O Blog de São João del-Rei tem o prazer de hospedar um texto da autoria da são-joanense Celina dos Santos Braga, publicado pela Academia de Letras de São João del-Rei em revista comemorativa do centenário de nascimento do Dr. Tancredo de Almeida Neves, lançada em 28 de dezembro de 2010.
Reminiscências de Dr. Tancredo de Almeida Neves em 1944*
Réminiscences du Dr. Tancredo de Almeida Neves en 1944
Por Celina dos Santos Braga
Francisco Nestor dos Santos, meu pai, natural de Barroso mas são-joanense de coração, foi homem trabalhador, inteligente e dinâmico. Gostava de sua profissão de eletricista e dedicava-se com amor a suas tarefas, a ponto de carregar a escada nos ombros para desempenhar seu trabalho. É claro que fazia isso e muitos outros exageros por não haver ainda a proteção do trabalhador em seu local de trabalho, como hoje.
Como era pessoa correta, teve a sorte de encontrar-se, à porta da estação ferroviária da E.F.O.M.- Estrada de Ferro Oeste de Minas, com um espanhol de nome João Sanchez Robles que procurava algum sócio para abrir um ferro-velho, o primeiro em São João del-Rei. Foi assim que, tendo aceito o convite, trabalhou, se dedicou à nova profissão e se enriqueceu com honestidade.
Exercendo seu trabalho como eletricista, era comunicativo e se cercou de muitos amigos, entre os quais de Dr. Tancredo de Almeida Neves, para quem prestou inúmeros serviços em sua residência, onde funciona a “Gazeta de São João del-Rei”. Sabedor do prestígio que gozava a pessoa admirável de Dr. Tancredo e da simpatia que transmitia a todos os que dele se aproximavam, meu pai teve a oportunidade de consagrar-lhe toda a amizade e apreço. Quando aquele precisava dos serviços de meu pai, este o atendia com a maior presteza e dedicação. Assim foi a boa convivência desses dois grandes amigos, e nossa também, de seus filhos.
Como toda pessoa que se enriquece e cresce na profissão, meu pai cercou-se não só de muitos amigos, como foi dito, mas também de pessoas invejosas de seu progresso. Certa ocasião, trabalhando no depósito de ferro-velho, adquiriu de um adulto uma roda grande, que, conforme veio a saber depois, pertencia à “Caieira” do Coronel Amorim. Alguém invejoso delatou que a referida roda estava de posse de papai. Por isso, ele foi acionado judicialmente pelo dono da roda, o qual exigia a sua restituição, tendo levado o delegado Dr. Nabor a retê-lo por um dia.
Minha família ficou transtornada com o incidente. Não me restou senão ir, com apenas 16 anos, à residência de Dr. Tancredo pedir-lhe para soltar meu pai. Nessa ocasião, eu não passava de uma adolescente, aluna do Colégio Nossa Senhora das Dores, mas era eu quem cuidava das correspondências comerciais de meu pai. Dr. Tancredo deu uma solução imediata ao problema e trouxe papai consigo para o convívio da família.
É claro que ainda mais cresceu nossa amizade.
Depois, Dr. Tancredo subiu na política até se tornar Primeiro Ministro. Infelizmente, contudo, papai não viu sua ascensão, pois faleceu eletrocutado, enquanto trabalhava como eletricista. Mais uma vez, Dr. Tancredo mostrou sua amizade sincera para com nossa família, pois foi o inventariante do espólio deixado por meu pai.
Com justa razão, portanto, eu considero Dr. Tancredo um político ímpar, meu ídolo, a quem serei eternamente grata pelos bens que nos proporcionou, primeiro como amigo, depois como estadista.
* Este artigo saiu publicado na Revista da Academia de Letras de São João del-Rei, Ano IV, nº 04, 2010 (número especial dedicado às comemorações do centenário de nascimento do Dr. Tancredo de Almeida Neves), p. 143-144.
Reminiscências de Dr. Tancredo de Almeida Neves em 1944*
Réminiscences du Dr. Tancredo de Almeida Neves en 1944
Por Celina dos Santos Braga
Francisco Nestor dos Santos (✯ Barroso, 26/02/1900 ✞ São João del-Rei, 06/02/1946) |
Francisco Nestor dos Santos, meu pai, natural de Barroso mas são-joanense de coração, foi homem trabalhador, inteligente e dinâmico. Gostava de sua profissão de eletricista e dedicava-se com amor a suas tarefas, a ponto de carregar a escada nos ombros para desempenhar seu trabalho. É claro que fazia isso e muitos outros exageros por não haver ainda a proteção do trabalhador em seu local de trabalho, como hoje.
Como era pessoa correta, teve a sorte de encontrar-se, à porta da estação ferroviária da E.F.O.M.- Estrada de Ferro Oeste de Minas, com um espanhol de nome João Sanchez Robles que procurava algum sócio para abrir um ferro-velho, o primeiro em São João del-Rei. Foi assim que, tendo aceito o convite, trabalhou, se dedicou à nova profissão e se enriqueceu com honestidade.
Exercendo seu trabalho como eletricista, era comunicativo e se cercou de muitos amigos, entre os quais de Dr. Tancredo de Almeida Neves, para quem prestou inúmeros serviços em sua residência, onde funciona a “Gazeta de São João del-Rei”. Sabedor do prestígio que gozava a pessoa admirável de Dr. Tancredo e da simpatia que transmitia a todos os que dele se aproximavam, meu pai teve a oportunidade de consagrar-lhe toda a amizade e apreço. Quando aquele precisava dos serviços de meu pai, este o atendia com a maior presteza e dedicação. Assim foi a boa convivência desses dois grandes amigos, e nossa também, de seus filhos.
Tancredo de Almeida Neves (✯ São João del-Rei, 04/03/1910 ✞ São Paulo, 21/04/1985) |
Como toda pessoa que se enriquece e cresce na profissão, meu pai cercou-se não só de muitos amigos, como foi dito, mas também de pessoas invejosas de seu progresso. Certa ocasião, trabalhando no depósito de ferro-velho, adquiriu de um adulto uma roda grande, que, conforme veio a saber depois, pertencia à “Caieira” do Coronel Amorim. Alguém invejoso delatou que a referida roda estava de posse de papai. Por isso, ele foi acionado judicialmente pelo dono da roda, o qual exigia a sua restituição, tendo levado o delegado Dr. Nabor a retê-lo por um dia.
Minha família ficou transtornada com o incidente. Não me restou senão ir, com apenas 16 anos, à residência de Dr. Tancredo pedir-lhe para soltar meu pai. Nessa ocasião, eu não passava de uma adolescente, aluna do Colégio Nossa Senhora das Dores, mas era eu quem cuidava das correspondências comerciais de meu pai. Dr. Tancredo deu uma solução imediata ao problema e trouxe papai consigo para o convívio da família.
É claro que ainda mais cresceu nossa amizade.
Depois, Dr. Tancredo subiu na política até se tornar Primeiro Ministro. Infelizmente, contudo, papai não viu sua ascensão, pois faleceu eletrocutado, enquanto trabalhava como eletricista. Mais uma vez, Dr. Tancredo mostrou sua amizade sincera para com nossa família, pois foi o inventariante do espólio deixado por meu pai.
Com justa razão, portanto, eu considero Dr. Tancredo um político ímpar, meu ídolo, a quem serei eternamente grata pelos bens que nos proporcionou, primeiro como amigo, depois como estadista.
* Este artigo saiu publicado na Revista da Academia de Letras de São João del-Rei, Ano IV, nº 04, 2010 (número especial dedicado às comemorações do centenário de nascimento do Dr. Tancredo de Almeida Neves), p. 143-144.
* Celina dos Santos Braga nasceu em 23 de janeiro de 1928 na Rua Coronel Tamarindo em São João del-Rei, sendo a quarta filha de Francisco Nestor dos Santos, natural de Barroso-MG, e Brasilina Sebastiana dos Santos, natural de Vitoriano Veloso, distrito de Prados-MG. Fez o curso primário no Grupo Escolar Maria Teresa, quando este estava situado na residência que pertenceu ao Deputado Mateus Salomé. Obteve o grau de Normalista em 1945 no Colégio Nossa Senhora das Dores, tendo sido aluna do Tenente João Cavalcanti, Domingos Horta, Monsenhor José Maria Fernandes e Irmã Maria Lanna (autora do hino do Colégio), dentre outros. Durante os anos em que cursou esse educandário, foi soprano no coral “Orfeão”, dirigido pelo Tenente João Cavalcanti. Mais...
20 comentários:
Que saudosa efeméride (4 de abril de 1910)!
Abraços
Rogério
Ok, bem lembrado. O Dr. Tancredo é uma pessoa importante de nossa terra. Mauricio.
Caro Braga, em 2010, ano do centenário de Tancredo, tudo concorria para que tivéssemos colocado no Planalto, como Presidente da República, seu neto, Aécio Neves. O fator emocional evocando Tancredo seria como realizar o sonho de ver no neto o sonho do Avô: ser Presidente da República!
Mas o frouxo, invejoso e avarento, além de vermelho, José Serra não nos permitiu e sabotou o que seria a melhor opção para o Brasil!
Sabe, acho que ele e Costa e Silva são os dois grandes males: Costa Silva atrapalhou Castelo Branco a devolver logo a Presidência da República aos civis; e, Serra estragou a história recente com seu azedo ciúme e inveja de Aécio!
QUANTO AOS BRAGAS, BASTA DIZER QUE É UMA FAMÍLIA ABENÇOADA, ASSIM COMO VOCÊ!
GOSTARIA DE SABER SOBRE UMA DONA CELINA QUE MORAVA ALI NO LARGO DO ROSÁRIO, SUA CASA FAZ ESQUINA COM AQUELE BECO EM QUE FICAVA A ALFAIATARIA DO LELÉ.
ELA ERA SUA PARENTA? LEMBRO DELA COM MUITO CARINHO, POIS ERA ATUANTE CATÓLICA E GOSTAVA MUITO DOS MEUS RABISCOS NO 'CONVERTEI-VOS!.
GRATO PELO ARTIGO QUE NÃO SÓ ENRIQUECEU-ME CULTURALMENTE, SUSCITOU EM MEU CORAÇÃO SAUDADE DA TERRA QUERIDA!
Lourenço
Meu prezado amigo FJSBRAGA , li com muita atenção o texto q você enviou me.
Convivi com Dr. Tancredo.
Resolvi escrever alguns relatos de fatos q vivi junto com ele. Acho q ninguém conhece o q vou contar.
Vc vai ser a primeira pessoa que ira ler.
Um grande abraco do amigo, Lúcio Flávio
Caro amigo Braga,
Ao agradecermos a gentileza do envio, queremos dizer-lhe que descobrimos -- pela leitura do interessante texto de sua mãe D. Celina -- de onde o ilustre amigo herdou a verve literária que bem o caracteriza!
Abraços, Mário.
Obrigado. Lembro-me de Tancredo Neves quando estudei em São João del-Rei, do início de 1944 até o final de 46. Depois, tornando-me adulto, como mineiro, acompanhei a atividade política dele.
Abraços.
Francisco De Filippo
Prezado Braga, são boas estas lembranças. É nossa história familiar misturando-se à história do país. Recomendações à Rute. Fernando Teixeira
Parabéns professor!!!
Por tudo isto é q quero o Aécio no pedaço! MariaC
Merecida homenagem ao saudoso estadista Tancredo. Abraços. Bbf.
Obrigado, FRANCISCO!
Tancredo Neves é refêrencia maior de SJDR!
A memória coletiva e o imaginário de um povo
só se nutrem, quando há pessoas dedicadas
que não se cansam de mostrar quem é quem ao
longo da História! Você é uma delas, razão por que
nós de Barbacena o admiramos!
Abraço, M. CELSO
ótimo!
Grato,
Rogério
Muito oportuna a publicação do texto da D. Celina dos Santos Braga! O nosso conterrâneo dr. Tancredo foi e ainda é personalidade notável - eu diria que foi um estadista - que merece ser bem relembrada, notadamente nestes dias conturbados da política nacional em que a ética e a moralidade estão em pleno declínio...
Emocionante !
Obrigada, Francisco! Como a Dona Celina escrevia bem !
Aliás, tudo dela era muito bem feito. Bom gosto e afeto temperavam suas ações .
Saudades da minha grande amiga. Queridíssima !
Abrçs
Zezé Cassiano
Muito bom! Valeu!
Abraço,
JA
Meu prezado amigo FJSBRAGA, irei a SJDR quando Dona Celina puder me receber para ministrar-me uma aula de saudades.
Vou contar-lhe algumas histórias que eu vivi com o Dr. Tancredo e que ninguém conhece ainda.
Abs do Lucio Flávio
Meu prezado amigo, FJSBRAGA, meus pêsames. Vou usar uma frase do Guimaraes Rosa: "os grandes mortos não morrem nunca, ficam encantados".
Lúcio Flávio
(depois que tomou conhecimento de que D. Celina dos Santos Braga faleceu em 29/05/2014 e que este foi seu último texto antes de sua doença terminal que durou 4 anos)
Prezado irmão Francisco,
Veja que "coincidência": dias antes de você nos enviar novamente este artigo, escrito pela Mamãe, eu procurava algo sobre o Tenente Cavalcanti na internet e veio esse artigo da Mamãe...eu reli e imprimi. Mas eu já o conhecia da época que vc nos enviou. E dias depois, vc nos envia!...
Veja, eu procurava a letra de uma música que a Mamãe cantava junto enquanto eu tocava o 2º movimento da Sonata Patética (Beethoven). Ela me dizia que o Tenente Cavalcanti havia colocado letra neste 2º movimento e o Coral Orfeão cantava. Pena que nunca escrevi e não me lembro mais. Só uma frase: "...recebe o nosso amor..." Ela cantava quase inteiro! Será que você descobre essa letra? Eu gostaria muito de tê-la. Talvez a Lilia saiba (viuva do General Carmpos, mãe da Carla, morava perto do S. Gonçalo). Elas foram colegas neste Coral, "Orfeão". Quem sabe, vc ou a Rute poderiam perguntar para ela? Se souberem de algo, me digam, por favor.
Obrigada por nos reenviar este artigo saudoso, que contém tanto da história dela. Mto bom.
Abs, Luzia
Prezado irmão Francisco,
Ainda sobre Mamãe falando acerca do Tancredo: quando ela esteve aqui em Florianópolis, em 24/09/2009 visitamos o Palacio Cruz e Souza, na Pça XV. Ela escreveu algo no livro "Memórias do Palácio" que está lá guardado. Voltei lá e fotografei. Elizabeth já viu ao vivo, quando esteve aqui. Envio as fotos do livro e o escrito dela. Se quiser, pode usar em seu blog. Vão também fotos deste belo Museu, e dela, saindo da Missa na Catedral de Na. Sra. do Desterro, onde vemos o Museu ao fundo, noutro ângulo.
Aqui segue o escrito dela no livro MEMÓRIAS DO PALÁCIO:
"Florianópolis, 24 de setembro de 2009
Sou Celina dos Santos Braga, de S. João del-Rei (da cidade de S. João del-Rei), berço de Tancredo de Almeida Neves, estadista, político que conquistou a presidência da República. Querido pelos brasileiros, não tivemos a sorte, porque morreu antes de tomar posse.
Foi advogado de minha família, amigo e lamentamos muito sua morte.
Achei o Museu Cruz e Souza monumental pela cultura, beleza e seu conjunto arquitetônico."
Abs, Luzia
Como nossa mãezinha escrevia bem!... Ela admirava o Dr. Tancredo como estadista e ser humano e por ele nutria profunda gratidão.
Obrigada, Francisco, pela lembrança.
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