segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Padre José Maria Xavier, sua vida e sua obra, no contexto de sua época >>> Parte 3


Por Abgar Antônio Campos Tirado *


O compositor


Senhor de vasta cultura, com especial inclinação para as Letras, era todavia na música que o notável clérigo demonstrava os mais elevados dotes, por ela nutrindo o maior interesse.

Correspondeu o período criador do Padre José Maria ao fastígio do Romantismo europeu, quando criava suas obras-primas um Schumann, um Chopin, um Mendelssohn, um Liszt, bem como Rossini, Bellini, Berlioz, Verdi, Wagner e tantos outros, romantismo esse já perceptível na obra de seu patrício e coestaduano, Padre João de Deus de Castro Lobo (Vila Rica, 1794 – Mariana, 1832).

Como compositor, o Padre José Maria revelava, a exemplo de Giuseppe Verdi, uma inesgotável inventiva melódica, sempre revestida de singelas harmonias e discreto contraponto, logrando alcançar belos efeitos com grande economia de meios. É comum em sua música aparecer a melodia principal na orquestra, freqüentemente na flauta, no violino ou clarineta, muitas vezes passando de um instrumento para outro, ou ainda na flauta e clarineta em uníssono, enquanto a massa coral, como num acompanhamento harmônico, apóia a orquestra em blocos de acordes, visando, sem dúvida, a favorecer a compreensão do texto, antecipando, de muito, a prescrição do futuro Papa, S. Pio X. Surgem no coro muitas notas destacadas, quando as palavras são deliberadamente cortadas por pausas, soando cada sílaba isoladamente, como, por exemplo, em: "Et/in/ter/ra/pax/ho/mi/ni/bus/bo/nae/vo/lun/ta/tis", no Glória da Missa da Assunção. Outra característica é o freqüente confronto sucessivo entre uma tonalidade maior e sua relativa menor. Se, no que diz respeito às vozes, o coro exerce amiudadas vezes a função de quase acompanhamento, o mesmo não se dá com os solos, duetos, tercetos e quartetos, que apresentam notável autonomia melódica. São também característicos os "crescendi" nos "tutti", que fazem lembrar o italiano Rossini.

Embora o Padre José Maria tenha assimilado processos utilizados por compositores europeus, principalmente os operistas italianos em voga na época, de quem, em suas primeiras composições, utilizou temas e sobre cujas obras trabalhou, é certo que conheceu bem seus antecessores mineiros, podendo-se ainda na música Xavieriana, tanto em aspectos melódicos como rítmicos, perceber traços nacionalistas, lembrando respectivamente a cantiga popular e ritmos de congada e de batuque, tudo isso, entretanto, dentro de um inconfundível estilo pessoal. Em algumas ocasiões é usada a forma cíclica (com o retorno de temas apresentados, tão largamente utilizada por seus contemporâneos europeus Franz Liszt e César Franck). A orquestração normalmente empregada se constitui de flautas, clarinetas, trompetes, trompas, oficleide, cordas e, às vezes, trombone.

A 27 de outubro de 1872, a 5ª Exposição Industrial Mineira, em Juiz de Fora, concedeu-lhe a Medalha de Prata por suas composições. Vindo o Imperador D. Pedro II a São João del-Rei, em agosto de 1881, para a inauguração da Estrada de Ferro Oeste de Minas, após assistir a uma cerimônia religiosa, anotou em seu diário de viagem: "A música do Te Deum foi a melhor que ouvi em Minas; dizem ser composição do Padre José Maria". O notável poeta satírico e músico barbacenense, Padre Corrêa de Almeida, era também fervoroso admirador das músicas do Padre Xavier, tendo deste recebido peças a ele especialmente dedicadas, como a Última Lição do 3º Noturno de cada um dos Ofícios de Trevas, que o primeiro cantava com esmero, durante a cerimônia própria, em São João del-Rei. Também Hermenegildo José de Souza Trindade, notável baixo e Diretor da Lira Sanjoanense por duas vezes, teve várias composições do Padre-mestre a ele dedicadas.

A obra do Padre José Maria Xavier é vasta, tendo o musicista e pesquisador Aluízio José Viegas (que, por sinal, prepara um livro sobre o compositor) catalogado já mais de cem composições, muitas delas de largas proporções. Considerando os inúmeros afazeres que lhe tomavam quase todo o tempo, depreende-se a enorme facilidade com que compunha.

Continua...



* Abgar Antônio Campos Tirado é natural de São João del-Rei, MG. Com formação na área das Letras e da Música, é professor, palestrante, comentarista cultural, escritor, pianista e compositor, com obras já executadas no exterior. Foi diretor por vários anos do Conservatório Estadual de Música “Padre José Maria Xavier” de São João del-Rei, onde se aposentou. É sócio honorário do Instituto Histórico e Geográfico de São João del-Rei e membro efetivo da Academia de Letras da mesma cidade, bem como da Academia Municipalista de Letras de Minas Gerais. Mais...

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