terça-feira, 4 de junho de 2024

ELZA DO VAL GOMES, a querida “TIA ELZA” - Um amor acendrado ao canto coral


Por ROSALVO PINTO *

Tia Elza - Uma vida dedicada ao canto coral - Crédito pela foto: revista O Trem

A Associação Artística Coral Júlia Pardini, de Belo Horizonte, teve uma curiosa história: nasceu de uma formatura de medicina da Universidade Federal de Uberaba, em 1959. O formando, Arlindo Gomes Pardini Júnior, quis um coro para abrilhantar suas festas. Os parentes, sob a batuta da senhora Elza do Val Gomes, deslocaram-se de BH para Uberaba. Os componentes do coral, empolgados com o sucesso da festa, já voltaram a Belo Horizonte pensando em manter o grupo. E deu certo. O mais interessado, o pai da senhora Elza, sempre sonhara em criar um coral. Já até tinha um lema na ponta da língua: “Cantar para a todos alegrar”. A estreia do coral veio em 06/01/1960. E o nome? Foi uma homenagem à família: Coral Júlia Pardini.

Meu primeiro contato com o Júlia Pardini aconteceu em 1972. Eu estava fazendo o curso de Regência de Coral no fantástico “VI Festival de Inverno” da UFMG, em Ouro Preto, com o saudoso amigo Carlos Alberto Pinto da Fonseca. Fizemos parte do curso em Ouro Preto e, em janeiro, em Belo Horizonte.  Ao fim do curso, tivemos que reger um coral escolhido pelo professor. A mim coube o Coral Júlia Pardini, do qual me tornei, desde aquela data, um grande admirador em função do magnífico trabalho desenvolvido pela incansável Maestrina Tia Elza, que dedicou grande parte de sua vida ao canto coral.

Morando em Governador Valadares, dediquei-me a trabalhar com o coral da Universidade. Promovi em Valadares a vinda do Ars Nova (da UFMG) e a do Júlia Pardini. Ambos foram bem recebidos. Tempos depois, o Júlia Pardini conheceu nossa Resende Costa e nos brindou com um belo concerto à noite no sábado no Salão Paroquial (CPP) e a tradicional Missa Dominical
¹.

Iniciadas as atividades do coral, veio a ideia de se criar um jornalzinho. E, de novo: “E o nome?” Foram buscar em uma expressão popular do México, algo em “Arruia”, qualquer coisa correspondendo ao “Oba” no Brasil!

Tia Elza teve a feliz ideia de criar um jornal com o objetivo de unir e estimular os corais no Brasil. Que se saiba, não se conhece um periódico semelhante. Com pouco tempo se espalhou pelo Brasil e atingiu a América Latina e a Europa. Hoje, o Júlia Pardini se orgulha de ter apresentado, ininterruptamente, suas 638 edições (50 anos!), no Brasil e no exterior!

Depois dos 13 anos de suas atividades, foi possível construir sua sede independente, bem adequada ao funcionamento das atividades de um coral, no 2º andar do prédio da “Tia Elza”.

O nº 638 d'O ARRUIA de novembro passado
 ² trouxe a triste notícia do seu fechamento, para tantos que estavam acostumados a recebê-lo religiosamente, em BH, no Brasil, na América e na Europa.

Informações e características do Júlia Pardini

No auge de suas atividades, o coral trabalhava com cinco categorias de grupos:  Coralito (crianças de 3 a 6 anos), Infantil, Juvenil, Adulto e até um Coral dos Pais!

O Júlia Pardini exerceu uma importante atividade: em seus 58 anos, prestou um belo trabalho, acolhendo em BH muitos corais que por aqui vinham para se apresentar. Recebeu, entre muitos, corais do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Bahia, Pernambuco.

Ao longo de sua vida, o Pardini sempre participou de eventos vários, tais como o do Natal, promovido pela Assembleia Legislativa, o “Coral na Praça”, na Praça da Liberdade (BDMG), o “Coral das mil vozes”, etc.

A partir da década de 70 o coral trabalhou com entidades e instituições variadas: Igrejas, Instituições Educacionais, Igreja Metodista Central, Instituto de Educação de Minas Gerais, Rádio Itatiaia, Bancos, entre outros. Outro cuidado do coral foi a dedicação a doentes e portadores de necessidades especiais.

O Júlia Pardini tem uma rica história e experiência fora do Brasil.  Na América do Sul, visitou a Argentina (quatro vezes), o Paraguai, o Peru, o Equador, o Chile (La Serena: Festival Internacional, 2002) e o México. Na Europa: em 1986; em 2000, Alemanha (Munique: Festival Internacional); Itália (Vicenza, Assis, Roma: Rádio do Vaticano e Igreja de Santo Antônio de Lisboa, em Roma); em 2010, Portugal, Espanha (Barcelona: Festival Internacional); França (Grenoble). Nessa última viagem à Europa, comemoramos os 80 anos da Tia Elza na famosa Cervejaria da Trindade, em Portugal! O autor desse texto teve o prazer de ajudar, acompanhar e participar dessas saudosas viagens, sob a batuta, não só mais da regência musical, mas da batuta do carinho, da organização e da responsabilidade.

E assim foi e fez-se sempre: uma vida dedicada à música. Convicta de que ela é uma das mais importantes para a construção de nossas vidas. É assim, Tia Elza!
 
Fonte: Jornal das Lajes, Resende Costa-MG, Ano XV nº 183, julho de 2018, coluna Causos e cousas, p. 10. 
 
* Rosalvo Gonçalves Pinto foi professor universitário, cronista e escritor. Dentre vários livros que escreveu, destaca-se: Os Inconfidentes José de Rezende Costa (pai e filho) e o Arraial da Lage (2014), 2ª edição, Coleção Lageana, Resende Costa: AMIRCO, 488 p.


 

O gerente do Blog de São João del-Rei permite-se incluir as seguintes NOTAS EXPLICATIVAS, extraídas da referida edição nº 638 do jornal O ARRUIA p. 4, complementando a preciosa crônica de seu saudoso confrade Rosalvo Pinto:

¹ ACONTECEU EM RESENDE COSTA/MG O 1º FESTIVAL DE MÚSICA

O Jornal das Lajes, fundado em 2003, junto com a amiRCo - Associação dos Amigos da Cultura de Resende Costa, deu ampla divulgação ao 1º Festival de Música realizado naquela Cidade no mês de julho. A programação constou de oficinas de música, recitais, missa solene, show e retreta. O Festival marcou a estreia do Coro Gregoriano da AMIRCO e contou com a participação de professores dos cursos de música da UFMG, UFOP, UNIVERSIDADE DE IOWA-EUA, Conservatório Pe. José Maria Xavier e músicos da Orquestra Filarmônica de Minas Gerais. O Teatro Municipal de Resende Costa foi palco da abertura do Festival e dos recitais dos alunos e professores e o público aplaudiu com entusiasmo artistas e grupos que ali se apresentaram. O Regente Edésio Lara destacou a importância das parcerias para a realização do próximo festival que teve apoio da Prefeitura Municipal, Paróquia de Nossa Senhora da Penha de França, Escola Estadual Assis Resende e Conservatório Estadual de Música Pe. José Maria Xavier, de São João del-Rei.

² O Editorial do jornal O ARRUIA-órgão da Associação Artística Coral Júlia Pardini, de Belo Horizonte, trouxe a triste notícia do seu encerramento ( O ARRUIA, Belo Horizonte, Ano LVI nº 638 p. 1, novembro de 2017) nos seguintes termos: 

"O ano está acabando, as chuvas chegaram e a gente se enche de esperança...
O que a gente planta a gente colhe, mas é preciso cuidar, saber esperar, pois há tempo para tudo. Tempo de rir, tempo de chorar, tempo de aprender e tempo de ensinar... Por isso O Arruia se tornou importante, porque nasceu pequeno, pobre e limitado aos cantores, depois ganhou um stencil (máquina que não existe mais), criou asas, foi parar no Exterior, tinha assinantes que o sustentavam, e hoje, muito conhecido e reconhecido vem se despedir porque, como canta o poeta Almir Satter:

Ano devagar porque já tive pressa
e guardo este sorriso porque já chorei demais...
Cada um de nós compõe a sua história
Cada ser em si carrega o dom de ser capaz e ser feliz...

O que seria do mundo, não fossem os poetas, as pessoas boas e generosas, os sonhadores e a MÚSICA...? O que seria d'O ARRUIA não fossem os amigos que tornaram este jornal importante em suas vidas de perto ou de longe, onde a pequena salinha da Rua Aquiles Lobo viver momentos felizes, guardados na memória daqueles que sabem compartilhar... 58 anos, ao lado do Coral, este jornal, - feito de gente laboriosa, idealista e comprometida com seus colegas, com a música e com os amigos da música -, sobreviveu e hoje não consegue se sobrepor à modernidade onde os órgãos de comunicação que dominam o planeta tornaram o papel algo descartável... Muitos amigos acompanharam a história d'O ARRUIA, incentivando, reforçando laços de AMIZADE. É, acreditando que nem tudo foi apenas um sonho, que desejamos a todos um
FELIZ NATAL!
ANO NOVO de muita PAZ e ESPERANÇA

Tia Elza

A mesma edição nº 638 d'O ARRUIA, p. 1 ainda estampou a seguinte matéria:

LEITORES LAMENTAM O FIM DO JORNAL

É com pesar que recebemos cada telefonema, cartinha do Correio ou e-mail de leitores que não se conformam com o fim do Jornal. Chegamos à conclusão de que ainda são poucos os amigos que se manifestam, mas não por isso que estamos fechando O ARRUIA.
São as necessidades do tempo presente que nos faz ser realistas.
Sempre tivemos um trabalho abrangente voltado para a música coral e hoje os tempos são outros. Patrocinadores para o jornal eram sempre os benfeitores, o que não bastou devido à constante inflação.
Perdoem-nos, pois!

*
  *     * 
 
E, para encerrar, transcrevo aqui as impressões do Maestro Emílio César de Carvalho sobre o encerramento d'O ARRUIA e minha notícia sobre uma atividade desenvolvida pelo Seminário Seráfico Santo Antônio de Santos Dumont, ambas constantes do último número do saudoso jornal, p. 4:

VEM DE BRASÍLIA-DF


Eu estou sentindo muito, com muito pesar que O ARRUIA finaliza suas atividades daqui a dois números. A atividade coral no Brasil tem aumentado, mas não tem tido o apoio para a continuidade de seus trabalhos, Por onde ando vejo, cada vez mais, que o empenho de manutenção das atividade de cada coro é um esforço pessoal do regente ou quem idealizou aquele coral. Vários esforços têm sido realizados para manter uma Associação de Regentes Brasileiros, mas não tem obtido êxito, tanto que a ABRC (Associação Brasileira de Regentes de Corais) está desativada.
Há um movimento grande se estabelecendo no Brasil para tentarmos de alguma forma reunirmos mais os regentes, mas também tem sido difícil.
A finalização das atividades d'O ARRUIA é mais um golpe nas atividades corais do Brasil. O ARRUIA tem sido presente em muitos festivais e encontros de coros e regentes, graças ao empenho seu, Elza, e de seus colaboradores.
Fica aqui a minha tristeza com mais uma coluna que se quebra.
Desejo toda sorte de bênçãos nas atividades da Associação Artística Coral Júlia Pardini,
Abraço do Maestro Emílio César de Carvalho

DE SANTOS DUMONT-MG

Como acontece todo ano em novembro, tenho o prazer de enviar-lhe convite para o XIX ENCONTRO DE CORAIS DE SANTOS DUMONT, a se realizar no Seminário Seráfico Santo Antônio, no dia 18/11/2017, próximo sábado.
São três os corais inscritos para a apresentação: Coral Tajapanema, Coral São Miguel/São Tarcísio e Coral Trovadores da Mantiqueira, regidos respectivamente por Maria Alice de Azevedo Sad, Paulo "Melado" e frei Joel Postma o.f.m. *
Minha participação será: acompanhar ao órgão o coral regido por frei Joel, acompanhar ao piano minha esposa, a soprano Rute Pardini, em sua apresentação especial e escrever uma crônica do evento para fins de registro histórico, como fiz nas outras edições dos Encontros de Corais de Santos Dumont.
Cordial abraço,
Francisco Braga

* Crônica do XIX Encontro de Corais de Santos Dumont por Francisco José dos Santos Braga
Link: https://bragamusician.blogspot.com/2017/11/cronica-do-xix-encontro-de-corais-de.html


3 comentários:

Heitor Garcia de Carvalho (pós-doutorado em Políticas de Ensino Superior na Faculdade de Psciologia e Ciências da Informação na Universidade do Porto, Portugal (2008) disse...

Não sei se homegeio o Rosalvo - amigo de muitos anos de convivência -
ou os homegeados no texto!
Obrigadíssimo!
Heitor

Raquel Naveira (membro da Academia Matogrossense de Letras e, como poetisa publicou, entre outras obras, Jardim Fechado, antologia poética em comemoração aos seus 30 anos dedicados à poesia) disse...

Bom conhecer a "Tia Elza" e seu amor ao canto coral, caro Francisco Braga.
Obrigada pelo envio de matérias do Blog São João D'El Rei.
Abraço grande,
Raquel Naveira

Prof. Cupertino Santos (professor aposentado da rede paulistana de ensino fundamental) disse...

Caro professor Braga

Que figura rara, adorável a Tia Elza e que obra a dela ! Importantíssima publicação da crônica de Rosalvo, complementada com as preciosas notas explicativas.
Saudações !
Cupertino