileiro":https://youtu.be/Jmpsr5VvxrI

¹⁰ Oswaldo Teixeira do Amaral (Rio de Janeiro, 1905-Rio de Janeiro, 1974) foi um pintor, crítico, professor e historiador de arte. Foi aluno de Batista da Costa, pintura, e de Rodolfo Chambellan, em desenho de modelo-vivo, na Escola Nacional de Belas Artes. No Salão Nacional de Belas Artes conquistou a Grande Medalha de Prata em 1923, o Prêmio de Viagem à Europa em 1924, a Medalha de Ouro em 1928 e a Grande Medalha de Honra em 1938. Fundou e dirigiu o Museu Nacional de Belas Artes durante 25 anos (de 1937 a 1961).

¹¹  Henrique Campos Cavalleiro (Rio de Janeiro, 1892-Rio de Janeiro, 1975) foi pintor, desenhista, caricaturista, ilustrador e professor. Estudou no Liceu de Artes e Ofícios do Rio de Janeiro e na Escola Nacional de Belas Artes, onde foi aluno de Eliseu Visconti e Zeferino da Costa. Conquistou o Prêmio de Viagem à Europa da Escola em 1918. Em Paris, frequentou a Académie Julian e participou de salões de arte. De volta ao Brasil, em 1927 conquistou medalha de ouro na Exposição Geral de Belas Artes e, em 1951, participou da I Bienal de São Paulo. É lembrado como caricaturista e ilustrador, em diversos periódicos cariocas.

¹²  Armando Martins Vianna (Rio de Janeiro, 1897-Rio de Janeiro, 1992) foi pintor, desenhista e professor. Em 1919, inicia sua formação artística; como aluno livre fez seus estudos na Escola Nacional de Belas Artes, onde teve como professores Rodolfo Amoedo e Rodolfo Chambelland, e no Liceu de Artes e Ofícios sob orientação dos professores Eurico Alves e Stefano Cavalaro. Em 1928, matricula-se como aluno livre na Académie de la Grande Chaumière em Paris. Pintor eclético, no decorrer de sua longa carreira evoluiu do academicismo ao impressionismo, fazendo algumas incursões no modernismo cubista. Realizou obras a óleo e aquarela, praticando uma pintura tradicional e realista, calcada no desenho e no colorido fiel. Paisagens, nus, flores e pintura religiosa constituem a parte preponderante de sua produção. Foi publicado um livro da Editora Pinakotheke contendo dados referentes à sua vida e obra. Em 01/09/2012 foi inaugurado o Museu Armando Vianna, na Fazenda São Francisco, em São José do Barreiro-SP, com vídeo disponível no YouTube sobre esse evento artístico.
Link: https://www.youtube.com/watch?v=SialNkPcxJg

¹³  Pedro Américo de Figueiredo e Melo (Areia, Paraíba, 1843-Florença, Itália, 1905) foi romancista, poeta, cientista, teórico de arte, ensaísta, filósofo, político e professor, mas principalmente é lembrado como um dos mais importantes pintores acadêmicos do Brasil, deixando obras de impacto nacional. Recebeu apoio do governo imperial para se formar na Academia Imperial de Belas Artes e para fazer seu aperfeiçoamento artístico em Paris com grandes mestres da pintura. Ao retornar ao Brasil passou a dar aulas na Academia Imperial, ganhando projeção com grandes pinturas de caráter cívico e heróico, inserindo-se no programa civilizador e modernizador do País fomentado pelo imperador Dom Pedro II. Seu estilo na pintura fundia elementos neoclássicos, românticos e realistas, sendo sua produção uma das primeiras grandes expressões do Academismo no Brasil, sendo por isso mesmo muito criticado por aqueles, principalmente os modernistas, que achavam que o sistema acadêmico era conservador, elitista e distante da realidade nacional. Apesar disso, seus grandes méritos artísticos e raros dotes intelectuais seguramente fazem dele um dos maiores pintores que o País produziu. Deixou obras que permanecem vivas até hoje no imaginário coletivo, como Batalha de Avaí, Fala do Trono, Independência ou Morte! e Tiradentes esquartejado.
 


III.  AGRADECIMENTO



Em 30/07/2013, o confrade no Instituto Histórico e Geográfico local, historiador, pesquisador e escritor José Antônio de Ávila Sacramento brindou-me com o recorte da matéria que deu nome a este artigo, com as referências disponíveis, alertando-me todavia que não constava o nome de seu autor. Registro aqui meu sincero agradecimento pelo gesto amistoso do confrade sabedor de meu interesse pela vida e obra do talvez maior intelectual são-joanense.

Resta-me, contudo, uma dúvida: Seria o próprio Lincoln de Souza esse autor que preferira omitir seu nome no cabeçalho do artigo? Em caso afirmativo, é óbvio que preferia não se expor, deixando a divulgação a cargo da redação do periódico são-joanense, embora em seu espírito já germinasse a suspeita do risco que corria, ofertando à população de sua terra natal e à visitação dos turistas o seu legado cultural mais precioso. Certamente já atormentavam seu espírito algumas dúvidas: Será que saberíamos nós, os vindouros, cuidar desses seus bens culturais, através de um sistema de controle patrimonial eficiente e acompanhamento da sua evolução ao longo do tempo? Estaríamos aptos a responder, com ações positivas para o bem comum, à confiança em nós depositada? Estaríamos à altura de custodiar o seu legado, zelando pela realização de seus últimos desejos? 
 



IV.  BIBLIOGRAFIA

 
BRAGA, F.J.S.: "O que há do Aleijadinho em São João del-Rei",  postado em 07/07/2016. Disponível in http://bragamusician.blogspot.com.br/2016/07/o-que-ha-do-aleijadinho-em-sao-joao-del.html

                                 — "Comentários à 1ª edição do jornal 'Tribuna Sanjoanense'", postado em 06/12/2011. Disponível in http://saojoaodel-rei.blogspot.com.br/2011/12/comentarios-1-edicao-do-jornal-tribuna.html

                         — "O imortal Licoln de Souza, um autêntico intelectual são-joanense", postado em 12/04/2013. Disponível in http://bragamusician.blogspot.com.br/2013/04/o-imortal-lincoln-de-souza-um-autentico.html


RUBENS, Carlos: Pequena História das Artes Plásticas no Brasil. Biblioteca Pedagógica Brasileira. Série 5ª: Brasiliana, vol. nº 198. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1941, 386 p.


UM PRESENTE de valor de Lincoln de Souza. (s/a) São João del-Rei: PONTE DA CADEIA, edição nº 56, datada de 30/06/1968.

domingo, 3 de julho de 2016

HOMENAGEM PÓSTUMA AO HISTORIADOR FÁBIO NELSON GUIMARÃES (1932-1996)


Por Francisco José dos Santos Braga

I.  INTRODUÇÃO



Durante a reunião ordinária nesta data de 03 de julho de 2016, na "Sala Fábio Nelson Guimarães", onde normalmente são realizadas as reuniões na sede do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, o presidente José Cláudio Henriques relembrou o passamento do sócio-fundador do nosso Instituto, o saudoso Fábio Nelson Guimarães, ocorrido há 20 anos atrás, mais exatamente no dia 1º de julho de 1996. Nesta data de hoje, fomos premiados com a presença honrosa do presidente da ALL-Academia Lavrense de Letras, jornalista José Passos de Carvalho, e do 2º Tenente Magalhães, representante do 11º Regimento de Infantaria de Montanha. Fomos todos os confrades surpreendidos com uma preciosa doação, pelo presidente da ALL, de um Livro de Atas referente à fundação do 8º Batalhão de Polícia Militar, de Lavras, com documentos e lançamentos de 1932 a 1953.

A referência pelo presidente do nosso IHG feita a Fábio Guimarães, esse grande vulto são-joanense, incentivou-me a fazer alguma homenagem para reverenciar-lhe a memória. Pesquisando o seu caderno preto de recortes de jornais, colados sequencialmente e selecionados conforme a sua ordem de importância, decidi falar aqui de dois momentos de sua vida, que o Blog de São João del-Rei se esmera em divulgar para motivar novos pesquisadores a empreender uma viagem maravilhosa através de suas obras imortais, que foram muitas. Os dois momentos que aqui serão retratados se referem à sua posse na presidência do C.A.C.-Centro Artístico e Cultural de São João del-Rei em junho de 1962 e à sua admissão no Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, na categoria de sócio correspondente em setembro de 1962.

Como as matérias selecionadas pelo historiador estão coladas em páginas do caderno preto, provavelmente todas extraídas do jornal "Diário do Comércio", onde Fábio Guimarães era permanente colaborador, ele fez questão de, logo abaixo do recorte, assinalar a respectiva data da notícia. É também da mesma forma que será referenciada a notícia fornecida pelo historiador. 

Em geral, essas curtas matérias eram extraídas da "Coluna do CAC", espaço dedicado pelo Diário do Comércio à instituição artístico-cultural que gozava de grande prestígio junto àquele periódico são-joanense.

Foi rigorosamente observada a grafia de época.



II.  RECORTES SOBRE OS PREPARATIVOS E O EMPOSSE DE FÁBIO NELSON GUIMARÃES NA PRESIDÊNCIA DO C.A.C., BEM COMO SUAS PRIMEIRAS AÇÕES À FRENTE DA INSTITUIÇÃO


1. "Ouço comentários que antecipam uma mudança na presidência do Centro Artístico e Cultural. Os boatos adiantam que o novo presidente será o historiador Fábio Nelson Guimarães, em substituição ao prof. Antônio Elias Cecílio." (8/6/1962)

2. "O historiador Fábio Nelson Guimarães vai substituir o professor Antônio Elias Cecílio na presidência do Centro Artístico e Cultural. Ficam, assim, confirmados os boatos. Em palestra com o novo presidente do C.A.C., soubemos que as futuras reuniões dessa instituição serão bimensais, com duração máxima de 40 minutos e, no final de cada uma, um conferencista terá alguns minutos para dissertar sobre tema pré-estabelecido. Aposto que as reuniões agora serão mais alegres e movimentadas. Parece que Fábio vai entrar com o pé direito." (13/6/1962)

3) "No próximo dia 8, reunião do Centro Artístico e Cultural. O Pe. Luiz Zver, na ocasião, dissertará sobre o tema "O que é a política". Na segunda reunião dessa instituição, sob a direção do historiador Fábio Guimarães, dr. Álvaro Vianna Filho falará sôbre o parlamentarismo e a realidade brasileira. Aliás, sôbre êsse assunto o ilustre advogado vem fazendo uma série de conferências na Escola Técnica de Comércio Tiradentes, contando também com a presença de alguns alunos da Faculdade de Filosofia Dom Bôsco."(28/6/1962)

4) O C.A.C. estêve reunido domingo último, dia 8, sob a presidência do sr. Fábio N. Guimarães, em sessão que durou precisamente 40 minutos. Na ocasião tratou-se de assuntos de interêsse da entidade, além da comunicação aos consócios da vinda a São João do dr. Paulo Kruger Corrêa Mourão, ilustre historiador mineiro e catedrático da Faculdade de Engenharia da UMG. O dr. Paulo Kruger proferirá duas palestras: "O barroco e as igrejas de São João del-Rei" e "Estudos sôbre São João antigo", respectivamente nos dias 20 e 22 de julho.

A seguir, o sr. presidente passou a palavra ao pe. Luiz Zver, o qual palestrou sôbre "O que é a política". Partindo da significação etimológica, o orador dissertou em base filosófica, ética e objetiva. Fêz um histórico desde Confúcio e analisou o pensamento de Platão, Aristóteles, Santo Agostinho, Santo Tomás, Marchiavelli, Hobbes, Locke, e a palavra dos últimos Papas. Pe. Luiz foi muito aplaudido e distribuiu a todos os presentes um estudo do pe. Tiago Adão Lara a respeito da Democracia.

Está marcada nova reunião do CAC para o dia 12 de agôsto, quando fará uso da palavra o dr. Álvaro Vianna Filho debaixo do tema "Parlamentarismo, seu mecanismo, vantagens e desvantagens". Os oradores têm tempo marcado para suas exposições. (S/d)

5) Paulo Kruger Corrêa Mourão, professor na Universidade de Minas Gerais, autor de diversas obras históricas, aceitou o convite do sr. Fábio Guimarães para pronunciar entre nós, algumas conferências. Na ocasião, Paulo elogiou muito o jovem historiador Fábio Guimarães e o autor dos registros biográficos sanjoanenses. Paulo é irmão do general Olímpio Mourão Filho, ex-comandante do Regimento Tiradentes. Virá em julho acompanhado de sua exma. espôsa  e permanecerão nesta cidade por uma semana. (24/6/1962)

6)  O C.A.C. está dirigindo ao povo o seguinte 
CONVITE

O Dr. Paulo Kruger Corrêa Mourão, engenheiro, historiador, professor da Universidade de Minas Gerais e autor de vários livros, atendendo ao convite da diretoria do C.A.C., virá a esta cidade na segunda quinzena deste mês de julho, para pronunciar algumas conferências.

Tenho a honra de convidá-lo, e a sua distinta família, juntamente com seus amigos, sobretudo para as duas seguintes:
Dia 20, às 19,30 hs. na União Sírio-Libanêsa, quando o Dr. Kruger falará sôbre o Barrôco e as Igrejas de São João del-Rei.
Dia 22, no Círculo Militar, quando o conferencista abordará Um Estudo sôbre São João del-Rei antigo.

Agradeço antecipadamente seu comparecimento e de quantos por seu intermédio chegarem ao conhecimento deste convite que por meu intermédio lhe dirige o C.A.C.
Fábio N. Guimarães
Presidente em exercício

7) Encontra-se na cidade o dr. Paulo Kruger Corrêa Mourão, engenheiro, historiador, jornalista e professor na Universidade de Minas Gerais, acompanhado de sua exma. esposa, em viagem de recreio e de estudos, a convite do sr. Fábio Nelson Guimarães. É, também, autor de diversas obras de grande valor histórico. Na sexta-feira passada, na União Sírio-Libanêsa, dr. Paulo falou sôbre o "Barrôco e as igrejas de São João del-Rei". Hoje, no Círculo Militar, o conferencista abordará o tema "Um Estudo sôbre São João del-Rei". Trata-se de mais uma grande realização do Centro Artístico e Cultural agora sob a direção do historiador Fábio N. Guimarães. (24/7/1962)

8)  As duas conferências pronunciadas pelo historiador Paulo Kruger Corrêa Mourão foram de grande utilidade para o sanjoanense que, apesar de todos os esforços, continua a não querer participar de muitas reuniões de caráter cultural e a pregar aos quatro cantos que êle é um dos grandes admiradores da cultura. Felizmente, dr. Paulo Kruger foi prestigiado por um grupo seleto de intelectuais que o aplaudiram em ambas as reuniões.

Durante sua estada entre nós, o historiador Fábio Nelson Guimarães, presidente do Centro Artístico e Cultural, fez as honras da casa. Na residência do sr. e sra. Onésimo Guimarães, o sr. e sra. dr. Paulo Kruger foram recebidos, na tarde de sábado último, para um alegre bate-papo, quando pudemos observar e confirmar que êsse casal é dos que sabem receber bem, em nossa sociedade. A grande surprêsa, na noite de sua primeira palestra, foi a notícia de que, também, Luiz de Melo Alvarenga é historiador... e dos bons, afirmaram. Entre os que prestigiaram, anotamos: revmo. Bispo Diocesano Dom Delfim Ribeiro Guedes, revmo. pe. Luiz Zver, historiador dr. Augusto das Chagas Viegas e o sr. e sra. dr. Ronaldo Simões Coelho. Ele, agora, é o presidente regional da A.M.M.G.D. Ana Maria Tostes Simões Coelho apareceu, naquela noite, pela primeira vez em reunião social após receber a visita da cegonha, com um conjunto em tom gelo muito simpático. (26/7/1962)

9)  IMPRESSÕES DE SÃO JOÃO DEL-REI

Especial para o "Diário do Comércio"

Paulo Kruger Corrêa Mourão

A situação especial de São João del-Rei, quase duas vezes e meia centenária, motiva sua qualidade de (cidade) preservada e tradicional. Servida por um pequeno trecho de estrada de ferro e não tendo, até bem pouco, uma rodovia apropriada a grandes movimentos, São João não mudou substancialmente.

Graças assim o tenha sido! Pôde conservar sua poesia, suas tradições, o cerimonial dos seus belos templos, a doce melodia dos sinos agradáveis que nos convidam à elevação da alma! Aqui se sente como que a revivescência daqueles tempos felizes em que a filosofia do Evangelho governava os povos.

Tendo em vista a corrupção dos dias que correm, receio venha o turismo perturbar a vida da formosa urbs: êsse turismo aliás tão necessário para que o resto do país conheça suas belezas e se lhe aumentem as rendas para as grandes realizações da cidade confortável. Realmente é de recear-se seja a cidade invadida por essa onda de mulheres contaminadas pelo repelente modernismo, com os seus indecorosos trajes masculinos e insolentes cigarros — tristes exemplares de futuras mães, cujos filhos, mal formados, serão os donos dêste infeliz país, na próxima geração.

Voltemos, entretanto, a falar da "princeza do Oeste": Que cidade independente! Não vai no cabresto dos políticos profissionais. Quantos valôres no campo intelectual e que interêsse pelas coisas do passado e pelo cultivo da inteligência e dos sentimentos elevados do coração!

É inconcebível, por exemplo, o comunismo ateu em São João del-Rei.

Aqui fui encontrar o C.A.C. e ilustres intelectuais: a figura respeitável do historiador Dr. Augusto Viegas; a inteligência moça e o valor precoce de Fábio Guimarães; a exuberância contagiante do escritor Gentil Palhares; a gravidade valorosa de Paulo Christófaro; o método e a vocação biográfica de Sebastião Cintra; os pendores de cronista social de Osni Silva. Enfim: tantos e tantos homens capazes de viver as glórias passadas da vetusta São João del-Rei.

Honrou-me com sua visita a personalidade de irradiante otimismo e simpatia do sr. Nelson Lombardi. Sem que eu seja político, pude constatar positiva receptividade de seu nome para futuro Prefeito. Com seu espírito moço e suas arrojadas idéias de empreendedor, quero crer que, se eleito, a linda cidade não terá apenas um administrador de rotina; porém um autêntico realizador que possibilitará aos seus habitantes progressos quiçá insuspeitados. 

São João está igualmente muito bem servida de pastor, tendo na pessoa do seu ilustre Bispo, Dom Delfim, um concretizador dinâmico de suas necessidades espirituais. Pude ver o admirável Seminário de Tiradentes adaptado na casa histórica do Padre Toledo.

Também do ilustre padre Luiz Zver trouxe grata recordação e pude constatar, pessoalmente, a grande realização do educandário de Dom Bosco e da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras a êle anexo.

Assim, vi São João, em inesquecíveis dias de julho de 1962. (3/8/1962)

10) UM  VISITANTE  ILUSTRE

Gentil Palhares

Acompanhado de sua digníssima espôsa — senhora Maria Corrêa Mourão — honrou a cidade e o C.A.C., com sua presença, o ilustre historiador mineiro Dr. Paulo Kruger Corrêa Mourão. Especialmente convidado pelo Presidente do CENTRO ARTÍSTICO E CULTURAL — jovem Fábio Nelson Guimarães, Paulo Kruger passou aqui uma semana, tôda ela dedicada às nossas artes e à nossa história. Na oportunidade proferiu duas conferências, a primeira no Salão do Clube Sírio Libanez e, a segunda, no Círculo Militar. O primeiro tema foi sôbre o barroco e as igrejas de São João del-Rei, ocasião em que o prestigiado historiador e rebuscador de nossa história teceu considerações interessantes sôbre as artes de nossa terra, exaltando a religião como fator preponderante para o florescimento do barroco. Não há dúvida — e afirmara mesmo Paulo Kruger — de que Antônio Francisco Lisboa tenha sido o autor de vários trabalhos internos do templo de São Francisco, a julgar por determinados detalhes dos altares laterais, peculiares ao entalhador mineiro.

A segunda conferência versou sôbre a história de S. João del-Rei, a partir de nossa fundação, aflorando o conferencista vultos destacados que ajudaram a dar nome à terra sanjoanense, dêsde os seus primórdios. Prestigiou, grandemente, os conceitos emitidos no livro FUNDAÇÃO HISTÓRICA DE SÃO JOÃO DEL-REI, de autoria de Fábio Nelson Guimarães.

O historiador mineiro foi muito aplaudido nas suas duas palestras, pôsto fôsse, como sempre, reduzido o número de assistentes. Estiveram presentes, constituindo honra insigne para o CAC, Dom Delfim Ribeiro Guedes, Dr. Augusto das Chagas Viegas, Pe. Luiz Zver, Luiz de Melo Alvarenga (historiador sanjoanense), entre vários outros próceres de destaque no nosso setor intelectual.

Paulo Kruger Corrêa Mourão, figura simples, modesta e cativante, fez questão de visitar todos os nossos templos e foi assim que, após se extasiar com o CARMO e SÃO FRANCISCO, rumou para Tiradentes. E saiu de lá verdadeiramente encantado com a Matriz, sem olvidar o modo gentil com que fôra tratado pelo Vigário da cidade histórica, o qual fez funcionar o magnífico órgão do templo majestoso. Naquela cidade visitou ainda a igreja do Rosário e o Seminário, louvando e engrandecendo a extraordinária obra de Dom Delfim. Fábio Guimarães recepcionou em sua residência o casal ilustre, o qual recebeu, também, o apôio de vários membros do CAC, que o acompanharam em sua excursão à nossa cidade.

Paulo Kruger C. Mourão, que é engenheiro formado pela Escola de Ouro Preto, é membro do Instituto Histórico e Geográfico de M. Gerais, da Sociedade de Engenharia e diversas outras agremiações científicas e literárias. Tem, no momento, nove obras publicadas, tôdas versando sôbre arte e história, das quais é cultor apaixonado.

Sua estada em São João del-Rei foi das mais proveitosas para todos nós. (12/8/1962)



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III.  ELEITO FÁBIO GUIMARÃES PARA O INSTITUTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE MINAS GERAIS


A recente publicação do livro "Fundação Histórica de São João del-Rei", cuja primeira edição já se acha completamente esgotada, garantiu para o jovem farmacêutico Fábio Nelson Guimarães o ingresso, na qualidade de sócio correspondente, no Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, respeitável sodalício que sempre timbrou em recrutar com esmerado escrúpulo os seus membros.

Eleito por unanimidade, em sessão de 18 de setembro último, o culto e festejado conterrâneo atingiu a tão alta consagração antes de completar 30 anos de idade, circunstância que valoriza sobremodo o reconhecimento, por parte da entidade representativa da cultura mineira e altamente categorizada, dos invulgares méritos do historiador Fábio Guimarães.

Tratando-se de mais uma vitória de distinto filho de São João del-Rei, que tão cêdo demonstra acentuada vocação para sérios estudos históricos de nossa terra, é natural que se mobilize o povo sanjoanense para tributar ao laureado autor calorosas homenagens.

"Diário do Comércio", que tem em Fábio Guimarães um apreciado colaborador, rejubila-se com o gratíssimo acontecimento, enviando-lhe felicitações pelo grande êxito alcançado, votos que prazerosamente estende aos seus dignos e queridos pais. (18/10/1962)


IV.  AGRADECIMENTO


Gostaria de registrar meu agradecimento à confreira de IHG, escritora e Profª  Betânia Maria Monteiro Guimarães, viúva de Fábio Nelson Guimarães, a qual tem facilitado e incentivado minhas pesquisas sobre as ações gloriosas do grande historiador são-joanense.

sábado, 2 de julho de 2016

COMO A AGULHA PUXA A LINHA..., por Francisco De Filippo


I.  Texto da autoria de Francisco De Filippo ¹ (aluno do 3º ano do Curso Clássico em 1946)
 
A Assunção de N. Senhora — Navios atômicos e seus reflexos na moda feminina A ação da polícia federal — Dois bicudos não se beijam — João Neves da Fontoura em Berlim — Portinari em Londres — O  I.B.E.C.C. 

Quinta-feira, dia quinze, a Igreja festejou a Assunção de N. Senhora, festa de grande significação para o mundo católico. Muitos nem ligaram para a importância do dia. Afinal não lhes interessava saber que N. Senhora, por especial privilégio de seu Divino Filho, entrou no Céu com a alma unida ao corpo. Todos, porém, guardam profunda lembrança do feriado que o dia nos proporcionou. E que feriado gostoso...! Uma saída no meio da semana vale um mundo para aqueles que têm o hábito ou oportunidade de sair só aos domingos.

E por falar em saída vem-me à lembrança uma notícia de jornal: "Dentro de cinco anos teremos navios atômicos" e os navios movidos pela força atômica terão uma nova forma. Aparentemente nenhuma relação há entre uma cousa e outra mas como a agulha puxa a linha, uma idéia puxa outra.

Lembrei-me dos que gostam de ver as pequenas. Ora, as mulheres, em geral, têm uma tendência extraordinária para as novidades. Surgiram os tais modêlos aerodinâmicos e logo nós vimos muitas formas aerodinâmicas pelas ruas... Agora surge o modêlo atômico. Santo Deus, que será de nós?! Muitas lançam chispas pelos olhos, e abrasam, com um simples olhar, o coração mais frio. E se elas arranjarem a tal radioatividade?...

Enfim contra todas as armas têm aparecido neutralizantes e, se ficarmos de todo desprotegidos, recorreremos à polícia. Sim, pelo que vejo a polícia está se tornando digna da nossa admiração. Basta ver a batida por ela realizada nas fábricas de dôce do Rio de Janeiro. Lí no jornal "A Noite" o relato da perícia policial efetuada em algumas delas. Com franqueza até fiquei enojado. Basta saber que havia baratas e ratos misturados com massas de biscoitos finos, ovos estragados já com pintos, empregados na fabricação de deliciosas massas, esplêndida calda de dôce feita em latas de lixo. Onde está a consciência? Será que a ânsia de enriquecer nos cega? Os turcos poderiam dar-nos a resposta. Acho que cega, pois vi uma notícia do outro mundo: "A Turquia baseará sua política externa na aliança com a Inglaterra".

O dr. João Neves da Fontoura ² não gostou do negócio, pois partiu imediatamente para Berlim, afim de verificar a possibilidade de solução de vários casos relativos às reparações e dívidas alemãs ao Brasil. O dr. João Neves não devia ter se incomodado tanto. Como dois bicudos não se beijam, a Turquia e a Inglaterra não se darão bem e os nossos interêsses ficarão a salvo, principalmente agora, quando a Inglaterra está disposta a gastar dinheiro com o nosso magnífico Portinari. A notícia talvez não seja conhecida de todos. É possível que Cândido Portinari faça uma exposição de suas obras no "Major Art Gallery" assim que terminar sua exposição em París. Portinari, que pintou uma das salas da Biblioteca do Congresso de Washington e fez o retrato da sra. Franklin Roosevelt, inaugurará sua exposição na Galeria Charpentier, em París, a vinte de setembro.

Até lá, se Deus quiser, o nosso Instituto Brasileiro de Educação, Ciência e Cultura já terá dado jeito para que tenhamos livros melhores e por menor prêço. E já dá tarde...

Fonte: O PORVIRórgão oficial do Colégio Santo Antonio de São João del-Rei, Ano XXII, nº 334, edição de agosto de 1946. 



II.  NOTAS EXPLICATIVAS, por Francisco José dos Santos Braga



¹  Trabalhos publicados pelo saudoso Francisco De Filippo (⭐︎ 01/10/1926, Ubá - ✞ 15/12/2015, Belo Horizonte) como colaborador do Blog de São João del-Rei:

http://saojoaodel-rei.blogspot.com.br/2014/03/o-curso-classico-do-colegio-santo.html

http://saojoaodel-rei.blogspot.com.br/2014/03/colaborador-francisco-de-filippo.html

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Notícia oficial do falecimento de Francisco De Filippo, colaborador deste blog:

Declaração de luto oficial de 3 dias pela Prefeitura Municipal de Ubá pela morte de seu ex-prefeito Francisco De Filippo:

Luto Oficial - Ex-prefeito Francisco De Filippo

por Assessoria de Comunicação da PMU


15/12/2015 17:06
Francisco de Filippo

O Prefeito Vadinho Baião decretou Luto Oficial de 3 dias no Município pelo falecimento do ubaense Francisco De Filippo, ex-prefeito de Ubá por dois mandatos, ocorrido na data de hoje.

Nascido em Ubá no dia 01 de outubro de 1926, filho do Sr. Raphael De Filippo e de Dona Auta Lima, Francisco De Filippo cursou bacharelado e licenciatura em Letras Neolatinas na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da UFMG. Lecionou em colégios de Belo Horizonte e no Colégio Estadual Raul Soares de Ubá, durante 15 anos. Licenciou-se para exercer o mandato de prefeito, de 1963 a 1967. Mudou-se para Itaúna onde residiu e trabalhou por 16 anos, período no qual obteve a graduação de Mestre em Letras pela UFMG. Já aposentado pelo Estado retornou a Ubá e trabalhou no Armarinho Santo Antônio, onde ficou até a sua decisão de candidatar-se novamente ao cargo de prefeito, cerca de 30 anos após cumprir o seu primeiro mandato. Reeleito, governou de 1989 a 1992. Francisco De Filippo era casado com Dona Mariza Gomes De Filippo e teve seis filhos: Álvaro, Amílcar, Rodrigo, Filipe, Mônica e Juliana, todos nascidos em Ubá. 

Seus dois governos ficaram eternizados pelo progresso proporcionado à cidade, tanto no campo social, quanto no educacional e econômico. Foi responsável pela desapropriação das margens do rio Ubá à Rua São José, com a abertura de uma avenida para desafogar o tráfego de automóveis, hoje Av. Comendador Jacinto Soares de Souza Lima. Seu segundo governo ficou marcado por 42 importantes realizações tais como a restauração das finanças municipais, reconstrução de seis escolas, aquisição de imóveis para entidades sociais, assim como de terrenos para a construção de casas populares e para instalação do SESI/SENAI. Pode ser apontado, por fim, como importantes realizações de sua administração a abertura de novas avenidas para melhoria do fluxo do trânsito, a canalização de córregos e a pavimentação de ruas da periferia.


Conforme o Decreto nº 5.766 de Luto Oficial, em todas as repartições públicas municipais, as bandeiras do Brasil, de Minas Gerais e de Ubá deverão ser hasteadas em meio mastro.

Cf. in http://www.uba.mg.gov.br/Materia_especifica/60511/Luto-Oficial---Ex-prefeito-Francisco-de-Filippo "em cache"
(Acesso em 01/07/2016)


²   Para os fins deste artigo, interessa saber que João Neves da Fontoura foi um político gaúcho, eleito em 1936 para a Academia Brasileira de Letras. Desde o início da década de 40, exerceu missões diplomáticas junto a organismos latino-americanos. Entre maio de 1943 e fevereiro de 1945, dirigiu a embaixada brasileira em Portugal. Ao regressar ao Brasil em 1945, encontrou o País vivendo o clima da redemocratização, após o longo período do Estado Novo. Ingressou então no PSD e apoiou a candidatura presidencial vitoriosa de Eurico Gaspar Dutra, ex-ministro da Guerra de Vargas. Com a posse de Dutra, Fontoura foi nomeado ministro das Relações Exteriores, cargo que desempenhou durante o ano de 1946.

Para maiores informações, queira consultar o link  abaixo: http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas2/biografias/Joao_Neves_da_Fontoura
(Acesso em 01/07/2016)


Obs.: Esta é uma homenagem que o Blog de São João del-Rei presta ao saudoso Francisco De Filippo, transmitindo à família enlutada suas condolências pelo recente passamento do eterno amigo e colaborador.