Com Aécio Neves, pela sua brilhante trajetória política, tudo leva a crer que as medalhas serão colocadas nos agraciados pelo Exmo. Sr. Presidente da República Federativa do Brasil. O texto que vai transcrito abaixo, caro leitor, no qual sou procurador das representativas entidades que constam no caput da peça exordial, mereceu parecer favorável do Ministério Público, representado pelo Promotor Adalberto Christo Leite, e tramita na 3° Vara Cível da Real Comarca do Rio das Mortes. Ei-lo:
“Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de São João Del-Rei - MG
O Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, sociedade civil com finalidades cientificas e culturais, sem fins lucrativos, CNPJ 18 994 319/0001-45, com endereço na Rua Santa Tereza, nº 127-Centro (Casa mais antiga), representado por seu presidente José Antônio de Ávila Sacramento e a Câmara Municipal de São João del-Rei, CNPJ 17 749 846 /0001, com endereço na Rua Ministro Gabriel Passos, s/nº, centro, através de seu presidente Maurílio de Caxias Chafy Hallack, representando os vereadores e o povo do município de São João del-Rei; a Academia de Letras de São João del-Rei, entidade associação civil de direito privado, com finalidades culturais, sem fins lucrativos, CNPJ 20 313/28.0001-12, com endereço na Praça Frei Orlando, 90-F, centro, representada pelo seu presidente Antônio Guilherme de Paiva; o Rotary Clube de São João del-Rei (Distrito 4580), CNPJ 02 599 941/0001-70, com endereço na Rua Antônio Tirado Lopes, 51, Villa Marchetti, representado pelo seu presidente Agnelo Alencar Dias; a Loja Maçônica Charitas II, CNPJ 24 739 591/0001-81, com endereço na Av. Presidente Tancredo Neves, 129, centro, representada pelo seu venerável Geraldo Francisco Chaves de Resende e vigilantes; a Associação Comercial e Industrial de São João Del-Rei, CNPJ 24 735 151/0001-56, com endereço na Rua Maria Teresa, nº 20, 2º andar, Centro, representada pelo seu presidente João Afonso Farias; o Lions Clube de São João del-Rei, CNPJ 19 481 654/0001-02, com sede na Rua Rossino Baccarini, nº 43, Tijuco, representado por seu presidente Osvaldo Resende e secretário, conforme instrumentos de mandatos anexos e que passam a integrar este feito por intermédio de seu procurador in fine assinado, estabelecido profissionalmente nesta cidade na Avenida Tiradentes, 538, Centro, e em Belo Horizonte na Rua Thompson Flores, 366/1001, Gutierrez, com o objetivo de estabelecer fato histórico que virá a constituir-se em fato jurídico, requerem o que passam a expor, culminando com o requerimento que será aduzido ao final da presente Justificação Judicial.
DESTA FORMA,
Dizem os peticionários, com supedâneo nos altruísticos interesses desta comunidade, alicerçado nos elevados valores das entidades que firmaram o mandato autorizativo deste pleito, via seus representantes legais com poderes para tal munus e com fulcro na lei civil pátria (Lei 10.406, de 10-02-2002) ainda consolidado no Código de Processo Civil, que, nesta peça fundem-se o respeito à História Nacional e o resgate de um de seus capítulos mais tenebrosos, ao mesmo tempo em que o mais nobre e grandioso, fatos e atos que se entrelaçam na unanimidade dos diversos segmentos sociais e intelectuais legitimados para pedirem a prestação jurisdicional presente, visto ser este feito não só de interesse comum, mas especialmente de ordem augusta e excelsa.
O que se pretende com esta justificação destituída de caráter contencioso, ainda com suporte nos artigos 50, § 4º e 52, § 2º da Lei 6.015/73, é o registro civil, AINDA QUE TARDIO, do conterrâneo ilustre JOAQUIM JOSÉ DA SILVA XAVIER, o TIRADENTES, Alferes do Regimento de Cavalaria Regular de Minas Gerais, nascido na Fazenda do Pombal. Aqui se expõem, non nova sed nove, não coisas novas mas de modo novo, pois o lema de seus seguidores ilustres, patriotas da mais alta estirpe, LIBERTAS QUAE SERA TAMEN, adotado de Virgílio e da SS. Trindade, LIBERDADE AINDA QUE TARDIA, que se ajusta com o seu registro civil, ainda que tardio - Libri Viri Magistri Sunt.
Nossa causa transcende os limites do rigorismo legal e a rijeza e formalismo jurídicos pois uma causa limitada produz efeito limitado: Limitata causa limitatum effectum producit.
A memória brasileira não é muito deificada e inquestionável é o misoneísmo mineiro, culminando com algum descaso que os pesquisadores e historiadores são-joanenses dedicam às personagens de nosso culto histórico. Partindo-se desta premissa, não é raro encontrarem-se manuscritos ou qualquer forma de documento antigo jogados às traças, goteiras e cupins, sem mencionar, por vergonha e pejo, o que serve de pasto a roedores e de divertimento para vandalismo de não poucos. Apenas alguns abnegados, sacrificados seria mais conveniente dizer, tornam-se credores de nossa gratidão e perseguem os tesouros históricos a duros padecimentos, tesouros que revelam apenas o que sobrou de nossa História. Há valioso subsídio a esta assertativa com o depoimento de Hildebrando-Bolívar de Magalhães, filho de Basílio de Magalhães, publicado em “O Jornal”, de 1929, onde noticia o falecimento do religioso Alberto do Amaral Bastos e sua herança, um monte de papéis velhos carcomidos dentro de um caixote, e pertencentes ao arquivo da Matriz do Pilar, no preciso momento em que seriam lançados à fogueira. Salvou-os da chama o maestro João Evangelista Pequeno, indo eles parar nas mãos do escavador de documentos major Samuel Soares de Almeida. Basílio confirma o nobre gesto em depoimento ao jornal “A Noite”, do Rio de Janeiro, em setembro de 1925.
O culto dos acontecimentos marcantes de nossa História e dos vultos maiores da nacionalidade deveria ser uma vocação cívica, antes mesmo do que uma imposição patriótica.Temos indisfarçável tendência para desmerecer nossos próprios feitos e descuramos de restaurar a verdade de acontecimentos dignificantes deturpados e reparar gritantes injustiças. Tudo isso está a rememorar o pecado da omissão, mais grave do que o da ação, no Sermão do Primeiro Domingo do Advento, do jesuíta Antônio Vieira: “Sabei, cristãos, sabei Príncipes, Sabei Ministros, que se vos há de pedir estreita conta do que fizestes; mas muito mais estreita do que deixastes de fazer. Pelo que fizeram, se hão de condenar muitos, pelo que não fizeram, todos”.
Algures já li que há um comprovado complexo de inferioridade, síndrome de catástrofe, e que envolve a cultura nacional, conforme afirmação de Cyro Siqueira, de que no ano de 1873 teve início sórdida campanha contra Tiradentes nas páginas da “História da Conjuração Mineira”, de autoria de Norberto Sousa Silva, monarquista e amigo pessoal de D. Pedro II, onde Tiradentes é visto como “Um moleque, um desmiolado, um louco que conseguiu ser admitido entre os Inconfidentes e pôs tudo a perder...” (Cyro Siqueira in “Tiradentes e a Imagem de um País”, jornal Estado de Minas, pág. 10, de 28 de abril de 2001).
Como compensação de nossa preguiça mental socorreu-nos a criatura celestial Isolde Helena Brans, jornalista gaúcha e advogada campineira, que identifica o movimento precursor da Inconfidência como fonte e nascimento na cidade de Coimbra, em 1785, no chamado “Pacto dos doze estudantes brasileiros que secretamente juraram conquistar a independência da colônia natal a qualquer custo e risco” e com fortes e consistentes provas documentais identifica Silva Xavier como o grande embaixador e legítimo estadista do movimento no triângulo Brasil, França, Estados Unidos. Consoante publicações, com destaque para o livro “Tiradentes Face a Face” (Riode Janeiro, 1992, 84 páginas, patrocinado pela Xerox), e, ainda, para o artigo publicado no jornal “Estado de Minas de 15 de dezembro de 2001, pág. 04, “Tiradentes viveu e conspirou, na Europa, por cerca de um ano e meio”. Houvesse espaço e comportasse esta petição, juntaria farta documentação referente ao rábula Albergaria, procurador do Alferes e que, munido de procuração, recebeu, durante um ano, seu soldo, em Vila Rica, no período em que viveu fora do Brasil.
A par disso, se avançarmos decididamente nas pesquisas, veremos que alguns dos sediciosos podem ter deixado manuscritos, anotações ou diários, escondidos estrategicamente, quem sabe em códigos, talvez usando codinomes, o que era normal e sobretudo prudente, na ocasião e naquela peculiar situação. Algum museu, daqui ou de além-mar, poderá, se houver vontade, esclarecer pontos obscuros ou controvertidos. O exemplo dos caixotes com papéis carcomidos que seriam incinerados com a certidão eclesiástica do menino Xavier reforça a tese, já que fato idêntico ocorreu e consta nos arquivos da Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar, nesta cidade, referente ao primeiro sacramento de Francisca de Paula de Jesus, a Nhá Chica, em processo de beatificação na Santa Sé. Monsenhor Sebastião Paiva conseguiu recuperar, incólume, um velho livro extraviado e milagrosamente devolvido por um devoto, o qual jamais poderia imaginar que aquela peça, aparentemente sem valor e sem utilidade, encerrava a revelação de uma futura santa da Igreja Católica Romana. Registrem-se dois fatos pouco airosos para nós são-joanenses: Nhá Chica nunca foi registrada civilmente, apesar de ser do primeiro quartel do século XX, e no rol dos Bem-Aventurados a beata é identificada como Nhá Chica de Baependi, Diocese de Campanha e não de São João del-Rei, mesmo constando em seu batistério que foi dada à luz aqui na Vila de Santo Antônio do Rio das Mortes Pequeno (hoje distrito do Rio das Mortes). Se em algum recanto, talvez poeirento, de Ouro Preto, São João del-Rei, Tiradentes, Resende Costa, Borda da Mata, Prados ou Lagoa Dourada, Cebola, Ouro Branco ou Rio de Janeiro, Torre do Tombo, Louvre ou Nova York pode estar um escrito ou um bilhete de um inconfidente ou de quem o ajudou no estrangeiro. A historiografia do movimento pode abater-se sobre nós e mostrar terrível verdade, aquela que não queremos conhecer. Só sabemos as verdades ditadas por juízes submissos, por depoimentos de delatores e acima de tudo aquelas versões criadas e mandadas inserir e constar pela louca Maria Primeira. Tudo, tudo mesmo, está na versão policialesca de quem redigiu os AUTOS DA DEVASSA.
Como em toda questão de vulto e que encerra sentimentos altruístas e patrióticos, devemos iniciar as provas documentais coligidas pelo autor de nomeada além fronteiras na monumental obra AS VILAS DEL-REI E A CIDADANIA DE TIRADENTES, da coleção Documentos Brasileiros, publicada no ano de 1976, pelo Instituto Nacional do Livro, Ministério da Educação e Cultura, que é EDUARDO CANABRAVA BARREIROS (obra que acompanha esta peça vestibular, na sua versão original). Na obra, que é aceita nacionalmente como documento incontestável, o autor assim se manifesta:
“Quanto aos homens, emergem eles de cada área como plantas de um aral, sujeitos civilmente às jurisdições de cada termo (...) termos esses que se configuram em decorrência de atos e leis próprias, não deixando assim, dúvida nenhuma quanto à cidadania dos que viessem `a luz em seus âmbitos territoriais. As interferências indevidas, passageiras, nos termos de cada vila, não lhes retiravam a personalidade histórico-geográfica, estabelecida por leis ou atos adequados (...) mas a verdadeira finalidade dessa busca é estabelecer a cidadania de Tiradentes, o que julgamos também ter alcançado. Anexamos ao presente os pareceres das mais altas instituições histórico-geográficas, como sejam o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e o Instituto de Geografia e História Militar do Brasil, os quais enriquecem este ensaio. Restava, todavia, o aspecto legal ou jurídico dessa cidadania, e que fugia a nossos conhecimentos. Para tanto submetemos o presente trabalho ao Egrégio Instituto dos Advogados do Brasil, órgão também de âmbito nacional e cujas conclusões complementaram as de ordem histórica e geográfica (...) Com isso finalizamos as pesquisas contidas neste livro, afirmando nossa convicção de que o herói tutelar do Brasil, o Tiradentes, nasceu no termo da Vila de São João del-Rei.” (grifamos)
A conclusão do nacionalmente acatado cartógrafo e historiador, utilizando-se de uma figura geométrica em que os ângulos A, B e C simbolizam a naturalidade do protomártir, leciona e ensina:
JOAQUIM JOSÉ DA SILVA XAVIER, O TIRADENTES,
Ângulo A:
Nasceu na Fazenda do pombal. “Auto de perguntas ao Alferes Joaquim José da Silva Xavier.” E sendo perguntado, como se chamava, de quem era filho, donde era natural, se tinha algumas ordens, Se era casado, ou solteiro, e que ocupação tinha. Respondeu que se chamava Joaquim José da Silva Xavier, filho de Domingos da Silva Santos e da sua mulher Antônia da Encarnação Xavier, NATURAL DO POMBAL TERMO DA VILLA DE S. JOÃO D’EL-REY, capitania de Minas Geraes, que tinha quarenta e hum annos de idade e que era solteiro, que não tinha Ordens alguas, e com effeito, vendo-lhe eu o alto da Cabeça vi que não tinha tonsura algua e que era Alferes do Regimento da Cavallaria paga de Minas Geraes”.
Ângulo B:
“Livro para servir de assentos dos batizados da FREGUEZIA DE N. S. DO PILLAR DE SÃO JOÃO D’EL-REY... 1742-1949 Fº 151 rº” Aos doze dias do mez de novembro de mil setecentos e quarenta e seis annos, na capella de São Sebastião do Rio Abaixo o Reverendo Padre João Gonçalves Capellão da dita Capella baptizou e poz os Santos Óleos a Joaquim filho legítimo de Domingos da Silva dos Santos e de Antônia da Encarnação Xavier; foram padrinhos Sebastião Ferreira Leytão, e não teve madrinha; do que fiz este assento. O coadjtor Jeronymo da Fonseca Alv.
Ângulo C:
DECLAROU-SE NATURAL DO TERMO DA VILLA DE S. JOÃO DEL-REI. SÃO OS DOCUMENTOS QUE FALAM! RESPEITEMO-LOS...
A: Só em 1755, em virtude da Correição de 17 de fevereiro passaria a Fazenda do Pombal à jurisdição da Vila de São José Del-Rei, estando JÁ TIRADENTES COM NOVE ANOS.
B: Localizada ao norte ou ao sul do Rio das Mortes, esta capela de S. Sebastião pertencia à Vila de São João Del-Rei, QUANDO DO BATIZADO DE TIRADENTES.
C: É o próprio Alferes que, quarenta e três anos após seu batismo, vem dizer-se natural do termo da Vila de São João del-Rei. Vide Prancha 21-D-pág.113.
É na página anterior, sob o nº 112, que poderíamos denominar triângulo histórico-documental, que fala por si mesmo, que o mestre Canabrava Barreiros, após exaustivo e demorado trabalho de pesquisa em documentos existentes e à disposição de quem quiser lê-los, decide “Ex-Cathedra”: O HERÓI TUTELAR DO BRASIL, O TIRADENTES, NASCEU NO TERMO DA VILLA DE SÃO JOÃO DEL-REI.
O primeiro parecer técnico leva a chancela de Herculano Gomes Matias, do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, cujos excertos vão abaixo (pág. XIV):
“Voltando ao mérito da questão saber se o mártir da Inconfidência era ou não natural de São João Del-Rei cremos que, depois da leitura atenta de As Vilas del-Rei e a Cidadania de Tiradentes, constitui, agora, ponto pacífico, que no ano de 1746, quando se deu o batismo de Joaquim José da Silva Xavier, os terrenos onde se situava a Fazenda do Pombal, local de seu nascimento, estavam vinculados administrativamente à Vila de São João Del-Rei.” (grifo nosso)
A opinião abalizada do general Edmundo de Macedo Soares e Silva, que assina em nome do Instituto de Geografia e História Militar do Brasil, é consagradora:
“Canabrava Barreiros era a pessoa exata com competência para enfrentar as dificuldades; ao lado de sua retidão e espírito de historiador é cartógrafo hábil, capaz de examinar e colocar os acidentes geográficos em seus lugares certos, após exame minucioso e dentro de técnica acurada. Eduardo Canabrava Barreiros nos brinda com mais um interessante estudo, esclarecedor de muitos fatos históricos mas, principalmente esclarecedor da verdade, para ele, incontestável, diante dos documentos autênticos reproduzidos dos originais, de que a Fazenda do Pombal fazia parte do território de São João del-Rei, à época do nascimento do glorioso alferes e durante a maior parte do período de disputa com São José Del-Rei. Destarte, o vulto admirado do protomártir da nossa independência, herói tutelar do Brasil, o Tiradentes, nasceu no termo da Vila de São João Del-Rei. É a conclusão. (grifo nosso)
A firmeza jurídica, com diâmetro legal e manifesta segurança, dá-nos o homem público de honra inatacável, diplomata e intelectual, o congressista Afonso Arinos de Melo Franco, em nome do Instituto dos Advogados Brasileiros, ipsis litteris (pág. XVIII):
“Designado como representante do Instituto dos Advogados para opinar sobre o estudo do prof. Canabrava Barreiros venho desincumbir-me do honroso cargo. Depois de atenta leitura do texto e de meditada consideração dos documentos, inclusive cartográficos, que o acompanham, fiquei convencido, sem qualquer dúvida, da procedência da tese defendida pelo eminente historiador e geógrafo, ou seja, que o Alferes Joaquim José da Silva Xavier nasceu, no ano de 1746, em território que então pertencia à Vila de São João del-Rei. A remoção do local onde se encontrava a Fazenda do Pombal, berço de Tiradentes, para o município de São José del-Rei verificou-se por ato judicial de 1755, quando o precursor da Independência Nacional já contava nove anos.” (grifo nosso)
As provas apresentadas são conclusivas, abundantes, têm coerência, encadeamento e limpidez. Constituem exaustiva demonstração histórico-jurídica, que satisfaz ao mais exigente investigador da história ou do direito.
O livro “O Tiradentes, Patrono Cívico do Brasil, onde nasceu, como viveu, qual foi seu aspecto físico” (em anexo), de autoria de Fábio Nelson Guimarães, conceituado historiador, apresenta o mesmo diapasão histórico de Canabrava Barreiros. É de sua lavra:
“O Ouvidor Geral da Comarca do Rio das Mortes, Francisco José Pinto de Mendonça, procedeu a uma nova delimitação entre as duas Vilas, a 17 de dezembro de 1755 – O Tiradentes estava com pouco mais de nove anos – determinando que a Fazenda do Pombal se incluísse no domínio de São José, em função da corrente líquida do funesto rio.”
O autor é acompanhado por Altivo de Lemos Sette Câmara e Waldemar de Almeida Barbosa, ambos de dimensão intelectual magnífica.
Imperdoável seria não constar nestes autos os ensinamentos de Monsenhor Flávio Carneiro Rodrigues, diretor do Arquivo Eclesiástico da Arquidiocese de Mariana, professor de grego na Universidade Federal de Ouro Preto e membro do Instituto Histórico de Minas Gerais. O prelado usa como fonte o De Genere et Moribus e do alto de sua autoridade escreve:
“...Reeditam, assim, aquela célebre contenda peregrina que, com tanta graça, rememorou o imortal vate lusitano que em seus geniais decassílabos heróicos cantou Homero cujo berço natalício fora também reclamado por sete cidades gregas (...). Um exame colateral dos documentos de dois irmãos sacerdotes de Tiradentes, os Padres Domingos e Antônio, pode contribuir para aclarar a controvérsia. Domingos foi ordenado padre em 1765. Pe. Antônio, capelão de Ressaca, filial de Prados, viveu os últimos anos em sua fazenda... Diz Domingos da Silva Xavier, ser natural e batizado nesta freguezia de N.S. do Pilar da freguezia de São João del-Rey, Comarca do Rio das Mortes.”
É válido rememorar que a certidão de batismo é um documento eclesiástico e pode ser usado como certidão de nascimento em casos excepcionais, pois mesmo com a laicização os laços entre Estado e Igreja não se romperam repentinamente nem o Estado republicano passou a tratar isonomicamente os grupos religiosos. Perduraram até pouco os compromissos e vínculos nas relações estatais e representantes de instituições católicas. O único documento, para muitos, continuou sendo a CERTIDÃO DE BATISMO.
Cita mais o Monsenhor a Sentença de Habilitação (processo do P. Domingos, pág. 150v e 151): “Vistos estes autos de habilitação de genere em meza dos habilitandos Domingos da Silva Xavier e seu irmão Antônio da Silva dos Santos... mostra-se que os habilitandos são naturais da V. a de S. João del-Rey, deste bispado, filhos legítimos de ... julgamos os habilitandos por legítimos e inteiros Christãos sem mácula alguma (de infecta nação) e os damos por habilitados..... a) Ignácio Correa de Sá.” Testemunho do Pe. Antônio (anexado ao seu processo de Genere. Na redação de seu testamento, o Pe. Antônio, num dos primeiros parágrafos, asseverou “expressis verbis”: “DECLARO QUE SOU NATURAL DA FREGUEZIA DE N.SRA. DO PILLAR DE S.JOAO D’ELREY, filho legítimo de (...).” Merece destaque: Se o nascimento neste mundo físico nos oferece o sopro da vida corpórea e nos insere numa família humana, o batismo nos dignifica com a vida espiritual, serve-nos a luz da fé e nos enobrece com a filiação divina... quem vacila ou erra ao indicar sua própria terra? Quem? Somente um néscio, mas não clérigos estudados que passaram pelo renomado seminário de Mariana, nunca um odonto bem competente, jamais um líder arguto e corajoso que empolgou intelectuais e ergueu Minas contra o jugo português.
BASÍLIO DE MAGALHÃES (nascido provavelmente em Barroso e falecido na cidade de Lambari, em 1957), escritor, poliglota, civilista e positivista lega induvidosa contribuição para identificação da origem do líder arguto e corajoso. Na Revista do Arquivo Público Mineiro, ano XXIV, 1933, 1º vol., emite consistentes lições de história, geografia e cartografia da época, mais precisamente, de meados do séc. XVIII. Seus memoráveis ensaios e crônicas referem-se principalmente à criação de comarcas nos tempos coloniais em Minas. O TIRADENTES É SANJOANENSE! Epíteto este encimando sempre seus artigos. (Cópia reprográfica da revista vai anexa).
Juntam-se com sua peça exordial publicações especialmente de Eduardo Canabrava Barreiros, Fábio Nélson Guimarães (e outros) e do senador Alfredo Campos Melo, os quais, para facilitação de manuseio dos autos e se V.Exa. julgar conveniente, poderão ficar depositados em secretaria, à disposição de interessados, sem perderem contudo sua integridade ao processo. Anexam-se ainda depoimentos escritos de autoria dos abalisados estudiosos Augusto das Chagas Viegas, Sebastião de Oliveira Cintra, Antônio Gaio Sobrinho, José Franklin Massena de Dantas Mota, Augusto de Lima, Luís de Melo Alvarenga, Tancredo de Almeida Neves, Francisco José dos Santos Braga, José Antônio de Ávila Sacramento, Basílio de Magalhães, Monsenhor Flávio Carneiro Rodrigues, Elizabeth de Melo Bomfim, Regina Faria Ávila, Geraldo Guimarães, Rosalvo Gonçalves Pinto e Gilberto de Alencar.
Pela heurística vi, com gáudio, que a Biblioteca Batista Caetano, fundada nesta cidade há 168 anos, preserva relíquias e preciosidades que, se necessário, fornecerão subsídios para o objetivo nobre que se pretende com este feito. Existem periódicos antigos que nos remetem a pesquisas capazes de identificar ascendentes maternos e paternos de Tiradentes, o que certamente ajudará em seu registro civil. Esta ascendência encontra-se bem estudada em livro “Um presente para o Futuro”, de Elizabeth de Melo Bomfim, a qual informa na página 23 que Domingos, pai de Tiradentes, no ano do nascimento do filho prodígio, ocupava o cargo de almotacé na Vila de São João del-Rei.
Esclarecidos os principais motivos do pretendido registro, socorre-nos e alumia-nos o veredito do Juiz da Comarca de Montes Altos, Estado do Maranhão, e professor da Universidade Federal do Maranhão, Cândido José Martins de Oliveira, in Janelas para a Cidadania:
“O registro civil tardio, com dificuldade de provas, com os pais do interessado já falecidos ou desconhecido o seu paradeiro, obtido mediante sofrida e dificultosa justificação, é muito mais do que uma facilidade ou um mero documento; significa um grau de libertação da exclusão pessoal em que se encontrava, resgatando a dignidade a que já tinha direito como ser, mas também mediante consagração constitucional, dado que a Carta de 1988 lança a dignidade da pessoa humana como princípio fundante do Estado democrático de direito, no artigo 1º, inciso III.”
Com o objetivo, não outro que o de ilustrar, chama aos autos o advogado signatário fato jurídico ocorrido em 1998 em Laguna, Santa Catarina. Não tendo sido localizado o registro de batizado de Ana Maria de Jesus Ribeiro, muitos pesquisadores brasileiros e estrangeiros divergiam sobre a data e local de nascimento da heroína ANITA GARIBALDI. Afirmava-se que ela teria vindo ao mundo em Lages, onde nasceram dois de seus nove irmãos. Ana viveu com Giuseppe Garibaldi nas cidades de Viamão, S.Gabriel, Mostardas e outras cidades do Rio Grande do Sul. Há publicações que dizem ter ela nascido no Uruguai, pois foi em Montevidéu que se casou com Garibaldi e teve filhos e ali viveu por seis anos. Também havia a versão de que era filha de um marinheiro italiano, nascida em um navio sob o comando do próprio Garibaldi, muito mais velho do que ela. Aninha, a jovem rebelde, não tinha nem o registro de batizado e, ainda assim, em processo de casamento em San Bernardino, Montevidéu, Giuseppe declarou estar casando-se com Ana,
“AQUELA INCOMPARÁVEL MULHER, FILHA DE HONESTA FAMÍLIA, NASCEU NA LOCALIDADE DE MORRINHOS, PERTENCENTE À CIDADE DE LAGUNA, NA PROVÍNCIA DE SANTA CATARINA, NO BRASIL...”
Assim, interposta a ação em juízo, após as formalidades de estilo, o processo teve o parecer do Ministério Público e prolatou o Juiz da 1ª Vara Civil da Comarca de Laguna, Santa Catarina, a R. sentença reconhecendo a nacionalidade brasileira, a naturalidade lagunense e autorizando o registro de nascimento tardio de Ana Maria de Jesus Ribeiro, a heroína de dois mundos Anita Garibaldi (documentos anexos).
O Tiradentes é Patrono Cívico da Nação Brasileira, pela Lei nº 4.897, de 9 de dezembro de 1965, que preceitua em seu art. 3º:
“Esta manifestação do povo e do governo da República em homenagem ao Patrono da Nação Brasileira visa evidenciar que a sentença condenatória de Joaquim José da Silva Xavier não é labéu que lhe infame a memória, pois é reconhecida e proclamada oficialmente pelos seus concidadãos, como o mais alto título de glorificação do nosso maior compatriota de todos os tempos.”
Se, para ter a cidadania merecida, Ana Maria de Jesus Ribeiro a conseguiu sem sequer o batistério, mais favorecido encontra-se o são-joanense do Pombal, com tal requisito cumprido formalmente e aqui anexado, podendo as provas serem vistas na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, e Catedral Basílica de Nossa Senhora do Pilar, nesta urbe.
Se é verdadeiro que os mais experimentados homens de Estado têm sucumbido ao enfrentar os complicados problemas que envolvem os povos nas épocas anormais da sua existência, em Tiradentes esses sentimentos ultrapassaram os limites da sinceridade do homem comum, do homo medius descrito por Quetelet, elevando-o à categoria do Tenax Propositi Vir, de Horácio. Se pairaram nuvens no horizonte de sua vida elas foram acumuladas por seus contemporâneos e por alguns pósteros que se emboscaram atrás da grandeza de seu nobre coração. Ele criou a Pátria Brasileira, ele fundou a nacionalidade e só seremos puros se o imitarmos, “quales príncipes, tales populi”. E não estamos a fazer-lhe um favor ao reparar um erro histórico ou resgatar sua cidadania. Mas é a História que o exige, quer dar luz a esse elo perdido, esse vácuo genético, essa lacuna de impostura e bradar ex cathedra e ex abundantia cordis que sua vida jurídica está de acordo com as leis brasileiras e sua genealogia restabelecida, que entre seus ascendentes e descendentes o liame está posto, legitimado e com força de lei.
Ex positis, devidamente comprovado o pedido e cumpridas as formalidades de estilo, dando-se vista ao ínclito órgão do Ministério Público do Estado de Minas Gerais, é o presente para que se proceda a averbação, por Mandado a ser expedido ao Cartório do Registro Civil da Comarca, do assentamento do “Tira-Dentes”, constando ali seu nome próprio, Joaquim José da Silva Xavier, requerendo, mais, que fique constando conforme se encontra no livro de batizados, ou seja:
“Joaquim José da Silva Xavier, nascido em 12 de novembro de 1746, no município de São João del-Rei, Estado de Minas Gerais, filho de Domingos da Silva dos Santos e de Antônia da Encarnação Xavier”
Somente com o escopo de ilustrar, recorrem os proponentes ao Arquivo Eclesiástico de Mariana, ao Arquivo Público Mineiro e Efemérides Mineiras (p.103, vol. II), ainda ao jornal “O Correio”, de 23-04-1944, pág. 04 (documento anexo), podendo este ser consultado na Biblioteca Municipal Batista Caetano de Almeida (desta cidade), que os avós paternos de Joaquim José da Silva Xavier são André da Silva e Mariana da Matta, naturais de Frecheiro de Basto, Braga, Portugal. Que são seus avós pela linhagem materna Domingos Xavier Fernandes e Maria de Oliveira Colassa, naturais de São Paulo, Brasil. Estes dados históricos são maravilhosamente corroborados pela estudiosa Elizabeth de Melo Bomfim, págs. 153 usque 153 de “Um Presente do Passado para o Futuro”, capítulo da Genealogia de Tiradentes (doc. Junto).
Ex rigore juris, e se julgar o eminente magistrado conveniente, poderá constar no registro a ascendência documentalmente comprovada. Apenas a título de esclarecimento recorre o signatário à fonte jurisprudencial na Apelação Cível nº 1.0000.00.279620.-9/000(1)-Comarca de Carangola-Apelante: Ministério público do estado de Minas Gerais, Apelado Geovani Ramos da Silva, relator do Acórdão o Exmo. Sr. Desembargador Brandão Teixeira, publicado no E. M. de 26/03/2003, 2ª Câmara Civil do Tribunal de Justiça de Minas Gerais - Possibilidade de registro de nome indicado, sem a inclusão dos nomes dos pais, para fins de Registro Tardio. Deram provimento.
Registre-se que por séculos a vida começou com o batismo pelos registros feitos por padres em livros da Igreja como prova do nascimento legal e de personalidade. Muitos poderiam nascer e não existir para o Direito, dada a imensa influência da hierarquia católica, à qual nenhum Estado Ocidental passou incólume. A isso estavam submetidos os recém-nascidos e os adultos, se quisessem existir, assim como também os índios, negros e os pobres cristãos-novos. O RG, como o conhecemos, só passou a existir em 1906, ou seja, há bem pouco tempo.
O que foi alegado e exposto tem suporte e guarida em arestos memoráveis de nossos tribunais e pode ser provado por todos os meios admissíveis em direito, notadamente por requisição de informes históricos ou cartográficos, no Brasil e no exterior, especialmente por depoimentos a serem colhidos de testemunhas qualificadas para tal mister.
Anexando os documentos comprobatórios do exposto acima, dá-se à causa, para efeitos puramente fiscais, o valor de R$ 1.000,00.
P. e E. deferimento.
São João del-Rei, MG, 10 de novembro de 2005.
Pp – Wainer Carvalho Ávila
OAB MG-11.544”
* Wainer Ávila, graduado em direito pela Universidade Católica de Minas Gerais, é o atual Presidente da Academia de Letras de São João del-Rei, ocupante da cadeira Embaixador Gastão da Cunha. É Sócio Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei, ocupante da cadeira Alferes Tiradentes. Membro Definidor da Venerável Ordem Terceira de São Francisco de Assis da Diocese de São João del-Rei. Sócio Benemérito e Conselheiro do Athetic Clube de São João del-Rei. Sócio Honorário do Rotary Club. Sócio Correspondente do Instituto Cultural Visconde do Rio Preto. Sócio Correspondente da Academia Valenciana de Letras. Conselheiro do Centro Cultural Feminino de São João del-Rei. Membro do Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico de São João del-Rei. Mais...
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