terça-feira, 22 de agosto de 2017

TIRADENTES EM SETE LAGOAS


Por Márcio Vicente Silveira Santos

Livro "Tiradentes em Sete Lagoas", 2010, de autoria do jornalista, advogado, escritor e historiador Márcio Vicente Silveira Santos, Sete Lagoas: Tip. Kosmos, 245 p.

O que pode esperar o leitor da leitura do livro "Tiradentes em Sete Lagoas", subtítulo "Um mergulho na História que inscreve a Cidade (de Sete Lagoas) no cenário da Inconfidência Mineira"? Nas p. 5-10 do livro pode-se ler quais as razões do livro: 
"PRIMEIRA
Antes de qualquer justificativa, uma necessária e indispensável explicação: aqui o leitor não vai encontrar uma tese acadêmica. Este também não é um compêndio escolar. A obra pretende ser apenas um livro-reportagem sobre fato histórico determinado: a permanência de Tiradentes em Sete Lagoas nos anos de 1780 e 1781, período em que foi comandante do Quartel do Sertão.
Se não é possível esgotar-se a pesquisa em torno de um acontecimento elevado à categoria de história, o corte temporal que este livro explora também permanecia em penumbra: até então, estava ele fora dos limites fixados para o enredo da Inconfidência, e nem despertava maior atenção dos cronistas militares, porque nele a principal figura Tiradentes ainda não teria alcançado a estatura de um miliciano de prestígio.
SEGUNDA
A presença de Tiradentes em Sete Lagoas pouco conhecida, não convenientemente valorizada ou simplesmente deixada em segundo plano pelos historiadores de um modo geral (o foco maior é sobre o "inconfidente", embora haja algumas obras sobre o "militar") também não foi mais extensamente relatada e documentada pelos que se dispuseram a escrever a história local. Sem registro, a memória do fato acabou diluída em informações imprecisas ou ainda é pulverizada em interpretações não conclusivas: "Tiradentes passou por Sete Lagoas", "Tiradentes pernoitou no Casarão", "Tiradentes veio a Sete Lagoas batizar um filho do comandante do Destacamento"...
Alguns exemplos:
Em 1780, o Alferes de Cavalaria Joaquim José da Silva Xavier, o grande Tiradentes, passou por Sete Lagoas rumo ao Norte da Capitania, através das picadas que o braço bandeirante desbravara na imensa mataria.
Fernandino Júnior, in "Revivendo a História de Sete Lagoas"; artigo na revista Acaiaca, Belo Horizonte, agosto de 1954, p. 33.
Em 1775 instalava-se o Quartel Geral do povoado, poderosa praça de armas, sede do destacamento policial. Em 1780, hospedava-se nesse quartel o Alferes de Cavalaria Joaquim José da Silva Xavier - o Tiradentes - que se fazia acompanhar de poderosa escolta, rumo ao Norte da Capitania...
Joaquim Dias Drummond: O passado compassado de Sete Lagoas, edição da Prefeitura, 1977, p. 16.
Para a 6ª companhia desse Regimento (de Cavalaria) foi admitido, no posto de Alferes, a 1º de dezembro de 1775, Joaquim José da Silva Xavier. Desde então, o Alferes passou a receber variadas comissões, algumas bem arriscadas. (...) Nos anos de 1780 e 1781, foi o Comandante das Sete Lagoas.
Waldemar de Almeida Barbosa: Dicionário Histórico-Geográfico de Minas Gerais, Belo Horizonte: Editora Saterb, 1971, p. 498.
... em 2 de junho de 1780, Tiradentes era o comandante do Quartel de Sete Lagoas, encarregado de guardar o Registro instalado naquela localidade mineira.
Dimas Perrin: Inconfidência Mineira - Causas e Consequências, Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1985, p. 126.
As companhias do Regimento de Cavalaria Regular de Minas, enviadas para o reforço defensivo do Rio de Janeiro, em 1777, voltaram à Capitania em setembro de 1779. Tiradentes, que fez parte daquele socorro tornado necessário pelas guerras do Sul, foi então nomeado para comandante do Destacamento do Sertão, sediado em Sete Lagoas, porta de entrada do médio São Francisco.
Tarquínio J.B. Oliveira: Um banqueiro na Inconfidência, edição da ESAF-Centro de Estudos do Ciclo do Ouro, Ouro Preto: Casa dos Contos, 1979, p. 62.
... em 1780, no primeiro semestre, está Tiradentes em Sete Lagoas, Minas Gerais, como comandante do Destacamento local, encarregado da guarda do Registro ali instalado, porta de entrada do Vale Médio do Rio São Francisco.
Márcio Jardim: A Inconfidência Mineira - Uma síntese factual, Rio de Janeiro: Editora Bibliex, 1989, p. 69.
Tomadas no contexto da História Mineira e mesmo se avaliadas como pouco representativas do todo que se quer evidenciar essas referências testemunham a importância do fato. E qualquer esforço que se empreenda para sua ampliação e documentação assim o entendemos será uma contribuição. É nessa linha que o presente trabalho deverá ser medido.
TERCEIRA
Em 1966, tivemos a oportunidade de acompanhar o escritor Jovelino Lanza em visitas ao Arquivo Público Mineiro, em Belo Horizonte, em busca de informações gerais que o auxiliassem na composição de sua História de Sete Lagoas, publicada em 1967, ano do Centenário do Município. Foi uma experiência estimulante, que mais serviu de aprendizado ao discípulo do que resultou em auxílio ao mestre. (O escritor, que ultrapassava sempre os limites da generosidade, mencionou essa "ajuda" na dedicatória da obra, provocando grande emoção em seu jovem admirador e eventual colaborador).
O trabalho de Jovelino Lanza não só registra o fato, afirmativamente - "Nos anos de 1780 e 1781, o Alferes Joaquim José da Silva Xavier - o Tiradentes - era o ativo e destemido comandante do Quartel das Sete Lagoas..." (História de Sete Lagoas: Belo Horizonte: Editora Sion, 1967, p. 88), como trancreve recibos firmados pelo Alferes, quando no comando da guarnição militar. O mestre chegou mesmo a sugerir ao discípulo que mergulhasse no tema, buscasse novos documentos e elaborasse uma monografia evidenciando o significativo acontecimento histórico. Entretanto, dificuldades evidentes e afazeres imediatos desviaram-no da decisão de aceitar o desafio.
Este trabalho é, portanto, além de homenagem à memória do historiador, o resgate de um compromisso nunca formalizado, mas virtualmente aceito, embora o autor tenha a convicção de que aqui apenas giza alguns caminhos novos, que poderão ser percorridos por quem dotado de maior engenho e melhor arte.
QUARTA
Embora este trabalho não adote as normas da pesquisa acadêmica é essencialmente um exercício jornalístico o autor tem presente que, como ensina João Camilo de Oliveira Torres (História de Minas Gerais, Belo Horizonte: Editora Lemi, 1980, vol. II, p. 39), "o historiador deve falar relativamente pouco: a documentação sempre dirá a última palavra. Naturalmente ele (e esta é a sua missão) selecionará os documentos, dará a sua interpretação, apresentará a sua maneira de ver os fatos."
A pesquisa procurou, portanto, aprofundar as buscas empreendidas por Jovelino Lanza, identificar suas fontes e coligir documentos outros que permitissem dar consistência e comprovação aos fatos, aceitando o ponto de vista dos mestres da teoria da História segundo o qual testis unus, testis nullus. É evidente que as fontes primárias são escassas e que este trabalho, pelas circunstâncias inarredáveis, versa matéria inédita. Valemo-nos da documentação sob a guarda do Arquivo Público Mineiro, da coleção de manuscritos da Casa dos Contos (Ouro Preto) e de buscas realizadas nos vários acervos da Biblioteca Nacional (Rio de Janeiro). Empreendeu-se, também, o exame de extensa bibliografia existente nas bibliotecas do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, Fundação Amílcar Martins e Biblioteca Pública Estadual Luiz de Bessa.
Antecipando outras conclusões mas esse é o arco principal da pesquisa pode-se afirmar, documentalmente, que Tiradentes esteve no efetivo comando do Quartel das Sete Lagoas no período compreendido entre 22 de abril de 1780 e 23 de junho de 1781. A fixação dessas datas, evidentemente, contraria as que foram indicadas por grandes autores da História de Minas. Não há aqui, entretanto, o escopo de corrigir ou contestar informações testemunhadas por respeitáveis historiadores, mas, apenas, o de contribuir com a indicação de fontes e documentos que podem trazer mais luz ao tema.
QUINTA (e talvez principal)
Este trabalho sem maior pretensão alimenta, porém, uma ousadia: a de levar aos meios acadêmicos (que têm o ferramental teórico e certamente o compromisso tácito) proposta para o início de um debate, que se imagina permanente, em torno da presença de Tiradentes no sertão. O fundamento para essa necessária e inadiável prática de cultura e de cidadania é por demais relevante: inquestionavelmente, o fato histórico insere Sete Lagoas no cenário do movimento político-militar que notabiliza Minas Gerais a Inconfidência.
Sete Lagoas, 21 de abril de 2010.
Márcio Vicente Silveira Santos

13 comentários:

Francisco José dos Santos Braga (compositor, pianista, escritor, gerente do Blog do Braga e do Blog de São João del-Rei) disse...

O Blog de São João del-Rei tem a grata satisfação de comunicar a seus leitores que recebe de braços abertos o novo colaborador MÁRCIO VICENTE SILVEIRA SANTOS, historiador, escritor e jornalista que se radicou em Sete Lagoas, onde desenvolveu sua carreira literária e historiográfica.
Seu texto inaugural neste blog pode ser considerado o seu "prefácio" de autor do seu livro de 2010: TIRADENTES EM SETE LAGOAS.
Boa leitura!

Francisco Braga
Gerente do Blog de São João del-Rei

Prof. Fernando de Oliveira Teixeira (professor universitário, escritor, poeta e presidente da Academia Divinopolitana de Letras) disse...

Gratíssimo pelo envio. Abraço do Fernando Teixeira

José Passos de Carvalho (jornalista, genealogista, escritor, presidente da ALL-Academia Lavrense de Letras e membro correspondente do IHG de São João del-Rei e da AFL-Academia Formiguense de Letras) disse...

Prezado amigo e confrade.
Texto brilhante. Tem que se manter arquivado para leitura periódica.
Muito obrigado.

PCarvalho

João Carlos Ramos (poeta, escritor, ex-presidente da Academia Divinopolitana de Letras e sócio correspondente da Academia de Letras de São João del-Rei e da Academia Lavrense de Letras) disse...

Recebido.
Obrigado!

Dr. Paulo Milagre (escritor e ex-presidente da Academia Divinopolitana de Letras) disse...

Parabéns para ele e para vocês.
Cordial abraço.

Dr. Mário Pellegrini Cupello (escritor, pesquisador, presidente do Instituto Cultural Visconde do Rio Preto de Valença-RJ, e sócio correspondente do IHG e Academia de Letras de São João del-Rei) disse...

Caro amigo Braga

Agradecemos pela gentileza do envio.

Cordial abraço,

Do amigo Mario.

Prof. Cupertino Santos (professor de história aposentado de uma escola municipal em Campinas) disse...

Caro prof. Braga; as pesquisas de Jovelino Lanza e de Márcio Vicente, novo membro do IHG, parecem acrescentar elementos aos estudos sobre a Inconfidência Mineira, os quais encontram-se algo sem maiores aprofundamentos na historiografia brasileira, desde praticamente a extensa obra do brasilianista K. Maxwel.
Um livro de 245 páginas sobre o período de apenas um ano do comando militar de Joaquim José em Sete Lagoas, deve ser muito curioso e talvez revelador. Certamente já o leu.
Muito grato!

Francisco José dos Santos Braga (compositor, pianista, escritor, gerente do Blog do Braga e do Blog de São João del-Rei) disse...

Prezado Prof. Cupertino,
Bom dia!
De fato, possuo um exemplar do livro, enviado a mim pelo autor.
Aí ele relata que Tiradentes comandou os serviços envolvendo "a picada de Goiás" e outros.
O herói é muito maior do que a historiografia já lhe reconhece.
Abs,
Braga

Prof. Cupertino Santos (professor de história aposentado de uma escola municipal em Campinas) disse...

Prof. Braga!
"Picada de Goiás", ou seja, na abertura da estrada até Paracatu; não é isso? Interessante que esse estudo possa levar a um conhecimento maior da personalidade e da pessoa de Joaquim José. Muito grato.
Abraços.

Márcio Vicente da Silveira Santos (historiador, escritor e jornalista, sócio-fundador da Academia Sete-Lagoana de Letras, sócio efetivo da AMULMIG e sócio correspondente do IHG-DF desde 1995) disse...

Prezado Amigo Prof. Braga:


Agradeço a gentileza e a "boniteza" de minha apresentação

em seu prestigiado blog. O relatório é uma "conspiração" de amigos,

e até fiquei bonito na foto...

Tentarei ser um colaborador à altura.


Por sorte, encontrei aqui, no "sebo", um transviado (e "chumbado")

volume de "O Mediterrâneo", que enviei ao amigo pelo endereço

do Instituto Histórico e Geográfico. Espero que aprecie.


Um grande abraço do sempre admirador,

Márcio Vicente

Francisco José dos Santos Braga (compositor, pianista, escritor, gerente do Blog do Braga e do Blog de São João del-Rei) disse...

Caro Márcio Vicente,
Não repute a nós o dom que é só seu: o livro de 2010 merece ser divulgado para que os historiadores constatem as lacunas da historiografia brasileira.
Quanto ao "Mediterrâneo", que está a caminho, estou bastante curioso e motivado a lê-lo tão logo chegue.
Abs,
Braga

Ray Pinheiro (Um São-joanense na Capital de Todos os Brasileiros) disse...

Caríssimo amigo Francisco José dos Santos Braga,

É sempre com alegria , satisfação , que recebo vossas noticias e notas culturais do Blog de São João Del Rei - MG.
Aproveito para desejar muito sucesso ao Poeta , Escritor , Márcio Vicente Silveira Santos , novo colaborador deste renomado Blog , sob sua batuta.
Com minha admiração de sempre , gratidão.
Ray Pinheiro.
Um São-joanense na Capital de Todos os Brasileiros.
03161 - 98548 - 7809 ( WtatsApp )

Paulo Roberto Sousa Lima (escritor, gestor cultural e membro do IHG de São João del-Rei) disse...

Sucesso garantido, confrade.
Paulo Sousa Lima