terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Reminiscências de Dr. Tancredo de Almeida Neves em 1944

O Blog de São João del-Rei tem o prazer de hospedar um texto da autoria da são-joanense Celina dos Santos Braga, publicado pela Academia de Letras de São João del-Rei em revista comemorativa do centenário de nascimento do Dr. Tancredo de Almeida Neves, lançada em 28 de dezembro de 2010.

Reminiscências de Dr. Tancredo de Almeida Neves em 1944*

Réminiscences du Dr. Tancredo de Almeida Neves en 1944

Por Celina dos Santos Braga

Francisco Nestor dos Santos (✯ Barroso, 26/02/1900  ✞ São João del-Rei, 06/02/1946)

Francisco Nestor dos Santos, meu pai, natural de Barroso mas são-joanense de coração, foi homem trabalhador, inteligente e dinâmico. Gostava de sua profissão de eletricista e dedicava-se com amor a suas tarefas, a ponto de carregar a escada nos ombros para desempenhar seu trabalho. É claro que fazia isso e muitos outros exageros por não haver ainda a proteção do trabalhador em seu local de trabalho, como hoje.

Como era pessoa correta, teve a sorte de encontrar-se, à porta da estação ferroviária da E.F.O.M.- Estrada de Ferro Oeste de Minas, com um espanhol de nome João Sanchez Robles que procurava algum sócio para abrir um ferro-velho, o primeiro em São João del-Rei. Foi assim que, tendo aceito o convite, trabalhou, se dedicou à nova profissão e se enriqueceu com honestidade.

Exercendo seu trabalho como eletricista, era comunicativo e se cercou de muitos amigos, entre os quais de Dr. Tancredo de Almeida Neves, para quem prestou inúmeros serviços em sua residência, onde funciona a “Gazeta de São João del-Rei”. Sabedor do prestígio que gozava a pessoa admirável de Dr. Tancredo e da simpatia que transmitia a todos os que dele se aproximavam, meu pai teve a oportunidade de consagrar-lhe toda a amizade e apreço. Quando aquele precisava dos serviços de meu pai, este o atendia com a maior presteza e dedicação. Assim foi a boa convivência desses dois grandes amigos, e nossa também, de seus filhos.
Tancredo de Almeida Neves (✯ São João del-Rei, 04/03/1910  ✞ São Paulo,  21/04/1985)


Como toda pessoa que se enriquece e cresce na profissão, meu pai cercou-se não só de muitos amigos, como foi dito, mas também de pessoas invejosas de seu progresso. Certa ocasião, trabalhando no depósito de ferro-velho, adquiriu de um adulto uma roda grande, que, conforme veio a saber depois, pertencia à “Caieira” do Coronel Amorim. Alguém invejoso delatou que a referida roda estava de posse de papai. Por isso, ele foi acionado judicialmente pelo dono da roda, o qual exigia a sua restituição, tendo levado o delegado Dr. Nabor a retê-lo por um dia.

Minha família ficou transtornada com o incidente. Não me restou senão ir, com apenas 16 anos, à residência de Dr. Tancredo pedir-lhe para soltar meu pai. Nessa ocasião, eu não passava de uma adolescente, aluna do Colégio Nossa Senhora das Dores, mas era eu quem cuidava das correspondências comerciais de meu pai. Dr. Tancredo deu uma solução imediata ao problema e trouxe papai consigo para o convívio da família.

É claro que ainda mais cresceu nossa amizade.

Depois, Dr. Tancredo subiu na política até se tornar Primeiro Ministro. Infelizmente, contudo, papai não viu sua ascensão, pois faleceu eletrocutado, enquanto trabalhava como eletricista. Mais uma vez, Dr. Tancredo mostrou sua amizade sincera para com nossa família, pois foi o inventariante do espólio deixado por meu pai.

Com justa razão, portanto, eu considero Dr. Tancredo um político ímpar, meu ídolo, a quem serei eternamente grata pelos bens que nos proporcionou, primeiro como amigo, depois como estadista.

* Este artigo saiu publicado na Revista da Academia de Letras de São João del-Rei, Ano IV, nº 04, 2010 (número especial dedicado às comemorações do centenário de nascimento do Dr. Tancredo de Almeida Neves), p. 143-144.



* Celina dos Santos Braga nasceu em 23 de janeiro de 1928 na Rua Coronel Tamarindo em São João del-Rei, sendo a quarta filha de Francisco Nestor dos Santos, natural de Barroso-MG, e Brasilina Sebastiana dos Santos, natural de Vitoriano Veloso, distrito de Prados-MG. Fez o curso primário no Grupo Escolar Maria Teresa, quando este estava situado na residência que pertenceu ao Deputado Mateus Salomé. Obteve o grau de Normalista em 1945 no Colégio Nossa Senhora das Dores, tendo sido aluna do Tenente João Cavalcanti, Domingos Horta, Monsenhor José Maria Fernandes e Irmã Maria Lanna (autora do hino do Colégio), dentre outros. Durante os anos em que cursou esse educandário, foi soprano no coral “Orfeão”, dirigido pelo Tenente João Cavalcanti. Mais...

Colaboradora: Celina dos Santos Braga


Celina dos Santos Braga nasceu em 23 de janeiro de 1928 na Rua Coronel Tamarindo em São João del-Rei, sendo a quarta filha de Francisco Nestor dos Santos, natural de Barroso-MG, e Brasilina Sebastiana dos Santos, natural de Vitoriano Veloso, distrito de Prados-MG.

Fez o curso primário no Grupo Escolar Maria Teresa, quando este estava situado na residência que pertenceu ao Deputado Mateus Salomé. Obteve o grau de Normalista em 1945 no Colégio Nossa Senhora das Dores, tendo sido aluna do Tenente João Cavalcanti, Domingos Horta, Monsenhor José Maria Fernandes e Irmã Maria Lanna (autora do hino do Colégio), dentre outros. Durante os anos em que cursou esse educandário, foi soprano no coral “Orfeão”, dirigido pelo Tenente João Cavalcanti.

Logo após sua formatura, foi nomeada professora na Escola Rural que funcionava na estação ferroviária César de Pina (na atual localidade conhecida por Águas Santas), no município de Tiradentes-MG, tendo que se deslocar diariamente até ali para lecionar para crianças que residiam nas imediações, durante o ano de 1946. Dentre outras crianças, suas alunas, pode-se citar os filhos de João Longatti.

Casou-se em 15 de fevereiro de 1947 com Roque da Fonseca Braga, com quem teve 8 filhos. Educou-os com muita dedicação, tendo todos conquistado pelo menos o grau de Bacharel nas mais diversas áreas do conhecimento.

Cursou o Conservatório Padre José Maria Xavier, no período de 1971-1976. Merecem destaque especial nessa época o Diretor Abgar Antônio Campos Tirado e os Professores Milton Cunha e Joaquim Rocha (Percepção Musical) e Euclides José Correia (Canto e Piano), dentre outros.

Cantou no “Coral Opus 78”, sob a direção do Prof. André Luis Dias Pires, que acumulava a função de Regente do referido coral com a de professor de Percepção Musical e de História da Música. Digno de destaque é o Glória em ré maior (RV 589), de Vivaldi, que fazia parte de seu repertório. Em razão de doença de seu marido e seu posterior falecimento, ficou afastada do piano por quase 30 anos. Atualmente é aluna particular da Prof. Maria Amélia Viegas.

Há 30 anos é catequista da Paróquia Nossa Senhora do Pilar sob a competente direção do Monsenhor Sebastião Raimundo de Paiva.

sábado, 16 de outubro de 2010

Petição do registro civil, ainda que tardio, do Tiradentes

Por Wainer de Carvalho Ávila *


Com Aécio Neves, pela sua brilhante trajetória política, tudo leva a crer que as medalhas serão colocadas nos agraciados pelo Exmo. Sr. Presidente da República Federativa do Brasil. O texto que vai transcrito abaixo, caro leitor, no qual sou procurador das representativas entidades que constam no caput da peça exordial, mereceu parecer favorável do Ministério Público, representado pelo Promotor Adalberto Christo Leite, e tramita na 3° Vara Cível da Real Comarca do Rio das Mortes. Ei-lo:


“Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de São João Del-Rei - MG

O Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, sociedade civil com finalidades cientificas e culturais, sem fins lucrativos, CNPJ 18 994 319/0001-45, com endereço na Rua Santa Tereza, nº 127-Centro (Casa mais antiga), representado por seu presidente José Antônio de Ávila Sacramento e a Câmara Municipal de São João del-Rei, CNPJ 17 749 846 /0001, com endereço na Rua Ministro Gabriel Passos, s/nº, centro, através de seu presidente Maurílio de Caxias Chafy Hallack, representando os vereadores e o povo do município de São João del-Rei; a Academia de Letras de São João del-Rei, entidade associação civil de direito privado, com finalidades culturais, sem fins lucrativos, CNPJ 20 313/28.0001-12, com endereço na Praça Frei Orlando, 90-F, centro, representada pelo seu presidente Antônio Guilherme de Paiva; o Rotary Clube de São João del-Rei (Distrito 4580), CNPJ 02 599 941/0001-70, com endereço na Rua Antônio Tirado Lopes, 51, Villa Marchetti, representado pelo seu presidente Agnelo Alencar Dias; a Loja Maçônica Charitas II, CNPJ 24 739 591/0001-81, com endereço na Av. Presidente Tancredo Neves, 129, centro, representada pelo seu venerável Geraldo Francisco Chaves de Resende e vigilantes; a Associação Comercial e Industrial de São João Del-Rei, CNPJ 24 735 151/0001-56, com endereço na Rua Maria Teresa, nº 20, 2º andar, Centro, representada pelo seu presidente João Afonso Farias; o Lions Clube de São João del-Rei, CNPJ 19 481 654/0001-02, com sede na Rua Rossino Baccarini, nº 43, Tijuco, representado por seu presidente Osvaldo Resende e secretário, conforme instrumentos de mandatos anexos e que passam a integrar este feito por intermédio de seu procurador in fine assinado, estabelecido profissionalmente nesta cidade na Avenida Tiradentes, 538, Centro, e em Belo Horizonte na Rua Thompson Flores, 366/1001, Gutierrez, com o objetivo de estabelecer fato histórico que virá a constituir-se em fato jurídico, requerem o que passam a expor, culminando com o requerimento que será aduzido ao final da presente Justificação Judicial.


DESTA FORMA,

Dizem os peticionários, com supedâneo nos altruísticos interesses desta comunidade, alicerçado nos elevados valores das entidades que firmaram o mandato autorizativo deste pleito, via seus representantes legais com poderes para tal munus e com fulcro na lei civil pátria (Lei 10.406, de 10-02-2002) ainda consolidado no Código de Processo Civil, que, nesta peça fundem-se o respeito à História Nacional e o resgate de um de seus capítulos mais tenebrosos, ao mesmo tempo em que o mais nobre e grandioso, fatos e atos que se entrelaçam na unanimidade dos diversos segmentos sociais e intelectuais legitimados para pedirem a prestação jurisdicional presente, visto ser este feito não só de interesse comum, mas especialmente de ordem augusta e excelsa.


O que se pretende com esta justificação destituída de caráter contencioso, ainda com suporte nos artigos 50, § 4º e 52, § 2º da Lei 6.015/73, é o registro civil, AINDA QUE TARDIO, do conterrâneo ilustre JOAQUIM JOSÉ DA SILVA XAVIER, o TIRADENTES, Alferes do Regimento de Cavalaria Regular de Minas Gerais, nascido na Fazenda do Pombal. Aqui se expõem, non nova sed nove, não coisas novas mas de modo novo, pois o lema de seus seguidores ilustres, patriotas da mais alta estirpe, LIBERTAS QUAE SERA TAMEN, adotado de Virgílio e da SS. Trindade, LIBERDADE AINDA QUE TARDIA, que se ajusta com o seu registro civil, ainda que tardio - Libri Viri Magistri Sunt.


Nossa causa transcende os limites do rigorismo legal e a rijeza e formalismo jurídicos pois uma causa limitada produz efeito limitado: Limitata causa limitatum effectum producit.


A memória brasileira não é muito deificada e inquestionável é o misoneísmo mineiro, culminando com algum descaso que os pesquisadores e historiadores são-joanenses dedicam às personagens de nosso culto histórico. Partindo-se desta premissa, não é raro encontrarem-se manuscritos ou qualquer forma de documento antigo jogados às traças, goteiras e cupins, sem mencionar, por vergonha e pejo, o que serve de pasto a roedores e de divertimento para vandalismo de não poucos. Apenas alguns abnegados, sacrificados seria mais conveniente dizer, tornam-se credores de nossa gratidão e perseguem os tesouros históricos a duros padecimentos, tesouros que revelam apenas o que sobrou de nossa História. Há valioso subsídio a esta assertativa com o depoimento de Hildebrando-Bolívar de Magalhães, filho de Basílio de Magalhães, publicado em “O Jornal”, de 1929, onde noticia o falecimento do religioso Alberto do Amaral Bastos e sua herança, um monte de papéis velhos carcomidos dentro de um caixote, e pertencentes ao arquivo da Matriz do Pilar, no preciso momento em que seriam lançados à fogueira. Salvou-os da chama o maestro João Evangelista Pequeno, indo eles parar nas mãos do escavador de documentos major Samuel Soares de Almeida. Basílio confirma o nobre gesto em depoimento ao jornal “A Noite”, do Rio de Janeiro, em setembro de 1925.


O culto dos acontecimentos marcantes de nossa História e dos vultos maiores da nacionalidade deveria ser uma vocação cívica, antes mesmo do que uma imposição patriótica.Temos indisfarçável tendência para desmerecer nossos próprios feitos e descuramos de restaurar a verdade de acontecimentos dignificantes deturpados e reparar gritantes injustiças. Tudo isso está a rememorar o pecado da omissão, mais grave do que o da ação, no Sermão do Primeiro Domingo do Advento, do jesuíta Antônio Vieira: “Sabei, cristãos, sabei Príncipes, Sabei Ministros, que se vos há de pedir estreita conta do que fizestes; mas muito mais estreita do que deixastes de fazer. Pelo que fizeram, se hão de condenar muitos, pelo que não fizeram, todos”.


Algures já li que há um comprovado complexo de inferioridade, síndrome de catástrofe, e que envolve a cultura nacional, conforme afirmação de Cyro Siqueira, de que no ano de 1873 teve início sórdida campanha contra Tiradentes nas páginas da “História da Conjuração Mineira”, de autoria de Norberto Sousa Silva, monarquista e amigo pessoal de D. Pedro II, onde Tiradentes é visto como “Um moleque, um desmiolado, um louco que conseguiu ser admitido entre os Inconfidentes e pôs tudo a perder...” (Cyro Siqueira in “Tiradentes e a Imagem de um País”, jornal Estado de Minas, pág. 10, de 28 de abril de 2001).


Como compensação de nossa preguiça mental socorreu-nos a criatura celestial Isolde Helena Brans, jornalista gaúcha e advogada campineira, que identifica o movimento precursor da Inconfidência como fonte e nascimento na cidade de Coimbra, em 1785, no chamado “Pacto dos doze estudantes brasileiros que secretamente juraram conquistar a independência da colônia natal a qualquer custo e risco” e com fortes e consistentes provas documentais identifica Silva Xavier como o grande embaixador e legítimo estadista do movimento no triângulo Brasil, França, Estados Unidos. Consoante publicações, com destaque para o livro “Tiradentes Face a Face” (Riode Janeiro, 1992, 84 páginas, patrocinado pela Xerox), e, ainda, para o artigo publicado no jornal “Estado de Minas de 15 de dezembro de 2001, pág. 04, “Tiradentes viveu e conspirou, na Europa, por cerca de um ano e meio”. Houvesse espaço e comportasse esta petição, juntaria farta documentação referente ao rábula Albergaria, procurador do Alferes e que, munido de procuração, recebeu, durante um ano, seu soldo, em Vila Rica, no período em que viveu fora do Brasil.


A par disso, se avançarmos decididamente nas pesquisas, veremos que alguns dos sediciosos podem ter deixado manuscritos, anotações ou diários, escondidos estrategicamente, quem sabe em códigos, talvez usando codinomes, o que era normal e sobretudo prudente, na ocasião e naquela peculiar situação. Algum museu, daqui ou de além-mar, poderá, se houver vontade, esclarecer pontos obscuros ou controvertidos. O exemplo dos caixotes com papéis carcomidos que seriam incinerados com a certidão eclesiástica do menino Xavier reforça a tese, já que fato idêntico ocorreu e consta nos arquivos da Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar, nesta cidade, referente ao primeiro sacramento de Francisca de Paula de Jesus, a Nhá Chica, em processo de beatificação na Santa Sé. Monsenhor Sebastião Paiva conseguiu recuperar, incólume, um velho livro extraviado e milagrosamente devolvido por um devoto, o qual jamais poderia imaginar que aquela peça, aparentemente sem valor e sem utilidade, encerrava a revelação de uma futura santa da Igreja Católica Romana. Registrem-se dois fatos pouco airosos para nós são-joanenses: Nhá Chica nunca foi registrada civilmente, apesar de ser do primeiro quartel do século XX, e no rol dos Bem-Aventurados a beata é identificada como Nhá Chica de Baependi, Diocese de Campanha e não de São João del-Rei, mesmo constando em seu batistério que foi dada à luz aqui na Vila de Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno (hoje distrito do Rio das Mortes). Se em algum recanto, talvez poeirento, de Ouro Preto, São João del-Rei, Tiradentes, Resende Costa, Borda da Mata, Prados ou Lagoa Dourada, Cebola, Ouro Branco ou Rio de Janeiro, Torre do Tombo, Louvre ou Nova York pode estar um escrito ou um bilhete de um inconfidente ou de quem o ajudou no estrangeiro. A historiografia do movimento pode abater-se sobre nós e mostrar terrível verdade, aquela que não queremos conhecer. Só sabemos as verdades ditadas por juízes submissos, por depoimentos de delatores e acima de tudo aquelas versões criadas e mandadas inserir e constar pela louca Maria Primeira. Tudo, tudo mesmo, está na versão policialesca de quem redigiu os AUTOS DA DEVASSA.


Como em toda questão de vulto e que encerra sentimentos altruístas e patrióticos, devemos iniciar as provas documentais coligidas pelo autor de nomeada além fronteiras na monumental obra AS VILAS DEL-REI E A CIDADANIA DE TIRADENTES, da coleção Documentos Brasileiros, publicada no ano de 1976, pelo Instituto Nacional do Livro, Ministério da Educação e Cultura, que é EDUARDO CANABRAVA BARREIROS (obra que acompanha esta peça vestibular, na sua versão original). Na obra, que é aceita nacionalmente como documento incontestável, o autor assim se manifesta:

“Quanto aos homens, emergem eles de cada área como plantas de um aral, sujeitos civilmente às jurisdições de cada termo (...) termos esses que se configuram em decorrência de atos e leis próprias, não deixando assim, dúvida nenhuma quanto à cidadania dos que viessem `a luz em seus âmbitos territoriais. As interferências indevidas, passageiras, nos termos de cada vila, não lhes retiravam a personalidade histórico-geográfica, estabelecida por leis ou atos adequados (...) mas a verdadeira finalidade dessa busca é estabelecer a cidadania de Tiradentes, o que julgamos também ter alcançado. Anexamos ao presente os pareceres das mais altas instituições histórico-geográficas, como sejam o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o Instituto de Geografia e História Militar do Brasil, os quais enriquecem este ensaio. Restava, todavia, o aspecto legal ou jurídico dessa cidadania, e que fugia a nossos conhecimentos. Para tanto submetemos o presente trabalho ao Egrégio Instituto dos Advogados do Brasil, órgão também de âmbito nacional e cujas conclusões complementaram as de ordem histórica e geográfica (...) Com isso finalizamos as pesquisas contidas neste livro, afirmando nossa convicção de que o herói tutelar do Brasil, o Tiradentes, nasceu no termo da Vila de São João del-Rei.” (grifamos)


A conclusão do nacionalmente acatado cartógrafo e historiador, utilizando-se de uma figura geométrica em que os ângulos A, B e C simbolizam a naturalidade do protomártir, leciona e ensina:

JOAQUIM JOSÉ DA SILVA XAVIER, O TIRADENTES,

Ângulo A:

Nasceu na Fazenda do pombal. “Auto de perguntas ao Alferes Joaquim José da Silva Xavier.” E sendo perguntado, como se chamava, de quem era filho, donde era natural, se tinha algumas ordens, Se era casado, ou solteiro, e que ocupação tinha. Respondeu que se chamava Joaquim José da Silva Xavier, filho de Domingos da Silva Santos e da sua mulher Antônia da Encarnação Xavier, NATURAL DO POMBAL TERMO DA VILLA DE S. JOÃO D’EL-REY, capitania de Minas Geraes, que tinha quarenta e hum annos de idade e que era solteiro, que não tinha Ordens alguas, e com effeito, vendo-lhe eu o alto da Cabeça vi que não tinha tonsura algua e que era Alferes do Regimento da Cavallaria paga de Minas Geraes”.

Ângulo B:

“Livro para servir de assentos dos batizados da FREGUEZIA DE N. S. DO PILLAR DE SÃO JOÃO D’EL-REY... 1742-1949 Fº 151 rº” Aos doze dias do mez de novembro de mil setecentos e quarenta e seis annos, na capella de São Sebastião do Rio Abaixo o Reverendo Padre João Gonçalves Capellão da dita Capella baptizou e poz os Santos Óleos a Joaquim filho legítimo de Domingos da Silva dos Santos e de Antônia da Encarnação Xavier; foram padrinhos Sebastião Ferreira Leytão, e não teve madrinha; do que fiz este assento. O coadjtor Jeronymo da Fonseca Alv.

Ângulo C:

DECLAROU-SE NATURAL DO TERMO DA VILLA DE S. JOÃO DEL-REI. SÃO OS DOCUMENTOS QUE FALAM! RESPEITEMO-LOS...

A: Só em 1755, em virtude da Correição de 17 de fevereiro passaria a Fazenda do Pombal à jurisdição da Vila de São José Del-Rei, estando JÁ TIRADENTES COM NOVE ANOS.

B: Localizada ao norte ou ao sul do Rio das Mortes, esta capela de S. Sebastião pertencia à Vila de São João Del-Rei, QUANDO DO BATIZADO DE TIRADENTES.

C: É o próprio Alferes que, quarenta e três anos após seu batismo, vem dizer-se natural do termo da Vila de São João del-Rei. Vide Prancha 21-D-pág.113.


É na página anterior, sob o nº 112, que poderíamos denominar triângulo histórico-documental, que fala por si mesmo, que o mestre Canabrava Barreiros, após exaustivo e demorado trabalho de pesquisa em documentos existentes e à disposição de quem quiser lê-los, decide “Ex-Cathedra”: O HERÓI TUTELAR DO BRASIL, O TIRADENTES, NASCEU NO TERMO DA VILLA DE SÃO JOÃO DEL-REI.


O primeiro parecer técnico leva a chancela de Herculano Gomes Matias, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, cujos excertos vão abaixo (pág. XIV):

“Voltando ao mérito da questão saber se o mártir da Inconfidência era ou não natural de São João Del-Rei cremos que, depois da leitura atenta de As Vilas del-Rei e a Cidadania de Tiradentes, constitui, agora, ponto pacífico, que no ano de 1746, quando se deu o batismo de Joaquim José da Silva Xavier, os terrenos onde se situava a Fazenda do Pombal, local de seu nascimento, estavam vinculados administrativamente à Vila de São João Del-Rei.” (grifo nosso)


A opinião abalizada do general Edmundo de Macedo Soares e Silva, que assina em nome do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil, é consagradora:

“Canabrava Barreiros era a pessoa exata com competência para enfrentar as dificuldades; ao lado de sua retidão e espírito de historiador é cartógrafo hábil, capaz de examinar e colocar os acidentes geográficos em seus lugares certos, após exame minucioso e dentro de técnica acurada. Eduardo Canabrava Barreiros nos brinda com mais um interessante estudo, esclarecedor de muitos fatos históricos mas, principalmente esclarecedor da verdade, para ele, incontestável, diante dos documentos autênticos reproduzidos dos originais, de que a Fazenda do Pombal fazia parte do território de São João del-Rei, à época do nascimento do glorioso alferes e durante a maior parte do período de disputa com São José Del-Rei. Destarte, o vulto admirado do protomártir da nossa independência, herói tutelar do Brasil, o Tiradentes, nasceu no termo da Vila de São João Del-Rei. É a conclusão. (grifo nosso)


A firmeza jurídica, com diâmetro legal e manifesta segurança, dá-nos o homem público de honra inatacável, diplomata e intelectual, o congressista Afonso Arinos de Melo Franco, em nome do Instituto dos Advogados Brasileiros, ipsis litteris (pág. XVIII):

“Designado como representante do Instituto dos Advogados para opinar sobre o estudo do prof. Canabrava Barreiros venho desincumbir-me do honroso cargo. Depois de atenta leitura do texto e de meditada consideração dos documentos, inclusive cartográficos, que o acompanham, fiquei convencido, sem qualquer dúvida, da procedência da tese defendida pelo eminente historiador e geógrafo, ou seja, que o Alferes Joaquim José da Silva Xavier nasceu, no ano de 1746, em território que então pertencia à Vila de São João del-Rei. A remoção do local onde se encontrava a Fazenda do Pombal, berço de Tiradentes, para o município de São José del-Rei verificou-se por ato judicial de 1755, quando o precursor da Independência Nacional já contava nove anos.” (grifo nosso)


As provas apresentadas são conclusivas, abundantes, têm coerência, encadeamento e limpidez. Constituem exaustiva demonstração histórico-jurídica, que satisfaz ao mais exigente investigador da história ou do direito.


O livro “O Tiradentes, Patrono Cívico do Brasil, onde nasceu, como viveu, qual foi seu aspecto físico” (em anexo), de autoria de Fábio Nelson Guimarães, conceituado historiador, apresenta o mesmo diapasão histórico de Canabrava Barreiros. É de sua lavra:

“O Ouvidor Geral da Comarca do Rio das Mortes, Francisco José Pinto de Mendonça, procedeu a uma nova delimitação entre as duas Vilas, a 17 de dezembro de 1755 – O Tiradentes estava com pouco mais de nove anos – determinando que a Fazenda do Pombal se incluísse no domínio de São José, em função da corrente líquida do funesto rio.”


O autor é acompanhado por Altivo de Lemos Sette Câmara e Waldemar de Almeida Barbosa, ambos de dimensão intelectual magnífica.


Imperdoável seria não constar nestes autos os ensinamentos de Monsenhor Flávio Carneiro Rodrigues, diretor do Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana, professor de grego na Universidade Federal de Ouro Preto e membro do Instituto Histórico de Minas Gerais. O prelado usa como fonte o De Genere et Moribus e do alto de sua autoridade escreve:

“...Reeditam, assim, aquela célebre contenda peregrina que, com tanta graça, rememorou o imortal vate lusitano que em seus geniais decassílabos heróicos cantou Homero cujo berço natalício fora também reclamado por sete cidades gregas (...). Um exame colateral dos documentos de dois irmãos sacerdotes de Tiradentes, os Padres Domingos e Antônio, pode contribuir para aclarar a controvérsia. Domingos foi ordenado padre em 1765. Pe. Antônio, capelão de Ressaca, filial de Prados, viveu os últimos anos em sua fazenda... Diz Domingos da Silva Xavier, ser natural e batizado nesta freguezia de N.S. do Pilar da freguezia de São João del-Rey, Comarca do Rio das Mortes.”


É válido rememorar que a certidão de batismo é um documento eclesiástico e pode ser usado como certidão de nascimento em casos excepcionais, pois mesmo com a laicização os laços entre Estado e Igreja não se romperam repentinamente nem o Estado republicano passou a tratar isonomicamente os grupos religiosos. Perduraram até pouco os compromissos e vínculos nas relações estatais e representantes de instituições católicas. O único documento, para muitos, continuou sendo a CERTIDÃO DE BATISMO.


Cita mais o Monsenhor a Sentença de Habilitação (processo do P. Domingos, pág. 150v e 151): “Vistos estes autos de habilitação de genere em meza dos habilitandos Domingos da Silva Xavier e seu irmão Antônio da Silva dos Santos... mostra-se que os habilitandos são naturais da V. a de S. João del-Rey, deste bispado, filhos legítimos de ... julgamos os habilitandos por legítimos e inteiros Christãos sem mácula alguma (de infecta nação) e os damos por habilitados..... a) Ignácio Correa de Sá.” Testemunho do Pe. Antônio (anexado ao seu processo de Genere. Na redação de seu testamento, o Pe. Antônio, num dos primeiros parágrafos, asseverou “expressis verbis”: “DECLARO QUE SOU NATURAL DA FREGUEZIA DE N.SRA. DO PILLAR DE S.JOAO D’ELREY, filho legítimo de (...).” Merece destaque: Se o nascimento neste mundo físico nos oferece o sopro da vida corpórea e nos insere numa família humana, o batismo nos dignifica com a vida espiritual, serve-nos a luz da fé e nos enobrece com a filiação divina... quem vacila ou erra ao indicar sua própria terra? Quem? Somente um néscio, mas não clérigos estudados que passaram pelo renomado seminário de Mariana, nunca um odonto bem competente, jamais um líder arguto e corajoso que empolgou intelectuais e ergueu Minas contra o jugo português.


BASÍLIO DE MAGALHÃES (nascido provavelmente em Barroso e falecido na cidade de Lambari, em 1957), escritor, poliglota, civilista e positivista lega induvidosa contribuição para identificação da origem do líder arguto e corajoso. Na Revista do Arquivo Público Mineiro, ano XXIV, 1933, 1º vol., emite consistentes lições de história, geografia e cartografia da época, mais precisamente, de meados do séc. XVIII. Seus memoráveis ensaios e crônicas referem-se principalmente à criação de comarcas nos tempos coloniais em Minas. O TIRADENTES É SANJOANENSE! Epíteto este encimando sempre seus artigos. (Cópia reprográfica da revista vai anexa).


Juntam-se com sua peça exordial publicações especialmente de Eduardo Canabrava Barreiros, Fábio Nélson Guimarães (e outros) e do senador Alfredo Campos Melo, os quais, para facilitação de manuseio dos autos e se V.Exa. julgar conveniente, poderão ficar depositados em secretaria, à disposição de interessados, sem perderem contudo sua integridade ao processo. Anexam-se ainda depoimentos escritos de autoria dos abalisados estudiosos Augusto das Chagas Viegas, Sebastião de Oliveira Cintra, Antônio Gaio Sobrinho, José Franklin Massena de Dantas Mota, Augusto de Lima, Luís de Melo Alvarenga, Tancredo de Almeida Neves, Francisco José dos Santos Braga, José Antônio de Ávila Sacramento, Basílio de Magalhães, Monsenhor Flávio Carneiro Rodrigues, Elizabeth de Melo Bomfim, Regina Faria Ávila, Geraldo Guimarães, Rosalvo Gonçalves Pinto e Gilberto de Alencar.


Pela heurística vi, com gáudio, que a Biblioteca Batista Caetano, fundada nesta cidade há 168 anos, preserva relíquias e preciosidades que, se necessário, fornecerão subsídios para o objetivo nobre que se pretende com este feito. Existem periódicos antigos que nos remetem a pesquisas capazes de identificar ascendentes maternos e paternos de Tiradentes, o que certamente ajudará em seu registro civil. Esta ascendência encontra-se bem estudada em livro “Um presente para o Futuro”, de Elizabeth de Melo Bomfim, a qual informa na página 23 que Domingos, pai de Tiradentes, no ano do nascimento do filho prodígio, ocupava o cargo de almotacé na Vila de São João del-Rei.


Esclarecidos os principais motivos do pretendido registro, socorre-nos e alumia-nos o veredito do Juiz da Comarca de Montes Altos, Estado do Maranhão, e professor da Universidade Federal do Maranhão, Cândido José Martins de Oliveira, in Janelas para a Cidadania:

“O registro civil tardio, com dificuldade de provas, com os pais do interessado já falecidos ou desconhecido o seu paradeiro, obtido mediante sofrida e dificultosa justificação, é muito mais do que uma facilidade ou um mero documento; significa um grau de libertação da exclusão pessoal em que se encontrava, resgatando a dignidade a que já tinha direito como ser, mas também mediante consagração constitucional, dado que a Carta de 1988 lança a dignidade da pessoa humana como princípio fundante do Estado democrático de direito, no artigo 1º, inciso III.”


Com o objetivo, não outro que o de ilustrar, chama aos autos o advogado signatário fato jurídico ocorrido em 1998 em Laguna, Santa Catarina. Não tendo sido localizado o registro de batizado de Ana Maria de Jesus Ribeiro, muitos pesquisadores brasileiros e estrangeiros divergiam sobre a data e local de nascimento da heroína ANITA GARIBALDI. Afirmava-se que ela teria vindo ao mundo em Lages, onde nasceram dois de seus nove irmãos. Ana viveu com Giuseppe Garibaldi nas cidades de Viamão, S.Gabriel, Mostardas e outras cidades do Rio Grande do Sul. Há publicações que dizem ter ela nascido no Uruguai, pois foi em Montevidéu que se casou com Garibaldi e teve filhos e ali viveu por seis anos. Também havia a versão de que era filha de um marinheiro italiano, nascida em um navio sob o comando do próprio Garibaldi, muito mais velho do que ela. Aninha, a jovem rebelde, não tinha nem o registro de batizado e, ainda assim, em processo de casamento em San Bernardino, Montevidéu, Giuseppe declarou estar casando-se com Ana,

“AQUELA INCOMPARÁVEL MULHER, FILHA DE HONESTA FAMÍLIA, NASCEU NA LOCALIDADE DE MORRINHOS, PERTENCENTE À CIDADE DE LAGUNA, NA PROVÍNCIA DE SANTA CATARINA, NO BRASIL...”


Assim, interposta a ação em juízo, após as formalidades de estilo, o processo teve o parecer do Ministério Público e prolatou o Juiz da 1ª Vara Civil da Comarca de Laguna, Santa Catarina, a R. sentença reconhecendo a nacionalidade brasileira, a naturalidade lagunense e autorizando o registro de nascimento tardio de Ana Maria de Jesus Ribeiro, a heroína de dois mundos Anita Garibaldi (documentos anexos).


O Tiradentes é Patrono Cívico da Nação Brasileira, pela Lei nº 4.897, de 9 de dezembro de 1965, que preceitua em seu art. 3º:

“Esta manifestação do povo e do governo da República em homenagem ao Patrono da Nação Brasileira visa evidenciar que a sentença condenatória de Joaquim José da Silva Xavier não é labéu que lhe infame a memória, pois é reconhecida e proclamada oficialmente pelos seus concidadãos, como o mais alto título de glorificação do nosso maior compatriota de todos os tempos.”


Se, para ter a cidadania merecida, Ana Maria de Jesus Ribeiro a conseguiu sem sequer o batistério, mais favorecido encontra-se o são-joanense do Pombal, com tal requisito cumprido formalmente e aqui anexado, podendo as provas serem vistas na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, e Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar, nesta urbe.


Se é verdadeiro que os mais experimentados homens de Estado têm sucumbido ao enfrentar os complicados problemas que envolvem os povos nas épocas anormais da sua existência, em Tiradentes esses sentimentos ultrapassaram os limites da sinceridade do homem comum, do homo medius descrito por Quetelet, elevando-o à categoria do Tenax Propositi Vir, de Horácio. Se pairaram nuvens no horizonte de sua vida elas foram acumuladas por seus contemporâneos e por alguns pósteros que se emboscaram atrás da grandeza de seu nobre coração. Ele criou a Pátria Brasileira, ele fundou a nacionalidade e só seremos puros se o imitarmos, “quales príncipes, tales populi”. E não estamos a fazer-lhe um favor ao reparar um erro histórico ou resgatar sua cidadania. Mas é a História que o exige, quer dar luz a esse elo perdido, esse vácuo genético, essa lacuna de impostura e bradar ex cathedra e ex abundantia cordis que sua vida jurídica está de acordo com as leis brasileiras e sua genealogia restabelecida, que entre seus ascendentes e descendentes o liame está posto, legitimado e com força de lei.


Ex positis, devidamente comprovado o pedido e cumpridas as formalidades de estilo, dando-se vista ao ínclito órgão do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, é o presente para que se proceda a averbação, por Mandado a ser expedido ao Cartório do Registro Civil da Comarca, do assentamento do “Tira-Dentes”, constando ali seu nome próprio, Joaquim José da Silva Xavier, requerendo, mais, que fique constando conforme se encontra no livro de batizados, ou seja:


“Joaquim José da Silva Xavier, nascido em 12 de novembro de 1746, no município de São João del-Rei, Estado de Minas Gerais, filho de Domingos da Silva dos Santos e de Antônia da Encarnação Xavier”


Somente com o escopo de ilustrar, recorrem os proponentes ao Arquivo Eclesiástico de Mariana, ao Arquivo Público Mineiro e Efemérides Mineiras (p.103, vol. II), ainda ao jornal “O Correio”, de 23-04-1944, pág. 04 (documento anexo), podendo este ser consultado na Biblioteca Municipal Batista Caetano de Almeida (desta cidade), que os avós paternos de Joaquim José da Silva Xavier são André da Silva e Mariana da Matta, naturais de Frecheiro de Basto, Braga, Portugal. Que são seus avós pela linhagem materna Domingos Xavier Fernandes e Maria de Oliveira Colassa, naturais de São Paulo, Brasil. Estes dados históricos são maravilhosamente corroborados pela estudiosa Elizabeth de Melo Bomfim, págs. 153 usque 153 de “Um Presente do Passado para o Futuro”, capítulo da Genealogia de Tiradentes (doc. Junto).


Ex rigore juris, e se julgar o eminente magistrado conveniente, poderá constar no registro a ascendência documentalmente comprovada. Apenas a título de esclarecimento recorre o signatário à fonte jurisprudencial na Apelação Cível nº 1.0000.00.279620.-9/000(1)-Comarca de Carangola-Apelante: Ministério público do estado de Minas Gerais, Apelado Geovani Ramos da Silva, relator do Acórdão o Exmo. Sr. Desembargador Brandão Teixeira, publicado no E. M. de 26/03/2003, 2ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Minas Gerais - Possibilidade de registro de nome indicado, sem a inclusão dos nomes dos pais, para fins de Registro Tardio. Deram provimento.


Registre-se que por séculos a vida começou com o batismo pelos registros feitos por padres em livros da Igreja como prova do nascimento legal e de personalidade. Muitos poderiam nascer e não existir para o Direito, dada a imensa influência da hierarquia católica, à qual nenhum Estado Ocidental passou incólume. A isso estavam submetidos os recém-nascidos e os adultos, se quisessem existir, assim como também os índios, negros e os pobres cristãos-novos. O RG, como o conhecemos, só passou a existir em 1906, ou seja, há bem pouco tempo.


O que foi alegado e exposto tem suporte e guarida em arestos memoráveis de nossos tribunais e pode ser provado por todos os meios admissíveis em direito, notadamente por requisição de informes históricos ou cartográficos, no Brasil e no exterior, especialmente por depoimentos a serem colhidos de testemunhas qualificadas para tal mister.


Anexando os documentos comprobatórios do exposto acima, dá-se à causa, para efeitos puramente fiscais, o valor de R$ 1.000,00.

P. e E. deferimento.


São João del-Rei, MG, 10 de novembro de 2005.

Pp – Wainer Carvalho Ávila

OAB MG-11.544”



* Wainer Ávila, graduado em direito pela Universidade Católica de Minas Gerais, é o atual Presidente da Academia de Letras de São João del-Rei, ocupante da cadeira Embaixador Gastão da Cunha. É Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, ocupante da cadeira Alferes Tiradentes. Membro Definidor da Venerável Ordem Terceira de São Francisco de Assis da Diocese de São João del-Rei. Sócio Benemérito e Conselheiro do Athetic Clube de São João del-Rei. Sócio Honorário do Rotary Club. Sócio Correspondente do Instituto Cultural Visconde do Rio Preto. Sócio Correspondente da Academia Valenciana de Letras. Conselheiro do Centro Cultural Feminino de São João del-Rei. Membro do Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico de São João del-Rei. Mais...

terça-feira, 15 de junho de 2010

Memória resgatada

Por Wainer de Carvalho Ávila *

Em 7 de outubro de 2003, através do Ofício nº 026-IHG/2003, o Presidente do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, Sr. José Antônio de Ávila Sacramento, oficiou ao Ministério Público, na pessoa da Promotora Dra. Eliane do Lago Correa, solicitando fossem envidados esforços para recuperar para a comunidade são-joanense a portada original da Igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos. Informava ainda que a referida obra de arte que fora vendida em 1970, quando da demolição do templo edificado no século XVIII, se encontrava na Fazenda São Martinho da Esperança, no município de Campinas, Estado de São Paulo, conforme noticiara a Revista Casa de Fazenda (Ano 1, nº 2, 1990 – editada pelo Grupo de Revistas Casa Cláudia) na página 84, com os seguintes dizeres: “ (...) Ah! A face silenciosamente bela e mística das Minas Gerais! Sobretudo, a fé removida das igrejas ornadas por Aleijadinho para os redutos de São Martinho da Esperança. Eis um verdadeiro espetáculo de bom gosto e história: um pórtico em pedra-sabão trazido de São João del-Rei para enriquecer uma capelinha dos anos 50, perdida em meio à vegetação. Deslumbrante cenário.(...)”

No mesmo ofício, o Presidente credenciava o confrade e bacharel em Direito, Dr. Wainer de Carvalho Ávila, autor da presente matéria, para representar o IHG no assunto em questão, ficando a cargo da Curadoria da Defesa do Patrimônio Público e Patrimônio Histórico e Cultural de São João del-Rei a iniciativa das providências legais.

Inicialmente, o processo foi distribuído à 2ª Vara Cível da Comarca de São João del-Rei, tendo o Juiz Titular Dr. Auro Aparecido Maia Andrade determinado as medidas cabíveis para a recuperação da referida obra de arte, com envio de carta precatória para o Estado de São Paulo. A citação não se efetivou em vista da morte do adquirente, Sr. Mário Pimenta Camargo.

O Ministério Público Federal entendeu ser de sua competência a condução do feito, de acordo com a legislação que regula tal matéria, passando o processo a tramitar na Justiça Federal sediada nesta cidade de São João del-Rei.

Houve a citação do espólio do Sr. Mário Pimenta Camargo na pessoa da inventariante do espólio, Sra. Beatriz Mendes Gonçalves Pimenta Camargo, para as providências que o espólio julgasse convenientes.

Ocorre que a referida senhora decidiu, mediante petição nos autos (Processo nº 2009.38.15.000812-0) e dirigida à Vara Única da Justiça Federal em Minas Gerais – Subseção Judiciária de São João del-Rei e datada de 8 de junho do corrente ano, em gesto de grandeza e profundo altruísmo, concordar com a postulação de nossa cidade, prontificando-se a entrar em acordo, mediante termo de transação nos autos, restituindo a peça objeto da demanda a seu proprietário originário.

Acompanhado do são-joanense Francisco José dos Santos Braga, também Membro da Academia de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, tomei conhecimento hoje da tramitação do processo civil supracitado. Constatei, após leitura dos autos, que a decisão nos é favorável.

Os são-joanenses temos a sorte de contar com a visão esclarecida da Sra. Beatriz Mendes Gonçalves Pimenta Camargo, a qual possui um currículo excelente. A título de esclarecimento, informo que a referida senhora é Vice Presidente do MASP-Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, Membro do Conselho do Museu do Oratório de Ouro Preto, Membro do Conselho Internacional do Museu de Arte Moderna de New York, entre muitos outros títulos que possui.

São João del-Rei está hoje muito mais enriquecida no seu acervo cultural e histórico devido à iniciativa de nossas Instituições e à elevada compreensão da referida expertise em arte. Resta agora à comunidade local decidir a melhor destinação a ser dada ao importante pórtico original que ornamentava a tradicional Igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, que vem repor a justa altivez de nossa gente que se achava profundamente ferida desde 1970.

* Wainer Ávila, graduado em direito pela Universidade Católica de Minas Gerais, é o atual Presidente da Academia de Letras de São João del-Rei, ocupante da cadeira Embaixador Gastão da Cunha. É Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, ocupante da cadeira Alferes Tiradentes. Membro Definidor da Venerável Ordem Terceira de São Francisco de Assis da Diocese de São João del-Rei. Sócio Benemérito e Conselheiro do Athetic Clube de São João del-Rei. Sócio Honorário do Rotary Club. Sócio Correspondente do Instituto Cultural Visconde do Rio Preto. Sócio Correspondente da Academia Valenciana de Letras. Conselheiro do Centro Cultural Feminino de São João del-Rei. Membro do Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico de São João del-Rei. Mais...

quinta-feira, 3 de junho de 2010

O esquecimento de BASÍLIO DE MAGALHÃES e as tentativas de rememorá-lo

Por Oyama de Alencar Ramalho *

Palestra proferida no Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei - 04 de setembro de 2005

Convidado para fazer esta palestra pelo Presidente desta casa, escolhi o tema: o esquecimento de Basílio de Magalhães e algumas tentativas de rememorá-lo.

Em 1930, Basílio de Magalhães exilou-se para o Rio de Janeiro e aqui nunca mais voltou. Temos notícia de que, em 1952, o Governador Juscelino Kubitschek, sabedor do estado de penúria em que vivia o historiador, encaminhou uma mensagem à Assembléia Legislativa, propondo uma pensão mensal de cinco mil cruzeiros ao escritor (o que equivale, hoje, a mais ou menos 400 reais), a troco de anotar e comentar as Efemérides Mineiras, de Pedro Xavier da Veiga. Como Basílio não mais tinha força física para tal tarefa, não aceitou. Faleceu em 14 de dezembro de 1957, em Lambari, esquecido e pobre, a ponto de ter que vender sua biblioteca para sobreviver.

O saudoso pesquisador são-joanense Sebastião de Oliveira Cintra (1918-2003), na sua Galeria das Personalidades Notáveis de São João del-Rei (1994, p.61), ao biografar Batista Caetano de Almeida, fundador da Biblioteca Municipal, assim redigiu um dos parágrafos:
Seu nome (o de Batista Caetano de Almeida) foi dado a uma das ruas do Bairro do Segredo, conforme Lei Municipal nº 190, de 08/08/1951, registrada no Livro 15. Por total desconhecimento dos méritos do homenageado, um gaiato mudou o nome da referida rua para Basílio de Magalhães, sem que a administração Municipal e a Câmara Municipal, usurpadas nas suas atribuições, tomassem qualquer medida para sanar a inconcebível injustiça.
O autor da mencionada façanha foi o jornalista Adenor Simões Coelho Filho, que certamente não ignorava nem desprezava os méritos do grande benfeitor e mecenas Batista Caetano de Almeida, e trocou as placas existentes na rua. Não por gaiatice inconseqüente, mas por indignação, quis o jornalista, com aquele ato, trazer à baila o esquecido e também injustiçado nome de Basílio de Magalhães, não logrando, porém, o objetivo esperado, pois que os poderes municipais preferiram fazer vista grossa a contestar o ato ou aceitar e discutir a provocação. Optaram pela manutenção do silêncio em torno do nome de Basílio de Magalhães, imposto pelo sistema, a partir de 1930. Trocada a placa da rua, o novo nome foi incorporado aos catálogos telefônicos, aos cadastros da companhia de força e luz, do correio e aos costumes dos moradores, mas não houve discussão alguma sobre o assunto. Se Basílio de Magalhães estava esquecido, esquecido deveria permanecer, é a regra do establishment.

Outra tentativa de rememorar o olvidado Basílio foi a de denominar com o seu nome o salão de solenidades da Prefeitura Municipal de São João del-Rei, no governo de Lourival Gonçalves de Andrade; entretanto, ninguém se refere àquele nobre espaço com a devida denominação.

Em 1974, Fábio Nelson Guimarães, fundador e ex-presidente deste IHG, publicou no jornal Ponte da Cadeia, do número 326 ao 332, (cujo proprietário era o mesmo jornalista Adenor Simões Coelho Filho), A Vida de Basílio de Magalhães, enaltecendo os feitos intelectuais e administrativos do polígrafo. Essa iniciativa ocorreu em função de obrigações estatutárias da Academia de Letras de São João del-Rei, da qual o autor da extensa matéria era também sócio fundador e tinha que dissertar sobre o patrono de sua cadeira. Apesar de o autor ter tocado em alguns pontos polêmicos da época em que Basílio militara na política partidária, a questão do esquecimento permaneceu envolta nos seus mistérios. O fecho do trabalho, em vez de coincidir com a cronologia da vida do biografado, retornou ao longínquo 1916 quando Sebastião Sette, outro ilustre esquecido¹, teceu caloroso elogio a Basílio, ao editar a tradução do Cerco de Corinto.

Em 1974, o Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei comemorou o centenário do nascimento de Basílio de Magalhães.(o Basílio de Cangalheiro). O historiador mineiro Waldemar de Almeida Barbosa escreveu brevíssima matéria para o Ponte da Cadeia sobre o homenageado, mas o início do texto passa ao leitor uma idéia que não corresponde à realidade:
Por iniciativa do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, está sendo comemorado ali o centenário do nascimento de Basílio de Magalhães (...)²
Na verdade, não houve uma comemoração que se tenha prolongado ao longo do ano; o único e singelo evento ocorrido no âmbito do Instituto Histórico e Geográfico foi uma reunião ordinária, ocorrida em 2 de junho de 1974³, na qual discursou o dr. Altivo Lemos de Sette Câmara; além de se ter editado a resolução nº 9, que guindava Basílio de Magalhães a patrono deste IHG, honraria que também entrou em regime de esquecimento. 4

A nota da redação do Ponte da Cadeia é constituída de sutis insinuações, que passam por filigranas nos contextos atuais, mas que têm que ver com o esquecimento de Basílio de Magalhães, se o leitor estiver atento aos detalhes e se estiver informado do contexto dos anos 1920:
Este artigo foi enviado de B.H. ao PONTE DA CADEIA pelo eminente professor Antônio de Lara Resende, o qual nos prometera também uma crônica de sua autoria a respeito de Basílio de Magalhães. Comentando o artigo, pergunta o professor: “Para que escrever ainda sobre o ilustre sanjoanense, depois de se ter visto o artigo de Waldemar Barbosa?5
Desfazendo as sutilezas, é pouco provável que o professor Antônio de Lara Resende 6, prometera uma crônica sobre Basílio de Magalhães, tanto que ironizou no comentário. O artigo de Waldemar Barbosa contém cinco parágrafos sobre fatos conhecidíssimos e que estão longe de caracterizar a importância de Basílio de Magalhães. Dizer que não haveria mais nada a ser escrito depois de Waldemar Barbosa não foi um elogio ao autor do artigo nem uma posição de virtuosa modéstia. Foi ainda uma oportunidade para reforçar o esquecimento e diminuir o homenageado, como quem diz, sua vida cabe em apenas cinco acanhados parágrafos.

Em 1983, Jehovah Motta proferiu uma palestra no Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, publicada na revista nº III da mesma entidade, em 1985, com a omissão do primeiro parágrafo, que em seguida o transcrevemos porque temos a cópia do original datilografado:
1 – Duas ordens de idéias inspiraram-me na decisão de proferir esta palestra sobre Basílio de Magalhães. A primeira delas me conduziu á convicção de que já é tempo do nosso Instituto proclamar e exaltar a grandeza desse insigne historiador, e a segunda levou-me a indagar se as novas gerações sanjoanenses já se deram conta dos méritos do homem público que governou S. João d’El Rei de 1923 a 1927, e que foi representante do povo mineiro na Câmara Federal nas legislaturas de 1924 a 1926 e de 1927 a 1928.
O que se seguiu, como conseqüência, demonstrou que, em 1985, ainda não era tempo de o IHG proclamar e exaltar a grandeza desse insigne historiador, nem as novas gerações são-joanenses se deram conta dos méritos daquele ilustre homem público. Aliás, é sintoma de algum patrulhamento que a conferência tenha sido publicada com a exclusão desse transcrito parágrafo.

Publicada em 18 de fevereiro de 1923, a Resolução nº 462 autorizava o agente executivo a modificar o atual contrato do Teatro Municipal, afim de que o prédio fosse reformado mediante nova planta. Em 12 de maio de 1923, publicou-se o edital para a reforma do Teatro Municipal, orçada em 79:460$900. Em 1925, quando se inauguraria a obra, foi editada a Lei Nº 434:
O povo do municipio de S. João del-Rey, por seus representantes, decretou, e eu, em seu nome, sanciono a seguinte lei: Art. 1º — Fica o agente executivo autorizado a mandar fundir uma placa de bronze, afim de ser a mesma collocada no Theatro Municipal, para inauguração desse proprio edilicio.
Assinava a lei Custodio Batista de Castro, agente municipal, em exercício; e, provavelmente na placa, deveria estar o nome de Basílio de Magalhães como responsável pela iniciativa da obra. A referida peça ou não foi feita ou sumiu. 7

O professor Sebastião Cintra, em 1967, publicou as Efemérides de São João del-Rei, onde Basílio de Magalhães apareceu em doze oportunidades, com a neutralidade de forma (não de escolha) própria dos eventos que compõem aquele tipo de obra. Na edição de 1982, o número de eventos caiu para sete com algumas modificações. Em 1994, o historiador editou a já mencionada Galeria das Personalidades Notáveis de São João del-Rei, onde contempla a pessoa de Basílio de Magalhães. Foi uma importante manifestação positiva que trouxe de volta para nossos contextos contemporâneos o nome do grande polígrafo; porém, dada a característica emersoniana (referimo-nos a Ralph Waldo Emerson, filósofo norte-americano, 1803-1892) da Galeria, parece-nos que todas as personalidades, sumariamente biografadas, fazem parte de uma mesma angelical confraria. As razões que levaram o autor a organizar a sua Galeria com essa característica devem ser respeitadas, mas as informações ali contidas mais aguçam o contraditório fato existente entre as boas razões para se lembrar de Basílio de Magalhães e as boas razões para mantê-lo no esquecimento, sem que essas últimas sejam abordadas.

Em 1999, a Fundação Octávio Neves desenvolvia o projeto de Sinalização Interpretativa do Centro Histórico de São João del-Rei, financiado pela Embratur. Um dos itens do projeto consistia na elaboração de selos, pequenas placas que seriam afixadas em alguns imóveis, que foram residências de pessoas dignas de ser lembradas. Primeiro, a lista de nomes foi organizada, e nela não estava Basílio de Magalhães. Segundo, após a sugestão de que se incluíssem o nome do polígrafo e o do Marechal Cyro do Espírito-Santo Cardoso, por incrível que pareça, não se tinha notícia de alguma rua onde teria morado Basílio de Magalhães. É interessante assinalar que os membros da equipe técnica, encarregados de fazer os levantamentos históricos, eram jovens, portanto, não coevos de Basílio, mas não se empenharam em descobrir com a mesma tenacidade que devotaram a descobrir outros nomes, tanto que não descobriram. Talvez agissem como efeito, produzido pelo esquecimento imposto pelo sistema.

Considerando algumas manifestações sumárias sobre o esquecido polígrafo 8, o atento observador contemporâneo não poderia negligenciar o curioso e paradoxal fato: se Basílio de Magalhães foi tão proeminente figura, como dizem alguns, antes mesmo de exercitar-se na política partidária, por que é um nome esquecido pelos são-joanenses, a ponto de um admirador ter de usar expedientes provocativos, como o da mudança desautorizada de um nome de rua, para chamar a atenção da existência de um ilustre esquecido?

É um fato social reconhecido a transferência de prestígio de uma pessoa para o lugar de seu nascimento (ou até mesmo a simples estada temporária), repassando, como conseqüência, nuanças desse mesmo prestígio aos demais habitantes da comunidade. Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, depois de famoso, foi reverenciado pela sociedade de Três Corações a qual passou também a gozar do prestígio do maior futebolista de todos os tempos. Depois que Santiago Sabino de Carvalho integrou-se à Orquestra Filarmônica de Londres, (entrou até para a Galeria do Professor Cintra) a sociedade são-joanense orgulha-se do fato; a mesma sociedade que lhe negou ajuda, no início de sua difícil e bem sucedida carreira. Esse tipo de fenômeno justifica o esforço intelectual que se fez e que se faz para demonstrar que Joaquim José da Silva Xavier nasceu em São João del-Rei e não em São José del-Rei, como pretendeu Herculano Veloso (1955) 9. Não fosse a importância histórica que o Alferes veio a ter, na República, passível de ser transferida à terra onde nasceu, e ninguém se importaria com a origem do Tiradentes. Feitos os devidos ajustes, o cidadão comum também passou a gozar do espírito de liberdade, menos “idealizado” pelos inconfidentes e mais “arquitetado” pelos republicanos 10, generalizando-se para todo o Estado e incorporando esse sentimento na retórica das frases de efeito. O primeiro compromisso de Minas é com a liberdade, (...) O outro nome de Minas é Liberdade, afirmou Tancredo Neves num de seus memoráveis discursos (1983)¹¹.

Tivemos a oportunidade de ouvir o relato, cheio de orgulho, de um habitante de Barbacena¹², que foi contemporâneo da estada de Guimarães Rosa naquela cidade, quando o escritor era médico da polícia mineira. Ao dizer que sabia onde o escritor morava e que o observava estudando até alta madrugada, pareceu-nos que o depoente quase queria dizer que ele também era um participante da produção literária do autor, que, mais tarde, ganhou fama nacional e internacional¹³.

Portanto, o que estamos enfatizando e exemplificando não é novidade. Novidade talvez seja o desvelar do esquecimento proposital de quem já era famoso ou a renúncia do prestígio transferível, os quais, no nosso entender, aconteceram em relação a Basílio de Magalhães. Entendemos também que não se esquece por esquecer nem se recusa um prestígio gratuitamente. Existem causas determinantes que nunca foram abordadas por aqueles que apenas enalteceram os feitos de Basílio de Magalhães e se limitaram a reclamar das gerações mais novas uma espécie de descuido ou desleixo para com uma figura tão importante da nossa história.

Nesta modesta fala pretendemos lembrar de Basílio de Magalhães, pois talvez aflorem algumas razões do esquecimento imposto pelo sistema, e então, estaremos compreendendo melhor os mecanismos da sociedade em que vivemos.

O procedimento do atual presidente do IHG de São João del-Rei, inaugurando um retrato de Basílio de Magalhães e re-colocando o seu nome como patrono desta associação cultural, ainda que com singela pompa, é um ato louvável de quem prefere lembrar a esquecer.

Parabéns ao Presidente e à Mesa Administrativa do IHG.

Os efeitos da iniciativa, o tempo dirá. Nós, pela experiência que acumulamos, achamos que as forças do sistema prevalecerão por muito mais tempo, apesar de sempre aparecer alguém que as incomode. Lembrar dos condenados ao esquecimento é uma opção, que, talvez não seja a alternativa mais reconhecida, rendosa ou gratificante, mas é a nossa opção. E fazemos isso porque entendemos que muito mais importante do que lembrar das pessoas olvidadas é desvendar os processos culturais que governaram e governam nossas ações, pois se limitássemos a lembrar das pessoas apenas na perspectiva do culto às personalidades não conseguiremos compreender com profundidade a História da sociedade em que vivemos.

Era o que eu tinha a dizer e pela paciência de me ouvir, muito obrigado.


NOTAS
¹ Sebastião Sette ganhou nome de rua no centro de cidade, mais conhecida hoje pelo apelido de Calçadão, o que também não deixa de ser um modo de esquecer o nome do titular.

² Ponte da Cadeia nº 402, de 23/04/1977.

³ Estiveram presentes na reunião do IHG, de 2 de junho de 1974, 33 pessoas, entre sócios e convidados. A reunião extraordinária, de 17 de abril de 1976, destinada a comemorar o nascimento do Dr. Odilon Barrot Martins de Andrade, na qual discursou o Dr. Tancredo de Almeida Neves, contou com a presença de 81 pessoas. O placar das presenças é sintomático.

4 Alguns membros atuais do Instituto Histórico e Geográfico que conseguiram a sede própria para a instituição, na inauguração (1999), colocaram várias placas comemorativas e não sabiam que Basílio de Magalhães era o patrono do IHG, de acordo com a Resolução 9, de 1977. Por algum tempo, um retrato de Basílio, feito a lápis e dependurado numa das salas do IHG, tinha uma legenda, indicando (equivocadamente?) que se tratava de Lincoln Teixeira de Souza.

5 Na mais recente reforma do Teatro Municipal, concluída em 2003, empreendimento encabeçado pelo vereador Adenor Luís Simões Coelho, todas as placas comemorativas existentes no teatro foram concentradas num memorial, onde não consta a placa da inauguração, autorizada pela Lei nº 434, de 22/jan/1925.

6 São do nosso conhecimento alguns pequenos trabalhos biográficos sobre Basílio de Magalhães, como os publicados in: • SILVEIRA, Victor. Minas Geraes em 1925. Belo Horizonte: 1926, p.408; • AVELAR, Antonio Ribeiro de. Figuras da Casa de Minas. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1 vol., 1960; • VIEGAS, Augusto. Notícia de São João del-Rei. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1969. p.216-217. (Somente na 3ª edição, a de 1969, saíram algumas linhas sobre Basílio de Magalhães, mesmo assim, com o nome de Basílico de Magalhães. Eufemisticamente, um genuíno lapso freudiano). • A palestra de PIRES, Mário, intitulada Centenário de Basílio de Magalhães, proferida na sessão de 2 de setembro de 1974, na Academia Campinense de Letras, contém informações novas que nos parecem equivocadas, como por exemplo a de que Basílio de Magalhães graduou-se na Escola de Minas de Ouro Preto e em Ciências Jurídicas, na Faculdade de Direito de São Paulo. Pelas fontes de que dispomos, nem um nem outro fato aconteceram.

7 Em 1919, Herculano Veloso, cidadão tiradentino, publicou o opúsculo Ligeiras memórias da Vila de São José nos tempos coloniais (reeditado em 1955 pela Imprensa Oficial) e, nos anos 1930, escrevera vários artigos em O Correio, defendendo a tese de que Tiradentes nascera no termo da vila de São José e não no de São João del-Rei. Essa pretensão foi rebatida por Basílio de Magalhães em elucidativo ensaio que se encontra publicado na revista do Arquivo Público Mineiro (1920) e que nunca foi reeditado. Acreditávamos que o assunto estivesse resolvido, sobretudo depois que se descobriu o assentamento de batismo de Joaquim José, entre os curiosos documentos da Biblioteca Nacional. Mesmo assim, ainda hoje, pelo interesse do prestígio, ao qual aludimos no nosso texto, há pessoas que querem manter viva a tese de Herculano Veloso. Esse fenômeno de que tratamos no texto enseja que se contemple outro, relacionado à figura de quem faz afirmações. No caso, é a transferência da autoridade exercida (autoridade não acadêmica), para o conteúdo da afirmação. Foi o que aconteceu com o deputado Aécio Neves da Cunha, na época em que presidia a Câmara dos Deputados, ao escrever a apresentação do Perfil Parlamentar de Tancredo Neves, (2001). Talvez por um deslize, já que a natureza do seu escrito não comportava comprovações, reforçou a tese de Herculano Veloso: A inconfidência encontrou na cidade aurífera (São João del-Rei) um dos centros de conspiração, e, bem ao lado, em São José, nasceu Tiradentes. Seu avô Tancredo Neves sempre disse o contrário nos seus discursos, embora também nunca tenha se detido nas comprovações, porque não era oportuno estar dissertando academicamente em praça pública. Mas é inegável que qualquer afirmação ganhe relevância quando pronunciada por alguém que já tem prestígio por outros motivos. É claro também que o efeito da afirmação depende do nível do ouvinte ou do leitor.

8 Vide CARVALHO, José Murilo de. A construção das almas.

9 NEVES, Tancredo de Almeida. Sua Palavra na História. Rio de Janeiro: Livraria Atheneu, 1988. p. 239. Temos notícia de que essas frases são da lavra de Mauro Santayana, que, em entrevista televisiva na TV Assembléia, assim revelou o fato.

10 Referimo-nos ao tenente Nelson Guilherme Campos.

¹¹ NEVES, Tancredo de Almeida. Sua Palavra na História. Rio de Janeiro: Livraria Atheneu, 1988. p. 239. Temos notícia de que essas frases são da lavra de Mauro Santayana, que, em entrevista televisiva na TV Assembléia, assim revelou o fato.

¹² Referimo-nos ao tenente Nelson Guilherme Campos.

¹³ A Academia Barbacenense de Letras publicou, em 2000, o Anuário 98-99, dedicado a Guimarães Rosa.


* Oyama de Alencar Ramalho é brasileiro de São João del-Rei, Minas Gerais. Nasceu aos 28 de setembro de 1939, filho de Alencar José Ramalho e Coryna de Alencar Ramalho. É casado com Cely Marina Moebus de Alencar Ramalho. Tem 3 filhos (Isabela, Leonardo e Clarissa) e 2 netos (Luca e Hugo). Fez o curso de Náutica na Escola de Marinha Mercante do Rio de Janeiro (1960-1962), tendo trabalhado como 2º piloto na Frota Nacional de Petroleiros - PETROBRÁS, até 1967. Graduou-se em Pedagogia (1967-1970) e em Psicologia (1976) na Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, onde exerceu o magistério, chefiou departamento e coordenou curso. Lecionou também nos cursos de Administração, Economia e Engenharia Industrial da Fundação Municipal São João del-Rei. Participou ativamente da federalização do ensino superior de São João del-Rei, tendo sido o primeiro vice-diretor (pró-reitor) de planejamento da FUNREI, atual UFSJ. Mais...

Colaborador: Oyama de Alencar Ramalho

Oyama de Alencar Ramalho é brasileiro de São João del-Rei, Minas Gerais. Nasceu aos 28 de setembro de 1939, filho de Alencar José Ramalho e Coryna de Alencar Ramalho.

• É casado com Cely Marina Moebus de Alencar Ramalho. Tem 3 filhos (Isabela, Leonardo e Clarissa) e 2 netos (Luca e Hugo).
• Fez o curso de Náutica na Escola de Marinha Mercante do Rio de Janeiro (1960-1962), tendo trabalhado como 2º piloto na Frota Nacional de Petroleiros - PETROBRÁS, até 1967.
• Graduou-se em Pedagogia (1967-1970) e em Psicologia (1976) na Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, onde exerceu o magistério, chefiou departamento e coordenou curso. Lecionou também nos cursos de Administração, Economia e Engenharia Industrial da Fundação Municipal São João del-Rei .
• Participou ativamente da federalização do ensino superior de São João del-Rei, tendo sido o primeiro vice-diretor (pró-reitor) de planejamento da FUNREI, atual UFSJ.
• Fez curso de especialização em Estudos Literários - Literatura Brasileira (2000/2001) na FUNREI.
• É sócio honorário do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, membro do Instituto Cultural Visconde do Rio Preto e da Academia Valenciana de Letras, de Valença – RJ.
• Recebeu menção honrosa no Concurso de Contos Guimarães Rosa da Radio France Internationale, com a obra A Mina (1995).
• Foi agraciado com o 1º lugar no Concurso de Contos Maria Lacerda Moura – Barbacena – Fundação de Cultura de Barbacena, Academia Barbacenense de Letras e Jornal de Sábado – 2002. (Obra: Surto de Modernidade).
• Escreveu Fritz & Rosalinda, conto selecionado para compor o livro Baleia Come Flores do segundo Concurso de Contos da UFSJ.
• Recebeu a Medalha Santos Dumont – Governo do Estado de Minas Gerais – Grau Bronze – 2004.
• Juntamente com Átila Carvalho de Godoy idealizou a Estrada Real como produto turístico, resultando a criação do Instituto Estrada Real (FIEMG) na gestão administrativa de Stefan Salej.

Escreveu:

Avaliação e Supervisão, coautoria com Maria Lúcia Hannas, 1979.
Como Analisar Objetivos de Ensino. Belo Horizonte: Organizações Nagli, 1982
Um dia, com calma, eu te conto. Histórias e Memórias do João do Açúcar. São João del-Rei: Edições Zona Chic, 1996.
O Fumo! Outras Histórias do João do Açúcar. São João del-Rei: Edições Zona Chic, 1999.
A Rasura, Francisco de Lima Cerqueira e Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, ainda... Lisboa: Fundação Lusíada / São Paulo: RCS Arte Digital, 2002.
Francisco de Lima Cerqueira, na Vila de São João del-Rei, Minas, Comarca do Rio das Mortes – 1774 – 1808. Edição limitada, 2003, coautoria com Miguel Pacheco e Chaves.
Cassiterita. Edição limitada, 1996.
Persona ou o corretor de imóveis. Edição limitada, 1997.
Sobre os Traços biográficos do finado Antônio Francisco Lisboa, mais conhecido pelo apelido de Aleijadinho, de Rodrigo José Ferreira Bretas. Edição limitada, 2009.
Os Monsenhores. Edição limitada, 2009.
Visagem. Edição limitada, 2009.

sábado, 13 de março de 2010

Carta-Manifesto por "Liberdade é Participação"

Por Francisco José dos Santos Braga *

Neste ano de 2010, São João del-Rei comemora o centenário de nascimento do seu filho ilustre Tancredo de Almeida Neves, 172 anos da elevação de Vila a Cidade e 40 anos do seu Instituto Histórico e Geográfico. Do dia 4 a 7 de março, essa cidade viveu um intenso movimento com a presença ilustre do Governador de Minas Gerais, Aécio Neves, neto e assessor particular de Tancredo Neves.

No momento da solene comemoração defronte ao túmulo de Tancredo, com a presença de inúmeras autoridades que constituíam a comitiva do Governador, senti-me movido pelos discursos inflamados do Presidente Sarney e de Aécio a redigir um texto convocando este último a erguer a voz de Minas, a exemplo de seu avô, para recolocar esse Estado no centro das decisões nacionais, especialmente neste ano eleitoral. Abaixo transcrevo o texto que então redigi e que está sendo levado pelos caminheiros são-joanenses Murilo de Souza Cabral e Ana Maria de Oliveira Cintra a ser entregue à Academia de Letras de Minas Gerais e quiçá ao Governador Aécio Neves, juntamente com outras manifestações de outros cidadãos são-joanenses preocupados com os rumos da Nação.


CARTA-MANIFESTO POR "LIBERDADE É PARTICIPAÇÃO"

Eu, signatário desta, cidadão são-joanense, quero, neste 6 de março de 2010, em que se comemora o 172º aniversário da elevação de Vila a Cidade, e aproveitando a oportunidade em que São João del-Rei festivamente comemora o centenário do nascimento de seu filho Tancredo de Almeida Neves, relembrar que a discussão e o encaminhamento desse lema "Liberdade é Participação" são de interesse de todo o povo brasileiro e, como tal, não podem ficar confinados aos Poderes constituídos, uma vez que se encontram corrompidos, conforme estampado diariamente em toda a mídia escrita e televisiva.

Não podemos relegar ao esquecimento os feitos de nossos antepassados e de todo o nosso povo, sob pena de perdermos a consciência de nossa identidade e comprometermos nossa soberania. A voz de Minas, que em épocas passadas, sempre se fazia ouvir, quer nos momentos de crise quer na época da bonança, parece ter-se infelizmente silenciado para que outros atores lançassem mão dela.

São João del -Rei, terra de homens livres, berço do herói Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, e do grande estadista brasileiro do século XX, Tancredo Neves, neste momento-chave de nossa história, vem nos lembrar que a voz de Minas precisa novamente ser escutada e se colocar à disposição dos mineiros para redigir o discurso de Minas. Por seus heróis – projeção de sua alma –, pelo seu ideal franciscano – presente na sua história por 106 anos –, pelos seus feitos grandiosos e valores que defende, tem legitimidade para fazê-lo e até reivindica esse direito.

O momento é de crise da democracia contemporânea, de ausência de discurso. Por essa razão, os são-joanenses vêm lembrar ao povo brasileiro e seus representantes que a liberdade não é alguma coisa que é dada, mas resulta de um projeto de ação. Para Sartre, o homem é a sua liberdade e está condenado a ser livre. Condenado porque não se criou a si mesmo : como no entanto é livre, uma vez lançado no mundo, é responsável por tudo o que faz. O ato livre é necessariamente um ato pelo qual se deve responder e responsabilizar-se. Por isso, a liberdade é uma tarefa árdua cujos desafios nem sempre são suportados tranquilamente.

"Liberdade, essa palavra
Que o sonho humano alimenta
Que não há ninguém que explique
E ninguém que não entenda." (Cecília Meireles)

Tiradentes, o herói enlouquecido de esperança, de que nos falava Tancredo Neves, lutou, até à morte, por este valor supremo do homem : a liberdade. No mundo atual, sabemos todos, não há liberdade sem certos valores inalienáveis, a saber : justiça social e soberania, educação e cultura, trabalho e progresso. Em última palavra, não há liberdade sem participação.

Pelo exposto, entendo que :

- É fundamental que cada um de nós brasileiros, no exercício da cidadania, exija um novo projeto para a Educação brasileira, especialmente, para a educação básica, já que nossos indicadores obtidos face a outros países são simplesmente deploráveis. Portanto, estamos convencidos de que cidadania passa pela educação.

- O Brasil de hoje não é o Brasil sonhado por nossos heróis; menos ainda o Brasil que desejamos transmitir a nossos filhos e netos. Interesses subalternos sem qualquer relação com os interesses maiores da Nação atingem nossa soberania e nossos propósitos de desenvolvimento e bem-estar social. A miséria inaceitável escraviza uma parcela enorme e sofrida de nossa população. A indigência cultural agrilhoa a maioria do povo brasileiro.

- Nos discursos em campanhas eleitorais, o candidato a cargo eletivo promete melhoria na saúde e educação. Nada acontece, contudo, após a eleição e a promessa continua sem eco até o próximo pleito. Embora nosso SUS-Sistema Único de Saúde seja um dos mais avançados do mundo, há completa carência de recursos e de boa gestão na área da saúde.

- É inadmissível a permanência de determinados institutos legais, tais como :

1) o do foro privilegiado. (O foro privilegiado, tribunal de exceção, ou foro por prerrogativa de função, é, como o próprio nome diz, um privilégio concedido a autoridades políticas de serem julgadas por um tribunal diferente do de primeira instância, onde é julgada a maioria dos brasileiros que cometem crimes.)

2) o da impunidade parlamentar. A imunidade parlamentar é prerrogativa que assegura aos membros dos Parlamentos ampla liberdade, autonomia e independência no exercício de suas funções, protegendo-os contra abusos e violações por parte do Poder Executivo e do Judiciário. Infelizmente muitos Parlamentares confundem esse direito com a impunidade para delitos praticados antes e durante o seu mandato. Muitos Parlamentares se utilizam da chamada imunidade parlamentar para escapar dos ditames legais, causando perante toda a sociedade um sentimento claro e vivo de impunidade. Este sentimento é reforçado pela história : desde 1988 o STF jamais condenou qualquer Parlamentar que seja.

3) o da aposentadoria compulsória para magistrados transgressores. Esse instituto precisa ser urgentemente revisto e eliminado de nosso aparato legal, por conta da discriminação cometida contra o servidor público comum. Na prática se apresenta como pena máxima, na seara administrativa. Por ela, o magistrado é "punido" com sua aposentação precoce e passa a perceber, vitaliciamente, proventos públicos obviamente advindos do erário público (de todos nós, cidadãos brasileiros), tudo isso sem mais prestar quaisquer serviços ou desserviços, já que penalizado com sua aposentadoria compulsória. A discriminação se verifica quando constatamos que qualquer outro servidor público, estadual e federal, se comprovada sua transgressão, é demitido (penalização máxima administrativa), sem preservar quaisquer direitos, alguns sofrendo restrições, inclusive, de retorno a cargos públicos. O magistrado, no entanto, que deveria ser o aplicador retilíneo da lei, se a transgride, é aposentado compulsoriamente e recebe, pelo resto de sua vida, proventos públicos sem a contrapartida do trabalho.

- É premente a criação de outros institutos legais, tais como :

1) a revogatória de mandato (recall). É um mecanismo de democracia direta tipicamente norte-americano, pelo qual certo número de eleitores é consultado a respeito do mandato político de determinado representante (Parlamentares ou membros do Poder Executivo), podendo decidir pela permanência ou destituição do cargo. Caberá ao impugnado, assim como aos partidários e adversários, o direito de ampla defesa no intuito de manter o mandato individual. A Constituição brasileira prevê que a soberania popular será exercida somente por meio do voto (universal, obrigatório e secreto) ou por meio de plebiscito, referendo e iniciativa popular legislativa (art. 14 da Constituição Federal de 1988), não sendo concedido ao povo o direito ao recall, ou seja, de ser consultado a respeito da permanência ou não de determinado representante em seu mandato político. É uma forma explícita de democracia direta, pois o povo soberano que elegeu tem o poder de "deseleger".

2) a "ficha limpa". A campanha Ficha Limpa recolheu, até setembro do ano passado, as 1,3 milhão de assinaturas necessárias para que fosse apresentado ao Congresso um projeto de lei de iniciativa popular que vetasse a candidatura de pessoas com ficha suja nas eleições. O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, organizador da campanha, reúne 43 entidades do País. Pelo texto, não poderão concorrer pessoas condenadas em primeira instância, ou com denúncia recebida por um tribunal, por crimes de racismo, homicídio, estupro, tráfico de drogas e desvio de verbas públicas, além dos candidatos condenados por compra de votos ou uso eleitoral da máquina. Ficam ainda impedidos de concorrer os Parlamentares que renunciaram ao cargo para evitar abertura de processo por quebra de decoro – caso, por exemplo, de alguns Deputados envolvidos no escândalo do “mensalão”. Ainda que sejam aprovadas, as mudanças não valerão para as eleições de 2010. Para complicar ainda mais as coisas, tanto o TSE quanto o STF julgam que a candidatura só pode ser impugnada após condenação definitiva. Entendo que o projeto de iniciativa popular é muito mais eficiente do que o seu sucedâneo do Senado Federal e que os Poderes da República devem se unir para darem um basta ao esquema de corrupção instalado nos pleitos eleitorais do Brasil.

Há algo de podre no Reino... do Brasil! Se o Poder Legislativo é o vilão para a mídia brasileira, em parte é porque é um Poder aberto, com relativa visibilidade e transparência. Lamentavelmente não é o que se passa com os Poderes Executivo e Judiciário que constituem verdadeiras "caixas pretas", infensos que são a qualquer exame mais profundo ou investigação.

São esses os valores inalienáveis que pretendo seja a "voz de Minas" que não quer calar e que quero defender e promover, com meu amor e convicção.

São João del-Rei, Minas Gerais, 6 de março de 2010.

Francisco José dos Santos Braga
Consultor Legislativo Aposentado do Senado Federal


Considero seja esta a melhor forma de me dirigir à Nação brasileira. O Governador de Minas Gerais, Aécio Neves, é político de alta linhagem e o único líder político capaz de levantar a voz de Minas e aglutinar outras forças políticas em oposição à voz "chapa branca" do Palácio do Planalto e de seus apaniguados. Fez muito bem em não cumprir papel secundário no próximo pleito eleitoral, rejeitando papel subalterno que lhe impõe a arrogância do comando "tucano" paulista. Entretanto, salvo melhor juízo, não se pode falar em "sacrifício da trajetória de Aécio Neves" (já que a sua eleição para senador está garantida em Minas Gerais) quando se trata de ocupar espaço e voz das oposições brasileiras contra o continuísmo, que é o que se afigura daqui a quatro anos.

A voz "chapa branca" do Palácio do Planalto não entende nada de democracia participativa, pois nunca participou de um pleito, nem para o Legislativo como vereador, deputado ou senador, nem para o Executivo como prefeito, governador ou presidente.

Cabe observar ainda que Aécio Neves é o que há de novo no páreo para a Presidência, uma vez que todos os outros candidatos já colocados são todos de esquerda (inclusive o do comando "tucano" paulista). Ao analisar as razões por que os parlamentares tidos por seus adversários como "de direita" evitam colocar-se sob esse rótulo, Olavo de Carvalho conclui apud Timothy Power e César Zucco, autores do estudo denominado "Estimating Ideology of Brazilian Legislative Parties", 1990-2005):

1. A esquerda tem o domínio quase absoluto dos mecanismos culturais de estímulo e inibição vigentes nas altas esferas, demarcando a seu bel-prazer a fronteira entre a decência e a indecência, o orgulho e a vergonha, o mérito e a culpa. Os direitistas apressam-se em submeter-se a essa autoridade moral monopolística, não com passividade e indiferença, mas com uma verdadeira ânsia de ser aprovados por seus adversários.

2. Abdicando de todo critério moral próprio, a direita exclui-se, automaticamente, de qualquer possibilidade de combate na esfera cultural e psicológica, deixando o País à mercê da hegemonia gramsciana e limitando-se à disputa de cargos (o que implica ainda mais subserviência à facção dominante), ou então à discussão de miudezas econômico-administrativas sem nenhum alcance estratégico.

3. Mais que definir as regras do jogo, a esquerda cria até mesmo a identidade do adversário, colocando na "direita" quem assim lhe interesse catalogar no momento, passando por cima dos protestos subjetivos do catalogado e ignorando com frieza de femme fatale os afagos e juras de amor com que ele tenta cavar um lugarzinho no grêmio das pessoas decentes, isto é, esquerdistas.

4. O rigor do critério de seleção para o ingresso no círculo dos bons é tão implacável, tão inflexível, que a honra suprema do esquerdismo é negada até a velhos, tarimbados e fiéis militantes de esquerda, tão logo eles cometam a imprudência de entrar num partido que a esquerda, conforme seus interesses do momento, tenha rotulado como de direita.

O argumento mais forte contra a democracia direta é o do perigo totalitário: alega-se que há o risco dos plebiscitos e referendos serem usados de maneira perversa (como ocorreu em Portugal em 1933), prestando-se a sancionar um regime totalitário (Salazar). A adoção de modernas salvaguardas constitucionais adequadas impede que isso possa ocorrer. Há várias maneiras constitucionais de prevenir esses riscos; uma delas é proibir a realização de plebiscitos e referendos em anos eleitorais.

Nos países em que as instituições democráticas não são sólidas, ou são instáveis, como é o caso da maioria dos países da América Latina, se o chefe do Poder Executivo tem o poder de convocar consultas populares, existe um risco de que faça uso "político" dessa convocação, isto é, que se utilize da convocação para fins partidários, ideológicos, autoritários ou auto-legitimadores.

Nos países de "baixa qualidade democrática", se o alcance desses instrumentos não forem muito bem definidos e delimitados nas suas Constituições, existe o risco de que referendos e plebiscitos possam vir a influir negativamente na democracia; um chefe do Poder Executivo pode tentar convocar um referendo que mire além do tema da consulta, buscando sua auto-legitimação política, levando a plebiscito na realidade sua pessoa mais que nada, e pervertendo assim a função dos mecanismos de democracia direta.

O uso perverso do referendo em Portugal em 1933, que serviu para institucionalizar a ditadura de Salazar, e seu uso extensivo e intensivo por países sul-americanos da atualidade não recomendam o uso desse instituto sem as devidas salvaguardas constitucionais. O governante com aspirações absolutistas, como é o caso da maioria dos chefes de Estados sul-americanos, poderia utilizar-se desses institutos de democracia direta para infligir terrível ditadura sobre o povo que lhe delegou tal poder.

A democracia representativa precisa cuidar de ter sempre a seu alcance meios e modos constitucionais que impeçam seus instrumentos de virem a ser usados, perversamente, para fomentar a democracia delegativa - que é seu exato oposto - o que poderia conduzir, como no passado já conduziu, à criação de regimes totalitários. É preciso que haja, nas Constituições que consagram o plebiscito, cláusulas pétreas que assegurem que os plebiscitos não poderão ser usados de maneira delegatória para exacerbar mandatos, ou para reduzir a democracia; e impeçam que os plebiscitos sejam usados de maneira perversa, como já o foram muitas vezes em Portugal e na Europa. Outorgar mandatos é uma forma de abdicação da soberania popular.

No Brasil, o plebiscito depende de expedição de decreto legislativo pelo Senado ou pela Câmara dos Deputados, nos termos da Lei 9.709/98, para que seja realizado.

O projeto de iniciativa popular constitucional requer um número volumoso de assinaturas de cidadãos para a sua aprovação. Para contornar esse problema, tanto na Câmara Federal, inicialmente, quanto no Senado Federal, foi criada a Comissão de Legislação Participativa (CLP), que autoriza entidades da sociedade civil organizada a apresentarem ao Legislativo proposituras de lei.

Com a palavra, o então Presidente da Câmara dos Deputados, Aécio Neves, mentor da criação da CLP:

Quando assumi o compromisso de criá-la, ainda como candidato à Presidência da Câmara, guiava-me por um mandamento não-escrito e só ignorado pelos autoritários: o de que, muitas vezes, os representados estão à frente de seus representantes. Inspirou-me, também, a lição histórica de que, aprisionada em suas rotinas e divorciada da vontade popular, a representação parlamentar serve ao esvaziamento da política, à descrença em seus atores e, por decorrência, ao enfraquecimento da democracia”.

Pode-se dizer que a CLP avançou sobremodo em relação à iniciativa popular constitucional, pois exige do cidadão e de suas associações procedimentos céleres e mais simples para apresentação de proposições ao Congresso Nacional (leis ordinárias, complementares e até emendas à lei orçamentária anual).

Na Câmara de Vereadores de São Paulo, assim como em muitas outras Assembléias, já funciona a CLP, por decorrência federal, já sendo admitido esse modelo mais fluido de democracia semi-direta.

Diferentemente da iniciativa popular constitucional, a CLP acolhe sugestões apresentadas diretamente por associações de classe, sindicatos, organizações não-governamentais, outras entidades organizadas da sociedade civil e mesmo órgão oficiais que disponham, em seus Conselhos, paridade de representação entre civis e servidores, bastando, para tal, a apresentação de documentos que confirme a atuação e o registro da entidade.

Como se vê, tanto a iniciativa popular constitucional quanto a CLP criam a possibilidade efetiva de se alcançar a legitimidade requerida pelo processo de tomada de decisões importantes num regime democrático. Além disso, permitem que o povo intervenha sem mediações nos assuntos de seu interesse. Por fim, combatem a apatia e a alienação políticas.

Não convém esquecer que a CLP já se mostrou representativa e muito efetiva processualmente, já que, das sugestões apresentadas, inúmeras são as já aprovadas, bem como várias foram as proposições legislativas daí decorrentes. Muitas das sugestões apresentadas referem-se a emendas à lei orçamentária anual, destinando recursos a entidades como Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, Centro em Defesa da Vida, Cáritas Brasileira, União de Negro por Igualdade e muitas outras.

Portanto, no Brasil, embora seja limitada a utilização dos institutos do plebiscito e do referendo, a capacidade de iniciativa popular, como texto originário, e a apresentação de propostas através de CLP constituem, de fato, mecanismos para construção de uma cultura popular de democracia semi-direta, já em perfeito funcionamento no País.

O exercício da democracia é muito mais corrigir os obstáculos ao seu pleno exercício do que insistir num novo modelo que lhe ofereça risco de sobrevivência.

Normalmente, o chefe do Poder Executivo brasileiro (como é o caso do atual) tem maioria no Parlamento, não podendo alegar que não consegue aprovar as proposituras que defende ou que o que consegue aprovar está divorciado do povo.


Trabalhos consultados:
UL_TF_DL_2004_ALEXANDRE_NAVARRO_GARCIA.pdf

http://www.olavodecarvalho.org/semana/090601dc.html (intitulado "A direita que a esquerda quer")

Acesso em 12/03/2010.


* Francisco José dos Santos Braga, cidadão são-joanense, tem Bacharelado em Letras (Faculdade Dom Bosco de Filosofia, Ciências e Letras, atual UFSJ) e Composição Musical (UnB), bem como Mestrado em Administração (EAESP-FGV). Além de escrever artigos para revistas e jornais, é autor de dois livros e traduziu vários livros na área de Administração Financeira. Participa ativamente de instituições no País e no exterior, como Membro, cabendo destacar as seguintes: Académie Internationale de Lutèce (Paris), Familia Sancti Hieronymi (Clearwater, Flórida), SBME-Sociedade Brasileira de Música Eletroacústica (2º Tesoureiro), CBG-Colégio Brasileiro de Genealogia (Rio de Janeiro), Academia de Letras e Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei-MG, Instituto Histórico e Geográfico de Campanha-MG, Academia Valenciana de Letras e Instituto Cultural Visconde do Rio Preto de Valença-RJ e Fundação Oscar Araripe em Tiradentes-MG. Possui o Blog do Braga (www.bragamusician.blogspot.com), um locus de abordagem de temas musicais, literários, literomusicais, históricos e genealógicos, dedicado, entre outras coisas, ao resgate da memória e à defesa do nosso patrimônio histórico.Mais...