Por JOSÉ CIMINO *
Os cinco poemas e uma reflexão aqui transcritos foram extraídos do livro “Lampejos ao Léu” publicado em novembro de 2024, precedidos por ilustrações reproduzidas de desenhos de Pablo Picasso, Georges Braque e Cândido Portinari. Projeto gráfico por Edson Brandão.
SOMBRIOS TEMPOS
No túnel do tempo,
Avoluma-se o cortejo do funeral da
liberdade
Na democracia antidemocrática
As vítimas do liberticídio
Dançam a dança macabra dos novos
escravos
Cérebros vazios
Imergem na sombra da amnésia de si.
Homens-objetos passam pelo mundo
Quais reses indo para o matadouro
Formigueiros de homens-massa
De todas as vielas
De todas as ruas e avenidas
Do campo e das cidades
Pululam no cenário humano
E alcateias de celulares
Ululam ruídos virtuais
Nos ouvidos impessoais
No céu da ilusão democrática,
Como voa tua liberdade?
JUSTIÇA, POR ONDE ANDAS?
Longe dos arrabaldes da moral
Sob o céu de pseudojustiça
Latidos de cães vorazes,
Em busca do dinheiro alheio,
Entristecem o olhar da lua,
Manipulando aquilo que chamam de
Direito.
Mas a seca paisagem dos dias
macabros
Um dia florirá rosas
CONTRASTES
Onde quer que estejas
Encontrarás poetas
Que a vida recria em sonhos
Encontrarás ladrões e corruptos
Que escarneiam a justiça.
Toparás com fracos e fortes,
Uns padecendo martírios,
Outros festejando a vida
Em ágapes de mesas fartas.
ESPELHO
Vivemos entre espelhos,
Disfarces de máscaras de ferro,
Faces escondidas sob máscaras de
ouro,
Rostos obtusos sob máscaras de
papel,
Semblantes frios sob máscaras de
gelo
Sobrancelhas carrancudas sob
máscaras de fogo,
Onde estão as faces sem disfarces?
Apenas as crianças com máscaras de
vidro
Sorriem transparências.
A SOMBRA
Édipos errantes somos nós,
Escondendo a face por detrás das
sombras.
Fiel companheira da vida humana,
Algum dia,
Alguém logrou escapar à própria
sombra?
No previsto e no previsível,
Ela é a minha ilusão que flui
Com as batidas do coração.
O que de mim se apossa
E costura por dentro o meu eu
É apenas sombra para o outro.
Minha luz de dentro
É o meu oculto irrevelável.
O que de mim o outro conhece
É tão só um eco longínquo
Oh! As sombras!
Poeiras do tempo
Que me encobre e me esconde
Ou a mentira que sou para o próximo.
Sombras, sombras...
Pobreza humana
No vaivém do mundo.
REFLEXÃO NA CONTRACAPA
Nestes tempos de avanços
tecnológicos, em que o ser
humano pouco a pouco se vai
fazendo fiel servo da tecnologia,
urge que ele se volte para a
nobilíssima ação de “pensar”. O
“pensante” é livre e só obedece à
sua consciência e jamais será um
“homem-massa”. Ele habita algo
imponderável e tão abismal que
nem mesmo o universo o pode
preencher. O “pensante” é autor
da própria história. A taça da vida
do “pensante” é orlada de vastos
horizontes e todos os dias haure
vastos goles de sol.
Eis o signo do
“homem-pensante”:
Rei de si mesmo.
Hosanas à vida pensante!
* José Cimino é escritor e filósofo, membro efetivo da Academia Barbacenense de Letras, cadeira nº 12; membro fundador e atual Presidente da ABROL-Academia Brasileira Rotária de Letras-MG Leste, cadeira nº 16; membro fundador e atual Presidente da AMEF-Academia Mantiqueira de Estudos Filosóficos. Escritor com vários livros publicados, professor de filosofia no ensino superior, principalmente na Faculdade Dom Bosco de São João del-Rei e na Fundação de Ensino Superior de Rio Verde (Fesurv), Goiás, com rápida passagem pela Universidade Presidente Antônio Carlos (Unipac) de Barbacena. Admitido no Serviço Público Federal, por concurso, foi Assessor para Assuntos Educacionais do MEC, Diretor da Escola Agrotécnica Federal de Rio Verde, onde recebeu o título de Cidadão Honorário Rioverdense.
NOÇÃO DE PENSAMENTO FILOSÓFICO
Em outra obra de cunho filosófico de José Cimino, intitulada NA LUZ DO SER: Investigações de ontoantropologia, o filósofo-poeta confiou o seu prefácio ao decano, professor e filósofo Tiago Adão Lara, que inseriu como epígrafe do seu texto uma passagem de Jean-François Mattéi extraída do terceiro capítulo do livro “A barbárie interior: ensaio sobre o mundo moderno”.
MATTÉI: “O pensamento instaura uma cesura, no fio do tempo. Ele é o hiato que permite ao homem suspender uma ação, interromper um processo, estabelecer uma ruptura, nessa rede tecida de desejos e carências, necessidade e submissão, que é o fluxo contínuo da vida. Em seu impulso interno, que o arranca à indiferença de seu mar interior, o pensamento abre uma fenda, entre o passado e o futuro, a fim de inserir-se nesse intermédio”. (MATTÉI, J.F.: A barbárie interior. Trad. por Isabel M. Loureiro. São Paulo: Editora UNESP, 2002, p. 173)
LARA EXPLICA: Pensar, pois, no sentido forte que Mattéi lhe atribui, incomoda. Obriga-nos a questionar o “já pensado”, aceito como aconchego, que protege contra as intempéries dos imprevistos e que vai se consolidando como tradição intocável. Pensar, num sentido mais radical, é exercício de liberdade, que rompe o determinismo do necessário, para criar a fluidez do novo. É celebração do humano do homem, a dar sentido e gosto à realidade, a qual a ele se mostra e, por ele, se deixa significar.
Vou a seguir fazer uso de mais um fragmento do mesmo capítulo de Mattéi:
MATTÉI: “A experiência do pensamento nada tem de histórico e não é necessário voltar a Descartes, Agostinho ou Platão para captar instintivamente a fulguração que se abre para uma alteridade irredutível. Basta-nos voltar a nós mesmos, não ao sujeito moderno que se dissipa na vaidade de seus processos interiores, mas ao pensamento que habita em nós, para sentir imediatamente essa outra presença que nos chama a pensar.” (MATTÉI, p. 175)
Vou reportar-me ao prefácio do mestre LARA, para examinar o que pretende exatamente Mattéi em termos práticos com a sua definição de “pensamento”:
LARA EXPLICA: Essa perspectiva, proposta por Mattéi, não é a que comumente temos no dia a dia da vida, para resolver as imediatas e rotineiras necessidades da existência. Em tais circunstâncias, quase sempre não pensamos propriamente falando, mas aplicamos, ao que se coloca diante de nós, ou pelos outros. E nos aquietamos. Não nos abrimos para a nova presença. Trata-se, então, de um re-conhecimento, mas não propriamente de um novo conhecimento. Conhecimento, no sentido forte, é geração de novo filho, com outro nome, é geração de nova relação entre o que comumente chamamos sujeito e objeto.
O pensar forte, à maneira de Mattéi, dá-se quando ele se coloca diante de nós e sentimo-lo como desafio a decifrar, ou resolver, ou superar. Dá-se como convocação ou provocação para um envolvimento existencial, arrancando-nos da tranquilidade do já conquistado.
II. AGRADECIMENTO
O gerente do Blog agradece à sua amada esposa Rute Pardini Braga pela formatação do registro fotográfico utilizado neste trabalho.
O gerente do Blog agradece à sua amada esposa Rute Pardini Braga pela formatação do registro fotográfico utilizado neste trabalho.
III. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA DE JOSÉ CIMINO NO BLOG DE SÃO JOÃO DEL-REI
BRAGA, F.J.S.: Colaborador: JOSÉ CIMINO, publicado em 21/04/2019
CIMINO, José: NA LUZ DO SER: INVESTIGAÇÕES DE ONTOANTROPOLOGIA, publicado em 24/11/2021
____________: POEMAS SELETOS DE “INFINITO INSTANTE”, publicado em 21/04/2019
____________: O livro em minha vida, publicado em 07/02/2024
____________: Ouvindo música e lendo poesia, publicado em 22/03/2023
____________: O professor, publicado em 15/10/2023
3 comentários:
Francisco José dos Santos Braga (compositor, pianista, escritor, tradutor, gerente do Blog do Braga e do Blog de São João del-Rei) disse...
Prezad@,
O Blog de São João del-Rei comunica a participação do filósofo-poeta JOSÉ CIMINO com cinco poemas e texto da contracapa de LAMPEJOS AO LÉU, seu livro de poesias mais recente, em que mescla inspiração poética com uma visão filosófica de vida.
Para esclarecer o conceito de pensamento filosófico, o gerente do Blog reportou-se ao prefácio de Tiago Adão Lara de um livro filosófico de Cimino, intitulado Na Luz do Ser: Investigações de ontoantropologia (2021).
Link: https://saojoaodel-rei.blogspot.com/2024/12/poemas-seletos-de-lampejos-ao-leu.html
Cordial abraço,
Francisco Braga
Gerente do Blog de São João del-Rei
Heitor Garcia de Carvalho (graduado em Pedagogia pela Faculdade Dom Bosco (1968), mestre em Educação UFMG (1982), Ph.D em Educational Technology - Concordia University (1987 Montreal, Canada); MBA Gestão Tecnologia da Informação, Fundação Getúlio Vargas (2004); pós-doutorado em Políticas de Ensino Superior na Faculdade de Psicologia e Ciências da Informação na Universidade do Porto, Portugal (2008); professor associado do CEFET-MG) disse...
José Cimino e Tiago Adão Lara, dois importantes colegas de São João del-Rei, com quem convivi vários anos e muito aprendi...
Obrigado
José Cimino (escritor e filósofo, membro efetivo da Academia Barbacenense de Letras, cadeira nº 12; membro fundador e atual Presidente da ABROL-Academia Brasileira Rotária de Letras-MG Leste, cadeira nº 16; membro fundador e atual Presidente da AMEF-Academia Mantiqueira de Estudos Filosóficos) disse...
Meu caro amigo, Braga, muito obrigado pela matéria sobre meu modesto trabalho Lampejos ao léu e referências a Luz do ser.
Boa noite.
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