terça-feira, 15 de junho de 2010

Memória resgatada

Por Wainer de Carvalho Ávila *

Em 7 de outubro de 2003, através do Ofício nº 026-IHG/2003, o Presidente do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, Sr. José Antônio de Ávila Sacramento, oficiou ao Ministério Público, na pessoa da Promotora Dra. Eliane do Lago Correa, solicitando fossem envidados esforços para recuperar para a comunidade são-joanense a portada original da Igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos. Informava ainda que a referida obra de arte que fora vendida em 1970, quando da demolição do templo edificado no século XVIII, se encontrava na Fazenda São Martinho da Esperança, no município de Campinas, Estado de São Paulo, conforme noticiara a Revista Casa de Fazenda (Ano 1, nº 2, 1990 – editada pelo Grupo de Revistas Casa Cláudia) na página 84, com os seguintes dizeres: “ (...) Ah! A face silenciosamente bela e mística das Minas Gerais! Sobretudo, a fé removida das igrejas ornadas por Aleijadinho para os redutos de São Martinho da Esperança. Eis um verdadeiro espetáculo de bom gosto e história: um pórtico em pedra-sabão trazido de São João del-Rei para enriquecer uma capelinha dos anos 50, perdida em meio à vegetação. Deslumbrante cenário.(...)”

No mesmo ofício, o Presidente credenciava o confrade e bacharel em Direito, Dr. Wainer de Carvalho Ávila, autor da presente matéria, para representar o IHG no assunto em questão, ficando a cargo da Curadoria da Defesa do Patrimônio Público e Patrimônio Histórico e Cultural de São João del-Rei a iniciativa das providências legais.

Inicialmente, o processo foi distribuído à 2ª Vara Cível da Comarca de São João del-Rei, tendo o Juiz Titular Dr. Auro Aparecido Maia Andrade determinado as medidas cabíveis para a recuperação da referida obra de arte, com envio de carta precatória para o Estado de São Paulo. A citação não se efetivou em vista da morte do adquirente, Sr. Mário Pimenta Camargo.

O Ministério Público Federal entendeu ser de sua competência a condução do feito, de acordo com a legislação que regula tal matéria, passando o processo a tramitar na Justiça Federal sediada nesta cidade de São João del-Rei.

Houve a citação do espólio do Sr. Mário Pimenta Camargo na pessoa da inventariante do espólio, Sra. Beatriz Mendes Gonçalves Pimenta Camargo, para as providências que o espólio julgasse convenientes.

Ocorre que a referida senhora decidiu, mediante petição nos autos (Processo nº 2009.38.15.000812-0) e dirigida à Vara Única da Justiça Federal em Minas Gerais – Subseção Judiciária de São João del-Rei e datada de 8 de junho do corrente ano, em gesto de grandeza e profundo altruísmo, concordar com a postulação de nossa cidade, prontificando-se a entrar em acordo, mediante termo de transação nos autos, restituindo a peça objeto da demanda a seu proprietário originário.

Acompanhado do são-joanense Francisco José dos Santos Braga, também Membro da Academia de Letras e do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, tomei conhecimento hoje da tramitação do processo civil supracitado. Constatei, após leitura dos autos, que a decisão nos é favorável.

Os são-joanenses temos a sorte de contar com a visão esclarecida da Sra. Beatriz Mendes Gonçalves Pimenta Camargo, a qual possui um currículo excelente. A título de esclarecimento, informo que a referida senhora é Vice Presidente do MASP-Museu de Arte de São Paulo Assis Chateaubriand, Membro do Conselho do Museu do Oratório de Ouro Preto, Membro do Conselho Internacional do Museu de Arte Moderna de New York, entre muitos outros títulos que possui.

São João del-Rei está hoje muito mais enriquecida no seu acervo cultural e histórico devido à iniciativa de nossas Instituições e à elevada compreensão da referida expertise em arte. Resta agora à comunidade local decidir a melhor destinação a ser dada ao importante pórtico original que ornamentava a tradicional Igreja do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, que vem repor a justa altivez de nossa gente que se achava profundamente ferida desde 1970.

* Wainer Ávila, graduado em direito pela Universidade Católica de Minas Gerais, é o atual Presidente da Academia de Letras de São João del-Rei, ocupante da cadeira Embaixador Gastão da Cunha. É Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, ocupante da cadeira Alferes Tiradentes. Membro Definidor da Venerável Ordem Terceira de São Francisco de Assis da Diocese de São João del-Rei. Sócio Benemérito e Conselheiro do Athetic Clube de São João del-Rei. Sócio Honorário do Rotary Club. Sócio Correspondente do Instituto Cultural Visconde do Rio Preto. Sócio Correspondente da Academia Valenciana de Letras. Conselheiro do Centro Cultural Feminino de São João del-Rei. Membro do Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico de São João del-Rei. Mais...

4 comentários:

Anônimo disse...

São João Del –Rei é uma terra de sorte. Tem uma história rica, uma cultura preciosa e, desde a chegada dos primeiros bandeirantes, homens e mulheres valorosos. Homens e mulheres que a amam profundamente e a ela se dedicam com zelo devocional. Com isso, incessantemente vasculham passado e presente, empreendendo esforços que quase sempre - mais cedo ou mais tarde - levam ao sucesso, como é o caso da reconquista da portada da igreja de Matosinhos. São-joanenses, todos ganhamos com isso. A cultura nacional ganha com isso. Livre de delimitações, a cultura, como resultado do saber e do fazer humano, também ganha com isso.

Penso que cada conquista deve se materializar em aumento da auto-estima local, o que será tão mais alcançado quanto mais for generosamente coletivizado o sentimento de vitória. Quanto maior for o número de vencedores, maior será o número de são-joanenses comprometidos com novas causas e maiores o entusiasmo, a confiança e o comprometimento com que se lançarão aos novos desafios.

Sobre o zelo devocional, entretanto, há de se cuidar para que o excesso de precauções, reservas, cautelas e minúcias não embace visões nem desvie energias grandiosas para questões menores, estatizantes ou reducionistas, promovendo a desagregação que só traz enfraquecimentos e faz passar oportunidades.

Parabéns a todos que capitanearam esta causa, a quem devemos mais esta vitória. A eles nossos agradecimentos!

Antonio Emilio da Costa

Anônimo disse...

Não concordo, em hipótese alguma, com a simplicidade deste senhor que, "pegando carona" no assunto, ousa escrever um artigo e afirmar que a devolução da portada é um "gesto de grandeza e profundo altruísmo" da sra. Beatriz. É certo apenas que a visão dela é esclarecida, mas juridicamente esclarecida e em seu favor; certamente que orientada por bons advogados, ela deve estar propondo o tal acordo para, quem sabe, livrar-se de um danoso e midiático processo contra o crime de seu marido (e agora dela), qualificado na receptação e guarda de bens culturais tombados. Ela não faz favor algum em devolver para São joão del-Rei a peça sacra, que nunca deveria de ter saído de onde saiu. Elogiar a uma pessoa que juntamente com seu marido manteve por mais de 40 anos uma peça sacra adquirida irregularmente nos jardins de sua fazenda é, no mínimo, ingenuidade... Fazer o quê?

Anônimo disse...

É mesmo muita ingenuidade achar que a granfina paulista iria devolver a peça sacra para MG por livre e espontânea vontade....

Anônimo disse...

Na qualidade de presidente da ASMAT (Associação dos Moradores e Amigos do Grande Matosinhos) manifesto o desejo de que a referida portada volte para o lugar de onde ela saiu. Se a demolição e venda da igreja antiga atingiu profundamente as pessoas cultas e sentimentais do nosso bairro, rever "in loco" a referida peça nos traz alegria, satisfação e honradez, e nos conduz a épocas remotas, aonde, nós, quando adolescentes, circulavamos por essa porta pelo menos duas vezes aos domingos de missas.
Atenciosamente.
José Cláudio Henriques.